domingo, 30 de novembro de 2014


Será que a liberdade é uma bobagem?...
Será que o direito é uma bobagem?...
A vida humana é alguma coisa a mais que ciências,artes e profissoes.
E é nessa vida que a liberdade tem um sentido,e o direito dos homens.
A liberdade não é um prêmio,é uma sançao.Que há de vir .
 
Mário de Andrade

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sábado, 29 de novembro de 2014

Exposição de energia solar no centro de Pombal-PB

 

Físico: ETs vão destruir a Terra porque somos 'muito barulhentos'

Os humanos serão varridos da face da Terra porque são "muito barulhentos" - da mesma forma que os marcianos foram extintos do planeta vermelho. A forma será idêntica: um ataque nuclear conduzido por ETs.

A teoria, do físico John Brandenburg, foi apresentada no último sábado em encontro da Sociedade Americana de Física, em Illinois (EUA).

O ataque viria de uma força alienígena "hostil a civilizações jovens e barulhentas, exatamente como a nossa", contou reportagem do "Daily Mirror".
John Brandenburg - Reprodução/YouTube(Science and Spirituality)
Segundo Brandenburg, a alta concentração de xenônio-129, urânio e tório na superfície de Marte indica que o planeta foi alvo de uma grande explosão nuclear, que, segundo ele, destruiu todos os marcianos.

O físico diz que o clima de Marte já foi similar ao da Terra, abrigando formas de vida vegetais e animais, com vida inteligente comparada a dos antigos egípcios.

Brandenburg defende que seja enviada uma missão humana a Marte para investigar a fundo o que exatamente ocorreu, a fim de evitar destino semelhante para os humanos.
 
O Globo

Não digas nada

Não digas nada!
Nem mesmo a verdade
Há tanta suavidade em nada se dizer
E tudo se entender —
Tudo metade
De sentir e de ver...
Não digas nada
Deixa esquecer

Talvez que amanhã
Em outra paisagem
Digas que foi vã
Toda essa viagem
Até onde quis
Ser quem me agrada...
Mas ali fui feliz
Não digas nada.

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"


sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Porta de colégio

Passando pela porta de um colégio, me veio uma sensação nítida de que aquilo era a porta da própria vida. Banal, direis. Mas a sensação era tocante. Por isto, parei, como se precisasse ver melhor o que via e previa.

Primeiro há uma diferença de clima entre aquele bando de adolescentes espalhados pela calçada, sentados sobre carros, em torno de carrocinhas de doces e refrigerantes, e aqueles que transitam pela rua. Não é só o uniforme. Não é só a idade. É toda uma atmosfera, como se estivessem ainda dentro de uma redoma ou aquário, numa bolha, resguardados do mundo. Talvez não estejam. Vários já sofreram a pancada da separação dos pais. Aprenderam que a vida é também um exercício de separação. Um ou outro já transou droga, e com isto deve ter se sentido (equivocadamente) muito adulto. Mas há uma sensação de pureza angelical misturada com palpitação sexual, que se exibe nos gestos sedutores dos adolescentes. Ouvem-se gritos e risos cruzando a rua. Aqui e ali um casal de colegiais, abraçados, completamente dedicados ao beijo. Beijar em público: um dos ritos de quem assume o corpo e a idade. Treino para beijar o namorado na frente dos pais e da vida, como que diz: também tenho desejos, veja como sei deslizar carícias. Onde estarão esses meninos e meninas dentro de dez ou vinte anos?

Aquele ali, moreno, de cabelos longos corridos, que parece gostar de esportes, vai se interessar pela informática ou economia; aquela de cabelos loiros e crespos vai ser dona de butique; aquela morena de cabelos lisos quer ser médica; a gorduchinha vai acabar casando com uma gerente de multinacional; aquela esguia, meio bailarina, achará um diplomata. Algumas estudarão Letras, se casarão, largarão tudo e passarão parte do dia levando filhos à praia e praça e pegando-os de novo à tardinha no colégio. Sim, aquela quer ser professora de ginástica. Mas nem todos têm certeza sobre o que serão. Na hora do vestibular resolvem. Têm tempo. É isso. Têm tempo. Estão na porta da vida e podem brincar. Aquela menina morena magrinha, com aparelho nos dentes, ainda vai engordar e ouvir muito elogio às suas pernas. Aquela de rabo-de-cavalo, dentro de dez anos se apaixonará por um homem casado. Não saberá exatamente como tudo começou. De repente, percebeu que o estava esperando no lugar onde passava na praia. E o dia em que foi com ele ao motel pela primeira vez ficará vivo na memória.

É desagradável, mas aquele ali dará um desfalque na empresa em que será gerente. O outro irá fazer doutorado no exterior, se casará com estrangeira, descasará, deixará lá um filho – remorso constante. Às vezes lhe mandará passagens para passar o Natal com a família brasileira.

A turma já perdeu um colega num desastre de carro. É terrível, mas provavelmente um outro ficará pelas rodovias. Aquele que vai tocar rock vários anos até arranjar um emprego em repartição pública. O homossexualismo despontará mais tarde naquele outro, espantosamente, logo nele que é já um don juan. Tão desinibido aquele, acabará líder comunitário e talvez político. Daqui a dez anos os outros dirão: ele sempre teve jeito, não lembra aquela mania de reunião e diretório? Aquelas duas ali se escolherão madrinhas de seus filhos e morarão no mesmo bairro, uma casada com engenheiro da Petrobrás e outra com um físico nuclear. Um dia, uma dirá à outra no telefone: tenho uma coisa para lhe contar: arranjei um amante. Aconteceu. Assim, de repente. E o mais curioso é que continuo a gostar do meu marido.

Se fosse haver alguma ditadura no futuro, aquele ali seria guerrilheiro, mas esta hipótese deve ser descartada. Quem estará naquele avião acidentado? Quem construirá uma linda mansão e um dia convidará a todos da turma para uma grande festa rememorativa? Ah, o primeiro aborto! Aquele ali descobrirá os textos de Clarice Lispector e isto será uma iluminação para toda a vida. Quantos aparecerão na primeira página do jornal? Qual será o tranquilo comerciante e quem representará o país na ONU?

