sábado, 30 de junho de 2018

Você descobre que se leva muito tempo para se tornar a pessoa que quer ser, e que o tempo é curto.

William Shakespeare
O que mais dói na miséria é a ignorância que ela tem de si mesma. Confrontados com a ausência de tudo, os homens abstêm-se do sonho, desarmando-se do desejo de serem outros. Existe no nada essa ilusão de plenitude que faz parar a vida e anoitecer as vozes.

Mia Couto
Vozes Anoitecidas

Versículo do dia

Respondeu Jesus: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, a não ser por mim. 

Frase

Devemos ter muito cuidado para não emitir uma opinião demasiado favorável de um homem que acabamos de conhecer; pelo contrário, na maioria das vezes, seremos desiludidos, para nossa própria vergonha ou até para nosso dano.

Prece, Fernando Pessoa


Das utopias

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.

Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...

Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A mágica presença das estrelas!


Tão bom viver dia a dia...
A vida assim, jamais cansa...

Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu...

E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...

E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.

Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.

Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!

E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas...  


Mário Quintana

sexta-feira, 29 de junho de 2018




Há maquinas terrívelmente complicadas para as necessidades mais simples.
Se quer fumar um cachuto aperte um botão,
Paletós abotoam-se por eletricidade,
Amor e faz pelo sem-fio,
Não precisa estômago para digestão (...)

Carlos Drummond de Andrade

quinta-feira, 28 de junho de 2018

Com gols de Paulinho e Thiago Silva Brasil vence a Sérvia

Paulino se antecipa ao goleiro da Sérvia e abre o placar  

Thiago Silva aproveita o escanteio de Neymar e amplia para o Brasil 
 
Brasil vence a Sérvia e avança para as oitavas de finais da Copa 2018. O adversário será o México.

Justiça desobriga autores de ação a afixar placa em seus estabelecimentos sobre discriminação sexual

Estado da Paraíba fica proibido de aplicar sanções a promoventes de ação que defendem ilegalidade de lei

A juíza da 1ª Vara da Fazenda Pública da Capital, Flávia da Costa Lins Cavalcanti, concedeu tutela de urgência, na tarde desta terça-feira (26), determinando que o Estado se abstenha de aplicar qualquer sanção aos autores da Ação de Obrigação de Fazer pela não aplicação das Leis nº 7.309/2003 e nº 10.895/2017. Esta última obriga os estabelecimentos comerciais e órgãos públicos da Administração Direta e Indireta, sediados no Estado da Paraíba, a afixarem cartazes contendo a seguinte afirmação: “Discriminação por orientação sexual é ilegal e acarreta multa, Lei estadual nº 7.309/2003 e Decreto nº 2760/2006.”.

Na Ação de Obrigação de Fazer com tutela de urgência e pedido de declaração incidental de inconstitucionalidade nº 0842055-57.2017.8.15.2001, promovida por Márcio Túllio de Farias Chaves ME, VM Ensino Médio Ltda. EPP, DHD Ensino Infantil e Fundamental Ltda. – EPP, Honório Dantas & Cia Ltda. – EPP, MJ Ensino Infantil, Fundamental e Médio Ltda. – EPP e Book Store Comércio de Livros Ltda. contra o Estado da Paraíba, os autores historiam que, no dia 30 de maio do corrente ano, entrou em vigor a Lei nº 10.895/2017, determinando a fixação de cartazes, em todos os estabelecimentos sediados no Estado da Paraíba, no tamanho 50cm x 50cm, com o texto citado.

Os promoventes afirmam que tal medida é desproporcional e impositiva e que vem gerando prejuízo aos comercialmente, especialmente os pequenos, uma vez que, ao invés de expor os seus produtos, têm que afixar o referido cartaz.

Fundamentam, ainda, que a lei decorre de uma necessidade coletiva, não sendo função do legislador criar lei em benefícios de particulares. Aduzem, também, que a lei em foco padece de vício de iniciativa e inconstitucionalidade material, uma vez que trata de matéria de direito civil, de competência exclusiva da União, o que violaria o princípio da igualdade.

Ao decidir sobre o caso, a magistrada observou que a placa objeto da lei, cuja afixação foi impositiva, sob pena de pagamento de multa aos descumpridores, visa assegurar o cumprimento da norma constitucional que veda a discriminação em razão de sexo/opção sexual. Ao mesmo tempo, viola, dentre outros princípios, o da livre iniciativa e o consagrado princípio constitucional da igualdade.

