Algumas palavras
entram em desuso na linguagem comum, vão deixando de ser usadas, as pessoas vão
se esquecendo delas; às vezes ficam tão mortas e ressequidas que caem até do
dicionário. Ocorrem, no entanto, que algumas delas sejam preservadas em frases
feitas, em modos de dizer que as utilizam e que acabam sendo as únicas vezes em
que elas são chamadas à ativa.
Vi no saite MentalFloss um
útil artigo da linguista Arika Okrent sobre palavras assim na língua inglesa. O
verbo “to wend”, que significa “ir”, sumiu; ficou apenas na expressão “to wend
my/your/his way”, que significa “seguir caminho”. Ela explica que “to go” e “to
wend” eram sinônimos de uso corrente, mas o segundo sumiu, deixando de si apenas
o particípio passado, “went”, que transformou “to go” num esquisito verbo
irregular. Outro caso curioso é a palavra “fro”, que eu só conhecia da
expressão “to and fro”, que significa “de um lado para o outro, pra lá e pra
cá”. Diz ela que é uma pronúncia arcaica de “from”, o que, agora sim, dá sentido
à frase, sugerindo a ida e a vinda.
Temos expressões parecidas
em português. Um exemplo que me vem à memória é a frase “não vale um tostão, não
vale um tostão furado”. Quanto é o valor monetário de um tostão? Não sei, porque
quando nasci ele já estava obsoleto. Sobreviveu colado à frase. Algo parecido se
deu com “comer uma arroba de sal com Fulano” (=conviver bem de perto com Fulano,
pois sal come-se aos pouquinhos); arroba como medida de peso já foi pro espaço,
mas a palavra acabou tendo uma ressurreição paralela, ligada ao símbolo “@”, tão
útil hoje em dia.
Não sei se a palavra
“alvíssaras” ainda subsiste fora da expressão “pedir as alvíssaras”, que se
atribui a quem é o primeiro a dar uma notícia. “Fulano ontem de noite chegou
aqui em casa pedindo as alvíssaras, porque a irmã dele vai ter neném.” Vem do
antigo costume português, preservado nos cantos da “Nau Catarineta”: “Alvíssaras
meu capitão / Meu capitão general! / Já vejo terras de Espanha / areias de
Portugal!”.
Não são apenas palavras que
subsistem assim, mas idéias. Muitos jovens hoje usam a expressão “cair a ficha”
sem saber que ela se deve aos orelhões, os telefones públicos onde a ficha caía
quando havia conexão, alguém atendia do outro lado. (Em inglês há expressão
paralela: “the coin dropped”, “a moeda caiu”).
Tem a expressão “dar às de vila diogo”, que significa
“fugir, passar sebo nas canelas, bater em retirada”. O tal Vila Diogo,
que não sei quem seja, foi preservado na frase, mas vejam só o que é a língua,
somente macróbios de óculos fundo-de-garrafa como eu recordam a expressão. Neste
caso parece que afundou foi tudo.
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo
Nenhum comentário:
Postar um comentário