Estou olhando aquele bando de adolescentes com evidente ternura. Pudesse passava a mão nos seus cabelos e contava-lhes as últimas estórias da carochinha antes que o lobo feroz assaltasse na esquina. Pudesse lhes diria daqui: aproveitem enquanto estão no aquário e na redoma, enquanto estão na porta da vida e do colégio. O destino também passa por aí. E a gente pode às vezes modificá-lo.


Affonso Romano de Sant’Anna, in “Porta de colégio e outras crônicas”

O preço da honra

As coisas que mais ocorrem na vida e são tidas pelos homens como o supremo bem resumem-se, ao que se pode depreender das suas obras, nestas três: as riquezas, as honras e a concupiscência. Por elas a mente se vê tão distraída que de modo algum poderá pensar em qualquer outro bem. Realmente, no que tange à concupiscência, o espírito fica por ela de tal maneira possuído como se repousasse num bem, tornando-se de todo impossibilitado de pensar em outra coisa; mas, após a sua fruição, segue-se a maior das tristezas, a qual, se não suspende a mente, pelo menos a perturba e a embota. Também procurando as honras e a riqueza, não pouco a mente se distrai, mormente quando são buscadas apenas por si mesmas, porque então serão tidas como o sumo bem. Pela honra, porém, muito mais ainda fica distraída a mente, pois sempre se supõe ser um bem por si e como que o fim último, ao qual tudo se dirige.

Além do mais, nestas últimas coisas não aparece, como na concupiscência, o arrependimento. Pelo contrário, quanto mais qualquer delas se possuir, mais aumentará a alegria e consequentemente sempre mais somos incitados a aumentá-las. Se, porém, nos virmos frustrados alguma vez nessa esperança, surge uma extrema tristeza. Por último, a honra representa um grande impedimento pelo facto de precisarmos, para consegui-la, de adaptar a nossa vida à opinião dos outros, a saber, fugindo do que os homens em geral fogem e buscando o que vulgarmente procuram.


Baruch Espinoza, in 'Tratado da Correcção do Intelecto'
A vereadora Lucimara Passos (PCdoB) usou a tribuna da Câmara de Aracaju para fazer um discurso inusitado de crítica ao colega Agamenon Sobral (PP), durante o qual o chamou de "criminoso" e o desafiou a lhe dar "uma surra".

Durante o discurso, a vereadora tirou uma calcinha do bolso, mostrou aos colegas e disse que estava sem a peça íntima em protesto contra o vereador Agamenon - que na semana passada teria chamado de vagabunda uma mulher que quis se casar sem calcinha e teria dito que ela merecia "uma surra".

"Hoje vim com um vestido mais curto. Também trouxe a minha calcinha no bolso. Alguém pode me chamar de vagabunda? Alguém pode dizer que tenho de ser surrada?", questionou, para silêncio da casa.

E questionou os parlamentares: "Os senhores não podem me julgar, nem julgar uma mulher pela roupa que ela veste, em função da calcinha que usa ou se não usa. Isso não define o meu caráter. Será que vão me dar uma surra quando eu descer daqui?".
A vereadora pediu punição ao colega que fez o pronunciamento. "Esse vereador já cometeu aqui vários crimes. Antes de chamar a mulher de vagabunda, dizer que merecia uma surra, disse que ia começar a andar armado, que a população tinha de se armar, que tinha de pendurar bandido de cabeça para baixo. E essa Casa não fez nada para puni-lo; tornou-se conivente com esse vereador; não disse a ele que ele não pode proceder dessa maneira", afirmou.

O discurso da vereadora fez alusão ao dia 25 de novembro, quando é celebrado o Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher. "Infelizmente, ainda nos deparamos com certo tipo de comportamento desprezível, abominável, que ainda enxerga a mulher como propriedade do homem. Esse é um dos maiores fatores da violência. Enquanto o homem não se libertar desse sentimento, as mulheres serão vítimas", disse.

Em entrevista a veículos de comunicações de Aracaju, o vereador disse que a vereadora estava querendo "aparecer" e pediu para ser investigado. "É direito do vereador contestar. Sobre a Comissão de Ética, quero que seja efetivada porque já cansei de provar várias vezes sobre tudo o que trato aqui. Não tenho medo. A vereadora pode vir para tribuna de calcinha ou sem, como quiser, o problema é dela."
 
 
Fonte aqui

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Um exemplar de peixe-diabo negro, o Melanocetus johnsonii, de aproximadamente nove centímetros foi filmado a uma profundidade de 600 metros no cânion submarino de Monterrey, na Califórnia.
 
Cientistas do Instituto de Pesquisa do Aquário da Baía de Monterrey, na Califórnia, conseguiram filmar um exemplar do misterioso "diabo negro do mar", uma espécie de peixe abissal conhecida pelo nome científico Melanocetus johnsonii.

Segundo os pesquisadores da instituição, esta foi a primeira vez que este estranho e pequeno animal foi filmado em seu habitat natural. O peixe pode chegar a viver em uma profundidade de até 3 mil metros.

O exemplar filmado é uma fêmea de 9 centímetros que se encontrava a cerca de 600 metros da profundidade no cânion submarino de Monterrey, na costa californiana.

As imagens foram gravadas por um veículo operado remotamente batizado de Don Ricketts.
 
 
Fonte: Uol

Manhã de sol com azuleijos

Tudo se veste da cor de teu vestido azul
Tudo — menos a dona do vestido:
meus olhos te passeiam nua
pela grama do campo de golfe

Uma curva e eis-nos diante de meu coração

Não amiga não temas
meu coração;
é apenas um chapéu surrado
que humildemente estendo
para colher um pouco de tua alegria
de tua graça distraída
de teu dia



Francisco Alvim, in 'Sol dos Cegos'


Frase

O que é isso? Em que país vivemos? Os bandidos perderam a noção das coisas! Como podem se apropriar desse montante?
 