A juíza Flávia Cavalcanti afirmou que, sopesando os valores trazidos à apreciação, entende-se que deve prevalecer os interesses da maioria, que não pode ver tolhida a sua liberdade para atender parcela da sociedade. “Apesar de sofrer com a discriminação que realmente existe, não são as únicas vítimas de tais atos criminosos, os quais se originam no preconceito de cor, idade, origem, entre outros, e, nem por isso, em relação às ditas vítimas, se pode exigir igualmente a afixação do respectivo cartaz, reproduzindo o teor da lei que criminaliza ditas condutas”, enfatizou.

Com isso, a magistrada afirmou estarem presentes os requisitos necessários à concessão da tutela de urgência, estando a plausabilidade do direito demonstrada, bem como o perigo da demora, “na medida em que o constrangimento/prejuízos causados aos estabelecimentos obrigados a afixar a placa em tela é diário e aumenta com o passar do tempo.

Por Eloise Elane
Fonte Site do TJPB
O ser humano vivencia a si mesmo, seus pensamentos como algo separado do resto do universo - numa espécie de ilusão de ótica de sua consciência. E essa ilusão é uma espécie de prisão que nos restringe a nossos desejos pessoais, conceitos e ao afeto por pessoas mais próximas. Nossa principal tarefa é a de nos livrarmos dessa prisão, ampliando o nosso círculo de compaixão, para que ele abranja todos os seres vivos e toda a natureza em sua beleza. Ninguém conseguirá alcançar completamente esse objetivo, mas lutar pela sua realização já é por si só parte de nossa liberação e o alicerce de nossa segurança interior.

Albert Einstein

terça-feira, 26 de junho de 2018


Frase

Um único minuto de reconciliação vale mais do que toda uma vida de amizade.

Gabriel García Márquez

Versículos do dia

Então lhe disse: Se tu mesmo não fores conosco, não nos faças subir daqui.
 
Mas, quando vier aquele Espírito de verdade, ele vos guiará em toda a verdade; porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido, e vos anunciará o que há de vir.

segunda-feira, 25 de junho de 2018

Soneto do amifo

Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...  


Vinicius de Moraes

domingo, 24 de junho de 2018

Só envelhece quem vive.

Nélida Piñon
O belo é o esplendor da ordem.

Aristóteles
Copa 2018
É sempre assim. Morre-se. Não se compreende nada. Nunca se tem tempo de aprender. Envolvem-nos no jogo. Ensinam-nos as regras e à primeira falta matam-nos.

Ernest Hemingway

Nordeste vive o São João

Invicto

Da noite escura que me cobre,
Como uma cova de lado a lado,
Agradeço a todos os deuses
A minha alma invencível.


Nas garras ardis das circunstâncias,
Não titubeei e sequer chorei.
Sob os golpes do infortúnio
Minha cabeça sangra, ainda erguida.


Além deste vale de ira e lágrimas,
Assoma-se o horror das sombras,
E apesar dos anos ameaçadores,
Encontram-me sempre destemido.


Não importa quão estreita a passagem,
Quantas punições ainda sofrerei,
Sou o senhor do meu destino,
E o condutor da minha alma.


William Ernest Henley

Versículos do dia

Depois disto ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem há de ir por nós? Então disse eu: Eis-me aqui, envia-me a mim.
 
Assim como tu me enviaste ao mundo, também eu os enviei ao mundo.

Winter (The Four Seasons) - António Vivaldi (1678-1741)

Saiba o que precisa ocorrer para o Brasil se classificar às oitavas

Nesta sexta-feira (22/6), Seleção venceu, com dificuldade, pela primeira vez na Copa do Mundo da Rússia
 
