O Dia que Durou 21 Anos é um documentário para ser visto e compreendido em
duas dimensões, a explícita e a implícita. Trata da influência do governo dos
Estados Unidos no golpe militar de 1964, mas não é só isso.
Subjacente às urdiduras norte-americanas no Brasil, o argumento do jornalista
Flávio Tavares confere nitidez à linha tênue que separa as palavras ditas das
intenções pretendidas quando o nome do jogo é Poder.
No filme, Newton Cruz, um dos mais coléricos personagens do período, diz uma
frase que surpreende pela autoria e deixa patente a diferença entre o discurso
de defesa da democracia que justificou a conspirata para derrubar João Goulart e
a prática que logo revelaria o intuito de instalar uma ditadura militar longeva
no País.
"Disseram que iriam arrumar a casa, mas ninguém leva 20 anos para arrumar uma
casa", aponta o aposentado general quase ao final dos 77 minutos de projeção.
Para além do relato em si, a constatação convida o pensamento a passear pelo
terreno das razões alegadas e dos métodos utilizados por aqueles com vocação
autoritária.
Gente refratária ao contraditório, obstinada na perseguição de seus
objetivos, convicta de que seus fins justificam o emprego de quaisquer meios e,
sobretudo, partidária da ideia de que alternância no exercício do poder é
praticamente um crime de lesa-pátria.
Dora Kramer, O Estado de S.Paulo
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