 
Desembargador Walter de Almeida Guilherme, que atua no STF na condição de ministro convocado, sobre a roubalheira na Petrobras
Um suplemento probiótico chamado Sweet Peach, que tem como objetivo prevenir infecções causadas por fungos ou infecções urinárias, causou polêmica ao ser lançado como um suplemento probiótico personalizado que faria as vaginas exalarem aroma de pêssego. A informação é do jornal The Guardian.

Em uma conferência realizada há uma semana em San Jose, Califórnia, Austen Heinz, CEO da empresa Cambrian Genomics, e o empresário de biotecnologia Gillas Gome disseram que as "pessoas deveriam ter controle sobre seus micróbios, o que quer dizer que se elas querem adicionar fragância as suas bactérias, cabe a elas fazer essa escolha".

Entretanto, a criadora do produto, Audrey Hutchinson, descrita como uma "ultrafeminista de 20 anos", CEO dos Probióticos Sweet Peach, esclareceu que a ideia não é que os produto faça "as mulheres terem vaginas que cheirem a pêssego", e que apenas 10% de sua empresa pertence a Austen Heinz. Gillas Gome, por sua vez, não detém parte alguma da companhia.

Mas isso não impediu que ele declarasse em uma entrevista que o Sweet Peach era capaz de deixar a vagina com cheiro de rosa e gosto de Coca Diet. A inventora do suplemento contou ao The Guardian que ficou furiosa com a forma como a imagem de seu produto está sendo deturpada e que vomitou duas vezes ao ler a repercussão que ele teve na imprensa.

Ela explicou o que, de fato, é o seu produto. "O suplemento será realmente personalizado de acordo com os indivíduos. Uma amostra dos microorganismo existentes na vagina será enviada para análise. Sweet Peach fornecerá então substâncias capazes de equilibrar os níveis de PHD da vagina, permitindo que ‘bons‘ micróbios cresçam, reduzindo assim o risco de infecções por fungos e infecções urinárias, e optimizando a saúde da vagina".
 
The Guardian

Relatos selvagens

Por que nosso cinema brasileiro é tão inferior ao argentino? A Argentina está quebrada há anos. Sua política é risível (peronismo de todos os lados). Sua presidente atual, uma bolivariana louca.
 
Mas "los hermanos" continuam anos-luz à nossa frente em uma porção de coisas, entre elas o cinema. A "cultura" brasileira é ainda um atraso em comparação à argentina.
 
Nosso cinema patina na fórmula da comédia escrachada, masturbações ao redor do amor neurótico, do "coitadismo" (coitado do pobre, do bandido, do drogado) ou de seu contrário: pobre é lindo, bandido é lindo, drogado é lindo. E agora uma novidade: as questões de gênero.
 
Existe um lugar-comum para o cinema inteligentinho entre nós: a crítica social.
 
Parodiando o grande Oscar Wilde, quando dizia que toda poesia sincera é ruim, eu diria que todo filme de crítica social é ruim. No mínimo, chato. E não deve melhorar, na medida em que os jovens cineastas continuam sendo formados, em grande parte, no culto a Cuba como meca da resistência ao capital -dá até vontade de rir, se não fosse caso para chorar...
 
E aí, chegamos a "Relatos Selvagens", dirigido pelo argentino Damián Szifrón, que conta seis histórias curtas sobre violência.
 
Não, você não vai ver um filme falando de como o capital é responsável por todas as desgraças do mundo, nem sobre como a sociedade desigual produz todo o mal. "Relatos Selvagens" não é infantil -e, quem pensa que a violência é fruto do capitalismo, é infantil.
 
Mas, claro, as relações entre as pessoas num mundo do dinheiro são parte de como se dá a violência.
 
Por exemplo, numa das histórias do longa, o personagem de Ricardo Darín é esmagado por algo que conhecemos muito bem: a parceria criminosa entre governo e as empresas privadas que prestam serviços a ele, gerando todo o aparato de multas no trânsito nas grandes cidades, câmeras fotográficas, guinchos e afins.
 
Além, claro, da burocracia enlouquecedora, feita para inviabilizar qualquer tentativa de reação por parte das pessoas.
 
 
Entretanto, pela própria apresentação do filme, vemos que o lugar da violência parece estar além do maniqueísmo típico das ciências sociais: os animais selvagens olhando para as câmeras que os fotografam relevam nosso parentesco de alma com eles.
 
O tratamento da violência no longa parece ser o seguinte: a violência é constitutiva da espécie e a civilização faz o que pode com isso. Inclusive porque é a própria civilização quem estimula a violência, muitas vezes vista como o "ato de coragem" -que, em um dos relatos, faz um homem recuperar o respeito da própria esposa.
 
A violência é feia, destrutiva, ridícula. Mas, às vezes, a negação dela seria destrutiva, como na história em que um milionário, achacado pela corrupção do sistema judiciário argentino, decide ser mais agressivo na negociação da propina e consegue reduzir seus gastos com um crime que envolve seu filho, um mauricinho irresponsável.
 
Aliás, nesse mesmo caso vemos como as classes menos favorecidas sabem muito bem como manipular seus "ganhos" no esquema de corrupção. Um cínico diria que a corrupção também pode ser inclusiva.
 
 
Noutra história, a diferença de "natureza" entre duas pessoas distintas pode fazer com que uma, com todas as razões do mundo para se vingar, se mantenha imune ao instinto violento e outra, sem nenhuma relação com o caso em questão, se revele uma besta assassina.
 
 
Diferenças de caráter individual, claro, eram consideradas um "fetiche" burguês pelo velho Marx.
 
Não faltaria em uma obra consistente como "Relatos Selvagens" o reconhecimento da íntima relação entre violência e Eros. A história da festa de casamento traz à tona a sabida "energia positiva da agressividade" no tesão entre um homem e uma mulher. A paz eterna é brocha.
 