Após a vitória sobre a Costa Rica por 2 x 0, nesta sexta-feira (22/6), as chances de classificação da Seleção Brasileira para as oitavas de final da Copa do Mundo da Rússia aumentaram bastante. Porém, ainda não é tão confortável. A boa notícia é que o time comandado por Tite depende apenas das suas forças para avançar de fase.
Se tropeçar diante dos sérvios, o Brasil dependerá de combinações de resultados de outras partidas. O pior cenário para os sul-americanos é a vitória da Suíça nesta sexta sobre os escandinavos. O resultado dessa partida vai influenciar diretamente a situação dos brasileiros na luta pela classificação.
Se o Brasil vencer ou empatar com a Sérvia, na próxima quarta-feira, às 15h, vai carimbar vaga para as oitavas, independentemente, dos outros resultados do grupo. A dúvida será apenas em que posição (primeiro ou segundo colocado).
Mas, se a Seleção perder, há algumas combinações que passam pelo jogo desta sexta e também o duelo entre Costa Rica e Suíça, que se enfrentarão na mesma hora do jogo do Brasil com os sérvios.
Veja as situações que podem deixar o time brasileiro fora da Copa do Mundo:
– Vitória da Sérvia contra a Suíça nesta sexta:
o Brasil pode ser eliminado se perder para os escandinavos e os suíços vencerem a Costa Rica. Ambos ficarão com quatro pontos a diferença será nos critérios de desempate, que contam saldo de gols, números de gols marcados, dentre outros critérios.
– Empate entre Sérvia e Suíça:
Brasil é eliminado se a Costa Rica perder para os suíços.
– Vitória da Suíça sobre a Sérvia
Brasil é eliminado se perder para os escandinavos e suíços empatarem com os costarriquenhos na rodada final.
 
Estadão

sábado, 23 de junho de 2018

Quem perde seus bens perde muito; quem perde um amigo perde mais; mas quem perde a coragem perde tudo.

Por céus e mares eu andei,
Vi um poeta e vi um rei
Na esperança de saber
O que é o amor.

Ninguém sabia me dizer,
Eu já queria até morrer
Quando um velhinho
Com uma flor assim falou:

O amor é o carinho,
É o espinho que não se vê em cada flor.
É a vida quando
Chega sangrando aberta
em pétalas de amor.  


Vinicius de Moraes

Fernando Pessoa

Versos a um Coveiro

Numerar sepulturas e carneiros,
Reduzir carnes podres a algarismos,
Tal é, sem complicados silogismos,
A aritmética hedionda dos coveiros!


Um, dois, três, quatro, cinco… Esoterismos
Da Morte! E eu vejo, em fúlgidos letreiros,
Na progressão dos números inteiros
A gênese de todos os abismos!


Oh! Pitágoras da última aritmética,
Continua a contar na paz ascética
Dos tábidos carneiros sepulcrais


Tíbias, cérebros, crânios, rádios e úmeros,
Porque, infinita como os próprios números
A tua conta não acaba mais!


Augusto dos Anjos
 – Eu e Outras poesias

Repente

O poeta repentista Sebastião fazia feliz temporada em São Paulo, mas com muita saudade da terra querida, onde deixara amigos e parentes. Numa cantoria, o companheiro lhe cedeu esta deixa:

“Como é que você está
nesta terra bandeirante?”

Sebastião improvisou inspirado e saudoso:

“Na Capital Bandeirante
eu vim fazer um passeio,
mas, ao deixar o Nordeste,
parti a alma no meio...
Ou vem a banda de lá,
Ou vai a banda que veio.

Flash Back


Prefácio

Assim é que elas foram feitas (todas as coisas) —
sem nome.
Depois é que veio a harpa e a fêmea em pé.
Insetos errados de cor caíam no mar.
A voz se estendeu na direção da boca.
Caranguejos apertavam mangues.
Vendo que havia na terra
dependimentos demais
e tarefas muitas —
os homens começaram a roer unhas.
Ficou certo pois não que as moscas iriam iluminar
o silêncio das coisas anônimas.
Porém, vendo o Homem
que as moscas não davam conta de iluminar o
silêncio das coisas anônimas —
passaram essa tarefa para os poetas.

Manoel de Barros, do livro “Concerto a céu aberto para solos de ave” (1981), em ‘Poesia completa: Manoel de Barros’. São Paulo: Editora Leya, 2010.

A festa das torcidas





sexta-feira, 22 de junho de 2018


Brasil x Costa Rica

“Chicharrones”

Chegou a hora de provarmos os chicharrones da Costa Rica. Espero que não seja uma iguaria indigesta aos brasileiros nesta Copa do Mundo de 2018. 

Sem remédio

Aqueles que me têm muito amor
Não sabem o que sinto e o que sou...
Não sabem que passou, um dia, a Dor
À minha porta e, nesse dia, entrou.

E é desde então que eu sinto este pavor,
Este frio que anda em mim, e que gelou
O que de bom me deu Nosso Senhor!
Se eu nem sei por onde ando e onde vou!!

Sinto os passos de Dor, essa cadência
Que é já tortura infinda, que é demência!
Que é já vontade doida de gritar!

E é sempre a mesma mágoa, o mesmo tédio,
A mesma angústia funda, sem remédio,
Andando atrás de mim, sem me largar!