 
No primeiro relato, somos levados a pensar: qual gostosa nunca trocou o namorado bundão pelo amigo descolado? Quem nunca riu de alguém medíocre? Qual terapeuta nunca subiu o preço da sessão?
 
Bem vindos à vida real, e não à pasmaceira politicamente correta brasileira. 

 
Luiz Felipe Pondé, pernambucano, filósofo, escritor e ensaísta, doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de Tel Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como comportamento contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, entre eles, 'Contra um mundo melhor' (Ed. LeYa). Escreve às segundas.
 

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Jesus não morreu tão moço,
nem arranjou companheira,
preferiu a de madeira,
A uma de carne e osso.
Não o seduziu o esboço
Do perfil da mulher bela...
Não deu tais honras a ela,
Por que sabia Jesus:
Quem casa arranja uma cruz
Prá viver pregado nela!
                                                                                                 
Lourival Batista

Alceu e Orquestra de Ouro Preto - La Belle De Jour/Girassol


Frase

Os rumores de indicação de Joaquim Levy e Kátia Abreu para o Ministério sinalizam uma regressão da agenda vitoriosa nas urnas. Ambos são conhecidos pela solução conservadora e excludente do problema fiscal e pela defesa sistemática dos latifundiários contra o meio ambiente e os direitos de trabalhadores e comunidades indígenas.
 
 
Manifesto encabeçado pelo MST

O tempo vale muito mais do que o dinheiro

Perder tempo não é como gastar dinheiro. Se o tempo fosse dinheiro, o dinheiro seria tempo. Não é. O tempo vale muito mais do que o dinheiro. Quando morremos, acaba-se o tempo que tivemos. Quando morremos, o que mais subsiste e insiste é a quantidade de coisas que continuam a existir, apesar de nós.

O nosso tempo de vida é a nossa única fortuna. Temos o tempo que temos. Depois de ter acabado o nosso tempo, não conseguimos comprar mais. Quando morreu o meu pai, foi-se com ele todo o tempo que ele tinha para passar connosco. As coisas dele ficaram para trás. Sobreviveram. Eram objectos. Alguns tinham valor por fazer lembrar o tempo que passaram com ele - a régua de arquitecto naval, os relógios - quando ele tinha tempo.      


As pessoas dizem «time is money» para apressar quem trabalha. A única maneira de comprar tempo é de precisar de menos dinheiro para viver, para poder passar menos tempo a ganhá-lo. E ficar com mais tempo para trabalhar no que dá mais gosto e para ter o luxo indispensável de poder perder tempo, a fazer ninharias e a ser-se indolente.


A ideologia dominante de aproveitar bem o tempo impede-nos de perder esses tempos. Quando penso no meu pai, todas as minhas saudades são de momentos que perdi com ele. Uma noite, numa cabana no Canadá, confessou-me que o único filme de que gostava era «Um Peixe Chamado Wanda«. Todos os outros eram uma perda de tempo. Perdemos a noite inteira a falarmos e a rirmo-nos disso. Ainda hoje tem graça.

Miguel Esteves Cardoso, in 'Jornal Público

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Marinha e mergulhadores confirmam cemitério de navios na Paraíba

Registros sobre os locais dos sinistros marinhos:
 
Jacumã - Nessa praia do Litoral Sul, em profundidades que variam de 10 a 45 metros, estão afundados a escuna Jessé, de bandeira portuguesa (1574); as embarcações francesas Pierre (1582), Jumeau (1708), Chargeur D’ Flote (1712), o Piegge e o Marie II (1722), além dos navios americanosShorting Star (1856) eTransit (1871). Em 1866 naufragou alí o navio inglês Queen Of The Forthe. Em outras praias próximas, existem cascos que jazem sob a água há mais de 100 anos.
 
Tambaú - A nove quilômetros da costa, e em profundidades que variam de 10 a 35 metros, estão naufragados os navios Ship Eriê, de bandeira americana (1873), o inglês Alice (1911) e o espanhol Alvarenga (1926). O Eriê, que naufragou após a ocorrência de um incêndio em suas máquinas, até a década de 1980 era conhecido como o “Queimado”. Na Praia do Poço, em Cabedelo, estão o vapor Santa Clara (1865) e o iate Laura (1874).
 
Cabedelo - Na Enseada de Cabedelo naufragaram o iate português João Luiz (1674), a galera francesa Eduard (Século XIX) o vapor Non Pareil (1852), os vapores brasileiros Grão Pará (1909), Alegrette (1911) e Rodrigues Alves (1924). Na Ilha da Restinga descansam o brigue holandês Schuppe (1634), o vapor inglês Psybe (1852) e o iate norueguês Alert (1893).
 
Na Praia de Fagundes, em Lucena, estão o vapor brasileiro Natal (1903) e o navio italiano Vanadouro (1911). A barca italiana Antonietti está encalhada em um banco de areia da Ilha de Tiriri desde 1873.
 
Lucena - Localizada no Litoral Norte, a turística Lucena abriga em suas águas a barca inglesa Anne Power (1868) e o vapor americano Said Bin Sultan (1871), conhecido até a década de 1990 como “Vanuária”, uma menção à mulher que morreu afogada ao tentar resgatar peças nos destroços. Mais à frente, na Barra de Mamanguape, as águas tragaram o brigue brasileiro Simpatia (1916).
 
Em Baía da Traição é visto sob águas claras o navio brasileiro Elias.

Delação premiada

Todas as grandes coisas são simples. E muitas podem ser expressas numa só palavra: liberdade; justiça; honra; dever; piedade; esperança.
 

Charge

Frase

É doloroso ver que a luta contra a fome é prejudicada pelo primado do lucro.
 
Papa Francisco

O prazer é abrir as mãos

O prazer é abrir as mãos e deixar escorrer sem avareza o vazio-pleno que se estava encarniçadamente prendendo. E de súbito o sobressalto: ah, abri as mãos e o coração, e não estou perdendo nada! E o susto: acorde, pois há o perigo do coração estar livre!

Até que se percebe que nesse espraiar-se está o prazer muito perigoso de ser. Mas vem uma segurança estranha: sempre ter-se-á o que gastar. Não ter pois avareza com esse vazio-pleno: gastá-lo.

Clarice Lispector, in Crónicas no 'Jornal do Brasil (1972)'

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Sobre moluscos, conchas e beleza

Desde que o objetivo da educação é permitir que vivamos melhor, nossas escolas deveriam tomar a natureza como mestra.
 
Voltamos ao mundo dos moluscos, que fez Piaget pensar sobre os homens… Deles a primeira coisa que vi foram as conchas. Eu vi, simplesmente, sem nada saber sobre suas origens. Ignorava que existissem moluscos. Não sabia que elas, as conchas, tinham sido feitas para ser casas daqueles animais de corpo mole que, sem elas, seriam devorados pelos predadores. Meus olhos apenas viram. Viram e se espantaram.
 
O espanto -os gregos sabiam que é no espanto que o pensamento começa. O espanto vem quando um objeto se coloca diante de nós como um enigma a ser decifrado: “Decifra-me ou te devoro!”. Conchas são objetos espantosos.
 
Foi um espanto estético. Foi a beleza que exigiu que eu as decifrasse. Conchas são objetos assombrosos, construídos segundo rigorosas relações matemáticas. Os moluscos eram também artistas, arquitetos. Suas casas tinham de ser belas. Será que a natureza tem uma alma de artista? Coisa estranha essa, com certeza alucinação de poeta, imaginar que a natureza seja a casa de um artista!
 
Não para Bachelard, que não se envergonhava em falar sobre “imaginação da matéria”. Haverá uma analogia entre a natureza e o espírito humano? Serão os homens apenas a natureza tomando consciência de si? Antes que a “Pietá” existisse como escultura, existiu como realidade virtual na alma de Michelângelo. Antes que as conchas existissem como objetos assombrosos, elas existiam como realidades virtuais na “alma” dos moluscos…
 
Pensei que a vida não produz apenas objetos úteis, ferramentas adequadas à sobrevivência. A vida não deseja apenas sobreviver, ela não se satisfaz com a utilidade. Ela constrói os seus objetos segundo as normas da beleza. A vida deseja alegria. Assim acontece conosco: precisamos sobreviver e, para isso, cultivamos repolhos, nabos e batatas e estabelecemos a ciência do cultivo de repolhos, nabos e batatas. Esse é um dos sentidos da ciência: receitas para construir ferramentas para a sobrevivência.
 
Mas, por razões que se encontram além das razões científicas, talvez por obra do artista invisível que mora em nós, gastamos nosso tempo e nossas forças na produção de coisas inúteis, tais como violetas, orquídeas e rosas, coisas que não servem para nada e só dão trabalho… Nosso corpo não se alimenta só de pão. Ele tem fome de beleza. Creio que Jesus Cristo não se importaria e até mesmo sorriria se eu fizesse uma paráfrase da sua resposta ao diabo, que o tentava com a solução prática: “Não só de repolhos, nabos e batatas viverá o homem, mas também de violetas, orquídeas e rosas…”.
 
Ume menina perguntou a Mário Quintana se era verdade que os machados públicos iriam cortar um maravilhoso pé de figueira que havia numa praça. Isso o levou de volta aos seus tempos de menino. No quintal de sua casa havia uma paineira enorme, que, quando florescia, era uma glória. Até que um dia foi posta abaixo simplesmente “porque prejudicava o desenvolvimento das árvores frutíferas. Ora, as árvores frutíferas! Bem sabes, meninazinha, que os nossos olhos também precisam de alimento…”.
 
Penso que, desde que o objetivo da educação é permitir que vivamos melhor, nossas escolas deveriam tomar a natureza como sua mestra. Assim, já que tanto falam em Piaget, imaginei que poderiam adotar as conchas como símbolos, afinal de contas, foi no estudo dos moluscos que o seu pensamento sobre educação se iniciou.
 
E quando indagados por pais e alunos sobre as razões de serem as conchas os símbolos da escola, os professores teriam uma ocasião para lhes dar a primeira aula de filosofia da educação: O objetivo da educação é ensinar as novas gerações a construir casas. É preciso que as casas sejam sólidas, por causa da sobrevivência. Para isso as escolas ensinam a ciência. Mas não basta que nossas casas sejam sólidas, é preciso que sejam belas. A vida deseja alegria. Para isso as escolas ensinam as artes.
 
Hume, ao final do seu livro “Investigação sobre o Entendimento Humano”, propõe duas perguntas -somente duas-, que, se feitas, produziriam uma assepsia geral do conhecimento. De forma semelhante, e inspirado pela sabedoria dos moluscos e suas conchas, quero propor duas perguntas sobre tudo o que se ensina nas escolas. Primeira: isso que estou ensinando é uma ferramenta? Tem um uso prático? Aumenta o poder do aluno sobre o mundo que o cerca? De que forma ele pode usar isso que estou ensinando como ferramenta para construir a sua concha, a sua “casa”?
 
Segunda: isso que estou ensinando contribui para que o meu aluno se torne mais sensível à beleza? Educa a sua sensibilidade? Aumenta suas possibilidades de alegria e de espanto?
 
Concluo com as palavras de Hume: se a resposta for negativa, então “que seja lançado ao fogo”, porque nada tem a ver com a sabedoria da vida. Não passa de tolice e perda de tempo…
 
 
Rubem Alves

Neruda

Versículos do dia

"Portanto eu lhes digo: não se preocupem com suas próprias vidas, quanto ao que comer ou beber; nem com seus próprios corpos, quanto ao que vestir. Não é a vida mais importante do que a comida, e o corpo mais importante do que a roupa?