                               Florbela Espanca

Стихи. Читает Елена Кирьянова

Os viajantes e o urso

Um dia dois viajantes dera de cara com um urso. O primeiro se salvou escalando uma árvore, mas o outro, sabendo que não ia conseguir vencer sozinho o urso, se jogou no chão e fingiu-se de morto. O urso se aproximou dele e começou a cheirar sua orelha, mas, convencido de que estava morto, foi embora. O amigo começou a descer da árvore e perguntou:
_O que o urso estava cochichando em seu ouvido?
_Ora, ele só me disse para pensar duas vezes antes de sair por aí viajando com gente que abandona os amigos na hora do perigo.

Moral da história:
A desgraça põe à prova a sinceridade e a amizade  

Botas...as botas apertadas são uma das maiores venturas da terra, porque, fazendo doer os pés, dão azo ao prazer de as descalçar.

Machado de Assis

quinta-feira, 21 de junho de 2018

Croácia 3 x 0 Argentina

A Croácia papou a picanha argentina!



A liberdade é um dos dons mais preciosos que o céu deu aos homens. Nada a iguala, nem os tesouros que a terra encerra no seu seio, nem os que o mar guarda nos seus abismos. Pela liberdade, tanto quanto pela honra, pode e deve aventurar-se a nossa vida.

Sendo este um jornal por excelência, e por excelência dos precisa-se e oferece-se, vou pôr um anúncio em negrito: precisa-se de alguém homem ou mulher que ajude uma pessoa a ficar contente porque esta está tão contente que não pode ficar sozinha com a alegria, e precisa repartila. Paga-se extraordinariamente bem: minuto por minuto paga-se com a própria alegria. É urgente pois a alegria dessa pessoa é fugaz como estrelas cadentes, que até parece que só se as viu depois que tombaram; precisa-se urgente antes da noite cair porque a noite é muito perigosa e nenhuma ajuda é possível e fica tarde demais. Essa pessoa que atenda ao anúncio só tem folga depois que passa o horror do domingo que fere. Não faz mal que venha uma pessoa triste porque a alegria que se dá é tão grande que se tem que a repartir antes que se transforme em drama. Implora-se também que venha, implora-se com a humildade da alegria-sem-motivo. Em troca oferece-se também uma casa com todas as luzes acesas como numa festa de bailarinos. Dá-se o direito de dispor da copa e da cozinha, e da sala de estar. P.S. Não se precisa de prática. E se pede desculpa por estar num anúncio a dilarecerar os outros. Mas juro que há em meu rosto sério uma alegria até mesmo divina para dar.

Clarice Lispector

quarta-feira, 20 de junho de 2018

Humor

A professora pergunta a Joãozinho:
- Joãozinho, se eu tenho duas mangas em uma mão e duas na outra, o que eu tenho?
- Mãos grandes, fessora!