Observem as aves do céu: não semeiam nem colhem nem armazenam em celeiros; contudo, o Pai celestial as alimenta. Não têm vocês muito mais valor do que elas?

 


Quem de vocês, por mais que se preocupe, pode acrescentar uma hora que seja à sua vida?

 


"Por que vocês se preocupam com roupas? Vejam como crescem os lírios do campo. Eles não trabalham nem tecem.

 


Contudo, eu lhes digo que nem Salomão, em todo o seu esplendor, vestiu-se como um deles.


Animação


Frase

A humanidade tem dupla moral: uma que prega mas não pratica, outra que pratica mas não prega.
 

O que é um amigo de verdade?


domingo, 23 de novembro de 2014


"Pracas"

 
 

Luz de lanterna, sopro de vento

Tendo o marido partido para a guerra, na primeira noite da sua ausência a mulher acendeu uma lanterna e pendurou-a do lado de fora da casa. "Para trazê-lo de volta," murmurou. E foi dormir.
 
Mas, ao abrir a porta na manhã seguinte, deparou-se com a lanterna apagada. "Foi o vento da madrugada," pensou olhando para o alto como se pudesse vê-lo soprar.
 
À noite, antes de deitar, novamente acendeu a lanterna que, a distância deveria indicar ao seu homem o caminho de casa.
 
Ventou de madrugada. Mas era tão tarde e ela estava tão cansada que nada ouviu, nem o farfalhar das árvores, nem o gemido das frestas, nem o ranger das argolas da lanterna. E de manhã surpreendeu-se ao encontrar a luz apagada.
 
Naquela noite, antes de acender a lanterna, demorou-se estudando o céu límpido, as claras estrelas. "Na certa não ventará," disse em voz alta, quase dando uma ordem. E encostou a chama do fósforo no pavio.
 
Se ventou ou não, ela não saberia dizer. Mas antes que o dia raiasse não havia mais nenhuma luz, a casa desaparecia nas trevas.
 
Assim foi durante muitos e muitos dias, a mulher sem nunca desistir acendendo a lanterna que o vento, com igual constância apagava.
 
Talvez meses tivessem passado quando num entardecer, ao acender a lanterna, a mulher viu ao longe recortada contra a luz que lanhava em sangue o horizonte, a silhueta escura de um homem a cavalo. Um homem a cavalo que galopava na sua direção.
 
Aos poucos, apertando os olhos para ver melhor, destinguiu a lança erguida ao lado da sela, os duros contornos da couraça. Era um soldado que vinha. Seu coração hesitou entre o medo e a esperança. O fôlego se reteve por instantes entre lábios abertos. E já podia ouvir os cascos batendo sobre a terra, quando começou a sorrir. Era seu marido que vinha.
 
Apeou o marido. Mas só com um braço rodeou-lhe os ombros. A outra mão pousou na empunhadura da espada. Nem fez menção de encaminhar-se para a casa.
 
Que não se iludisse. A guerra não havia acabado. Sequer havia acabado a batalha que deixara pela manhã. Coberto de poeira e sangue, ainda assim não havia vindo para ficar. "Vim porque a luz que você acende à noite não me deixa dormir," disse-lhe quase ríspido. "Brilha por trás das minhas pálpebras fechadas, como se me chamasse. "Só de madrugada depois que o vento sopra posso adormecer."
 
A mulher nada disse. Nada pediu. Encostou a mão no peito do marido, mas o coração dele parecia distante, protegido pelo couro da couraça.
 
"Deixe-me fazer o que tem de ser feito, mulher," disse sem beijá-la. De um sopro apagou a lanterna. Montou a cavalo, partiu. Adensavam-se as sombras, e ela não pode sequer vê-lo afastar-se contra o céu.
A partir daquela noite, a mulher não acendeu mais nenhuma luz. Nem mesmo a vela dentro de casa, não fosse a chama acender-se por trás das pálbebras do marido.
 
No escuro, as noites se consumiam rápidas. E com elas carregavam os dias, que a mulher nem contava. Sem saber ao certo quanto tempo havia passado, ela sabia porém que era tanto.
 
E, passado , num final de tarde em que a soleira da porta despedia-se da última luz no horizonte, viu desenhar-se lá longe a silhueta de um homem. Um homem à pé que caminhava na sua direção. Protegeu os olhos com a mão para ver melhor e aos poucos, porque o homem avançava devagar, começou a distinguir a cabeça baixa, o contorno dos ombros cansados. Contorno doce, sem couraça, retendo o sorriso nos lábios- tantos homens haviam passado sem que nenhum fosse o que ela esperava. Ainda não podia ver-lhe o rosto, oculto entre a barba e o chapéu, quando deu o primeiro passo e correu ao seu encontro, liberando o coração. Era seu marido que voltava da guerra.
 
Não precisou perguntar-lhe se havia vindo para ficar. Caminharam até a casa. Já iam entrar. Quando ele se reteve. Sem pressa voltou-se, e, embora a noite ainda não tivesse chegado, acendeu a lanterna. Só entrou com a mulher. E fechou a porta.
 
 
COLASANTI, Marina."Luz de lanterna, sopro de vento ". IN: Um Espinho de Marfim e outras histórias. Porto Alegre: L&PM. p. 39,1999.

Viver é não saber que se vive

Ponho-me, às vezes, a olhar para o espelho e a examinar-me, feição por feição: os olhos, a boca, o modelado da fronte, a curva das pálpebras, a linha da face... E esta amálgama grosseira e feia, grotesca e miserável, saberia fazer versos? Ah, não! Existe outra coisa... mas o quê? Afinal, para que pensar? Viver é não saber que se vive. Procurar o sentido da vida, sem mesmo saber se algum sentido tem, é tarefa de poetas e de neurasténicos. Só uma visão de conjunto pode aproximar-se da verdade. Examinar em detalhe é criar novos detalhes. Por debaixo da cor está o desenho firme e só se encontra o que se não procura. Porque me não esqueço eu de viver... para viver?

Florbela Espanca, in "Diário do Último Ano"

sábado, 22 de novembro de 2014

Seu Lunga, o homem mais mal-humorado do mundo, morre aos 87 anos

Ele estava internado no hospital São Vicente; pai de 13 filhos e natural de Juazeiro do Norte, era considerado uma lenda.
 
Joaquim dos Santos Rodrigues, mais conhecido como Seu Lunga, morreu aos 87 anos, em decorrência de um câncer no esôfago. A morte foi registrada na manhã deste sábado (22), às 9h30. Ele estava internado no hospital São Vicente, em Barbalha. Pai de 13 filhos e natural de Juazeiro do Norte, era considerado uma lenda, tendo inspirado personagem de novela e até se arriscado na poesia.
 
Dono de uma loja de sucatas, onde era possível encontrar desde pregos a aparelhos eletrônicos e frutas, o que realmente atraía turistas e moradores da região era o temperamento do vendedor. E se fosse comprar algo, nem ousasse questionar “isso é para vender?”, que Seu Lunga já tinha uma patada na ponta da língua. “O único lugar onde se encontra coisa exposta que não é pra vender é no museu”. Caso a indagação fosse, “mas esse aparelho está funcionando?”, era bom se preparar que viria chumbo grosso. “Como é que pode estar funcionando, se não está ligado?”.
 
As respostas duras deram fama de ignorante ao comerciante. Conhecido pela falta de paciência e resposta na ponta da língua, diziam que ele era um sério candidato a homem mais mal-humorado do mundo, pelo Guiness Book. Algumas histórias são verídicas, outras talvez sejam apenas piadas ou lendas que faziam alusão à sua grosseria, que vai deixar saudade.

Biografia
 
Joaquim dos Santos Rodrigues nasceu em 18 de agosto de 1927, no município de Caririaçu. Recebeu um apelido por uma senhora, que era vizinha, e passou a chamá-lo de Calunga, que se reduziu para Lunga. Com 16 anos foi morar no município de Juazeiro do Norte. Casou em 1951 com Carmelita Rodrigues Camilo, com quem teve 13 filhos.
 
 
Por Roberta Tavares
 
Fonte e créditos aqui
Ter opiniões é estar vendido a si mesmo. Não ter opiniões é existir. Ter todas as opiniões é ser poeta.

 Fernando Pessoa

Poema da Gare do Astapovo

O velho Leon Tolstoi fugiu de casa aos oitenta anos
E foi morrer na gare de Astapovo!
Com certeza sentou-se a um velho banco,
Um desses velhos bancos lustrosos pelo uso
Que existem em todas as estaçõezinhas pobres do mundo,
Contra uma parede nua...
Sentou-se... e sorriu amargamente
Pensando que
Em toda a sua vida
Apenas restava de seu a Glória,
Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas
Coloridas
Nas mãos esclerosadas de um caduco!
E então a Morte,
Ao vê-lo sozinho àquela hora
Na estação deserta,
Julgou que ele estivesse ali à sua espera,
Quando apenas sentara para descansar um pouco!
A Morte chegou na sua antiga locomotiva
(Ela sempre chega pontualmente na hora incerta...)
Mas talvez não pensou em nada disso, o grande Velho,
E quem sabe se até não morreu feliz: ele fugiu...
Ele fugiu de casa...
Ele fugiu de casa aos oitenta anos de idade...
Não são todos os que realizam os velhos sonhos da infância!


Mário Quintana

Artista de rua


Proteção ou independência, eis a questão

Hoje, depois de quase dois anos de Washington, aprendi a enxergar os benefícios de uma educação à la “faça você mesmo”.
 
Eu pensei muito sobre o que iria escrever nessa minha estreia nas Cartas de Washington e resolvir falar sobre o que mais temia nessa mudança de país, que era a adaptação do meu filho Daniel, hoje com quatro anos. Eram muitas dúvidas. O que ele vai achar de morar em outro país? Ele vai sentir falta da família? Vai aprender a falar inglês? E a escola, ele vai gostar da escola?
 
Todas essas perguntas foram sendo respondidas naturalmente, com o passar dos dias. E, clichê ou não, as crianças se adaptam de uma forma surpreendente. O Daniel adora morar na “Améurica”, como diz ele, já com sotaque americano; fala inglês fluente e aprendeu a matar a saudade dos tios e dos avós por Skype. Mas, entre todas as mudanças, uma merece destaque: a escola.
 
Não estou falando da Escola do Daniel em si, mas das escolas americanas de forma geral e de como são diferentes das brasileiras. Aqui, elas ensinam as crianças a serem mais autônomas, uma espécie de mini adultos, algo que acontece menos no Brasil, pelo menos enquanto elas são bem pequenas.
 
Essa diferença assusta as marinheiras de primeira viagem. Quando eu ainda estava no Brasil, o Daniel foi para uma escola/berçário com cinco meses e ficou até os dois anos e meio, quando mudamos para cá. A escola era uma espécie de segunda casa dos filhos e um sossego para as mães. As crianças recebiam comida na boca; tomavam banho e eram vestidas dos pés à cabeça; jamais desciam as escadas sozinhas; e, quando choravam, recebiam um colo acalentador.
 
Aqui o jogo é outro. As crianças comem e se vestem sozinhas; sobem e descem escada sem ninguém segurá-las; e, quando choram, têm uma conversa de igual para igual com a professora, explicando o que está errado. Até com os amigos são orientadas a ter uma postura mais adulta num conflito. Elas aprendem a dizer para o amigo que o irrita com algo: não faça isso, eu não gosto.
 
Num primeiro, segundo, milésimo momento, fiquei incomodada com essa forma americana de educar. O Daniel, por exemplo, é uma criança difícil para comer e a professora dizia que ele quase não almoçava. Eu perguntei se ela poderia dar comida para ele, o que faria o meu aprendiz de faquir comer um pouco mais. Ouvi um solene “não”, seguido do argumento, legítimo, de que as crianças comiam sozinhas e de que o Daniel não poderia ser tratado como uma exceção.
 
Hoje, depois de quase dois anos de Washington, aprendi a enxergar os benefícios de uma educação à la “faça você mesmo”. As crianças se tornam independentes muito mais cedo. Um viva às diferenças.
 
 
Daniele Camba

Artista de rua


Frase

No caso do mensalão, falávamos que estávamos julgando o maior caso de corrupção investigado e identificado. Agora, a Ação Penal 470 teria que ser julgada em juizado de pequenas causas pelo volume que está sendo revelado nesta questão.
 
 
Gilmar Mendes, ministro do STF, sobre o escândalo da Petrobras

Você sabe o que está tomando?


Vida ilusória

Ao mesmo tempo que a realidade é uma fábula, simulações e enganos são considerados como as verdades mais sólidas. Se os homens se detivessem a observar apenas as realidades, e não se permitissem ser enganados, a vida, comparada com as coisas que conhecemos, seria como um conto de fadas ou as histórias das Mil e Uma Noites.

Se respeitássemos apenas o que é inevitável e tem direito a ser, a música e a poesia ressoariam pelas ruas fora. Quando somos calmos e sábios, percebemos que só as coisas grandes e dignas têm existência permanente e absoluta, que os pequenos medos e os pequenos prazeres não passam de sombra da realidade, o que é sempre estimulante e sublime. Por fecharem os olhos e dormirem, por consentirem ser enganados pelas aparências, os homens em toda a parte estabelecem e confinam as suas vidas diárias de rotina e hábito em cima de fundações puramente ilusórias.

Henry David Thoreau, in 'Walden'

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

"Cerca de 6,7 milhões de brasileiros não têm acesso a sanitários. A revelação é do relatório Glass, divulgado nesta quarta-feira pela Organização Mundial da Saúde (OMS)."
 
Em resumo: Há mais aparelhos celulares que banheiros no Brasil!
 
Esse é o retrato do nosso país!
 
Teófilo Júnior

Ganhadoras do World Press Photo 2014, principal prêmio de fotografia do mundo.

Imigrantes africanos com telefones celulares apontados para o céu
1º lugar geral do World Press Photo e 1º na categoria Assuntos Contemporâneos (John Stanmeyer/National Geographic)
 
 
Procissão de sobreviventes da passagem do tufão Haiyan pelas Filipinas
1º lugar na categoria Individual — Notícias Locais
(Phillipe Lopez/AFP/AP)
 
Centro de emergência para refugiados em Sofia, Bulgária
1º lugar na categoria Individual — Retrato
(Markus Schreiber/The Associated Press)
 
Sul-africana lamenta a morte de Nelson Mandela.
1º lugar na categoria Reportagem — Retrato
(Carla Kogelman/The Netherlands)
 
Hannah e Alena, duas irmãs que vivem na aldeia rural de Merkenbrechts, Áustria
 
 
Puma estacionado na trilha de um parque em Los Angeles
1º lugar na categoria Reportagem — Natureza
(Steve Winter/National Geographic)
 
Grupo de albinos fotografados numa sala de aula em Bengala Ocidental, Índia.
1º lugar na categoria Individual — Retrato Posado
(Brent Stirton/Getty Images)
 
 
Nadja Casadei, atleta sueca diagnosticada com câncer em 2013
1º lugar na categoria Reportagem — Esportes
(Peter Holgersson/AP)
 
Rebeldes sírios tentam esconder-se durante um ataque inimigo
1º lugar na categoria Reportagem – Notícias Locais
(Goran Tomasevic/Reuters)
 
 
Fonte aqui
Quando descobrires todos os mistérios da vida, ansiareis pela morte, pois ela não é senão um outro mistério da vida.
 
Gibran Kalil Gibran

Velhos hábitos

A história da propina no Brasil talvez não seja tão antiga, mas o costume já tem uma longa biografia.

Esta o Pero Vaz de Caminha não contou.
 
Os portugueses tiveram alguma dificuldade para se comunicar com os indígenas, na sua chegada ao Brasil. Um dos comentários ouvidos na praia, logo depois do descobrimento, foi:
 
— Ou estes gajos não sabem falar português ou estiveram no dentista há pouco e ainda sentem os efeitos da anestesia, pá. Não se percebe nada do que dizem!
 
Tenta daqui, tenta dali e finalmente se entenderam. Cabral, comandante da expedição portuguesa, deveria falar com o cacique Tamosaí, aparentemente o comandante dos índios. A conversa — feita mais com mímica e linguagem de surdo-mudo do que com palavras — foi mais ou menos assim:
 
Tamosaí — O que homens esquisitos, brancos e com barba, querem?
 
Cabral — Tudo.
 
Tamosaí — Como, tudo?
 
Cabral — Tudo. Do Oiapoque ao Chuí. E, então?
 
Tamosaí — Hmmm. OK. Mas antes...
 
E Tamosaí estendeu a mão com a palma virada para cima e disse:
 
— Molha.
 
— Ai, Jesus — suspirou Cabral. — Começou...
 
A história da propina no Brasil talvez não seja tão antiga, mas o costume já tem uma longa biografia. Assim como o poder das empreiteiras, cuja origem é difícil de localizar no tempo.
 
Talvez tenha começado com o nosso protoempreendedor Barão de Mauá. Certamente se consolidou com o furor desenvolvimentista da Era Juscelino. Novidade mesmo é as empreiteiras obrigadas a explicar seus velhos hábitos, nunca dantes questionados, e seus diretores estarem dormindo em colchões no duro chão de uma cadeia. No fim, quem tem razão para festejar é o senador Pedro Simon. Há anos sua insistência que os corruptores sejam incluídos na investigação e punição da corrupção é ignorada no Congresso. No fim da sua vida pública, veio o desagravo.
 

Luis Fernando Veríssimo