Os três mosqueteiros


O amor, o cinema e a revolução

Nem tudo que diz respeito aos anos 1960 pode ser carimbado com a fórmula “sexo, drogas e rock-and-roll”.
O livro de memórias de Anne Wiazemsky, Um Ano Depois (Ed. Todavia, 2018, trad. Julia de Rosa Simões) poderia se chamar O amor, o cinema e a revolução, porque era mais ou menos este o lema em vigor na época que ela viveu tão de perto e descreve tão bem.
Anne foi casada com Jean-Luc Godard e aparece nos seus filmes A Chinesa, Week End, One Plus One, além do Teorema (1968) de Pier Paolo Pasolini e A Grande Testemunha (1966) de Robert Bresson. Era uma atriz discreta, mas muito fotogênica, e correspondia (tal como Anna Karina, a esposa-musa anterior de Godard) ao tipo mediano das garotas daquele tempo.
Alguém dirá que nem todas as garotas daquele tempo eram tão bonitas; mas atrizes como estas duas reproduzem modos de andar, de vestir, de sentar, de discutir, de dançar, de cantar, nos quais rapazes e moças se reconheciam sem esforço. Essas atrizes de cinema que a gente chama de “musas de uma geração” nem sempre são bonitas. Elas são  um conjunto de atitudes, inflexões de voz, movimentos, olhares, que dão a sensação imediata de uma verdade de dentro para fora.
Anna Wiazemsky relata as agitações de 1968 com o olho de quem, quando deu fé, estava no centro do furacão, coitada. E ao lado de Godard, no ano crucial da vida do diretor – quando este parou de fazer filmes sobre garotas como ela e começou a fazer filmes de esquerdismo militante e radical. Com quase 40 anos, Godard estava se fascinando cada vez mais com o ardor combativo dos jovens radicais do movimento estudantil.
Era principalmente Jean-Jock quem falava, os silêncios de Jean-Luc me surpreendiam: ficar calado na presença de outra pessoa não era um dos seus hábitos, ele sempre precisava ter a última palavra. (p. 21)
Há um episódio pitoresco logo no início, quando Godard é convidado para dirigir o filme O Assassinato de Trotsky tendo John Lennon no papel-título. Ele e Anne viajam a Londres, se reúnem com os Beatles na Apple, mas os “santos” de Godard e Lennon não se harmonizam em momento algum (o que não é de admirar), e a reunião termina com Paul McCartney convidando Anne para tomar chá embaixo da mesa.
O projeto não foi à frente; mas como Godard já estava em Londres, com um pré-contrato assinado, acabou aceitando dirigir os Rolling Stones em One Plus One, que não passa de uma longa maratona de ensaios da canção “Sympathy for the Devil”, intercalado com discursos marxistas-leninistas.
No pinga-fogo das passeatas estudantis, com as ruas de Paris sendo desparalelepipedadas pelos estudantes para combater a polícia, a cidade parou. Diz Anne: “em pouco tempo os estoques de rádios de pilha pela primeira vez se esgotaram no país”. Godard vai para as passeatas cheio de perplexidade e entusiasmo, tropeça, quebra os óculos...
O bom de livros assim é trazer esses olimpianos (como os chamava Edgar Morin) ao plano banal e nada heróico de nós mesmos. É romântico, mas também dá um certo consolo financeiro, saber que de manhã Godard levava para Anne uma bandeja com “uma xícara de Nescafé e um pão com manteiga”. E lendo relatos do dia a dia de pessoas tão famosas (aparecem Bernardo Bertolucci, Gilles Deleuze, Pier Paolo Pasolini, etc.) a gente vê como o pessoal daquele tempo vivia modestamente. Comparados a eles, nós brasileiros de hoje somos uns xeiques sauditas.
Maio 1968 ficou de certa forma como um modelo de estudo para manifestações de rua por muito tempo. Não há como não reconhecer Junho 2013 em trechos como:
Às vezes, exaustos, parávamos num café para descansar ou beber alguma coisa. Todos os cafés estavam abertos, nenhuma porta fechada. Os comerciantes e moradores do bairro se diziam indignados com a violência policial e não deixavam de ajudar os jovens que buscavam abrigo. (p. 35)
Os confrontos tinham começado sem que ninguém soubesse por quem. Os estudantes acusavam as forças de segurança, que por sua vez acusavam os estudantes. Pela primeira vez, ouvimos falar em “elementos incontroláveis” que teriam se infiltrado na passeata para semear a discórdia. Estudantes entrevistados falavam em “provocadores manipulados pela polícia”. (p. 44)
Somente alguns estudantes, que ele julgava pertenceram à UNEF e que portavam megafones, pediam sem cessar: “Voltem para casa, não se deixem manipular... A manifestação de luto terminou há muito tempo... Voltem para suas casas.” (...)  Um grupo de uma centena de jovens, rostos cobertos por lenços, muitas vezes com capacetes e armados de coquetéis Molotov, lhe parecia particularmente perigoso porque estava visivelmente determinado a lutar. (p. 116)
Não é um livro de análises, é um livro de lembranças e comentários. Engana-se quem pensa que Jean-Luc Godard era diferente de qualquer um de nós no que diz respeito à comédia conjugal. Anne Wiazemsky tinha 21 anos então, Jean-Luc tinha 37 e além do mais era o que o pessoal chama “uma lenda viva”, “uma pessoa pública, um oráculo, uma estrela, uma espécie de deus” (p. 114)
O que não o impedia de, no dia seguinte a um bate-boca feroz com Anne, pedir desculpas nestes termos: “Lamento o que disse antes, falei sem pensar, e, se você acreditou, é uma imbecil.
Um livro de memórias é sempre um livro onde o autor demonstra que quem tinha razão era ele. O livro de Anne Wiazemsky é uma série de flashes breves na vida de uma garota que, por caminhos de família e de profissão, estava no epicentro da crise ideológica de sua época. Muita tinta filosófica e política já correu sobre Maio 1968, mas a tinta de Anne, se não traz nenhum “raio ordenador” sobre aquela balbúrdia, relata com clareza o que era estar no meio dela.


(A Grande Testemunha)
 
 
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo