Uma biblioteca móvel passava todo mês perto de casa quando eu era criança. De
início, eu ia para acompanhar minha mãe, mas com o tempo encontrei no ônibus
verde e branco um novo mundo quando subia seus degraus. E, ao descê-los, estava
sempre abraçada, satisfeita e orgulhosa, a um livro.
Lembrei disso ao ler sobre uma pesquisa recente feita no Reino Unido que
descobriu que uma em cada cinco crianças tem vergonha de ser vista com um
livro.
O estudo da National Literacy Trust, instituição de caridade que estimula a
alfabetização, revelou que não se trata dos jovens mudando seus padrões de
leitura do papel para o meio digital pois nos últimos anos a leitura em
praticamente todos os formatos caiu.
Apenas 25% das crianças disse ler no seu tempo livre e uma em três disse ler
só quando precisa. A pesquisa mostrou também que muitas crianças acreditam que
seus pais não se importam se elas leem ou não.
Uma das principais conclusões do estudo, feito com crianças com idades entre
oito e dezesseis anos é que os jovens tendem a ler menos quanto mais suas vidas
ficam ocupadas. Ou seja, a garotada desiste de ler para dar preferência a outras
atividades.
O que leva à crença de que são necessários maiores incentivos que mostrem que
a leitura é uma coisa boa.
A Inglaterra estimula a leitura de um modo muito bacana. Todo bebê nascido no
país recebe, na primeira semana de vida, uma sacola com cinco livros infantis. A
iniciativa é parte do projeto Bookstart, que procura “inspirar o amor pela
leitura”.
Depois, aos três anos, a criança recebe outra sacola. Existem versões para
crianças cegas e em 29 línguas para quem não tem o inglês como língua
materna.
O incentivo à leitura continua com as crianças mais velhas. Escolas públicas
organizam eventos em que autores infantis visitam a escola para falar dos seus
livros.
Mesmo com incentivos como esses do governo, crianças e jovens estão lendo
menos e desenvolvendo atitudes mais negativas em relação à leitura. Se essa é a
tendência na Inglaterra, um país que estimula a leitura, me deprime imaginar a
relação das crianças com livros em países como o Brasil.
O que me dá esperança são episódios como um que aconteceu com minha mãe em
Brasília. Ao se dirigir a uma livraria, um menino de rua falou: “tia, me dá um
livro?”. E recebendo um “claro” como resposta, ele acompanhou minha mãe para
dentro da livraria.
Na sessão infanto-juvenil, ele ficou acanhado e pediu para minha mãe escolher
algo. Naquele dia, o menino ganhou “O Último dos Moicanos” de James Fenimore
Cooper e mais um livro que um senhor, ao ver a cena, também comprou para
ele.
Ainda bem que ainda existem crianças que, satisfeitas e orgulhosas, saem
abraçadas aos seus livros.
Beatriz Portugal é jornalista. Depois de viver em
Brasília, São Paulo e Washington, fez um mestrado em literatura na Universidade
de Londres e resolveu ficar.
Um comentário:
Eu trabalho na Sala de Leitura de uma escola da rede municipal do Rio de Janeiro. Atendo alunos na faixa de 04 a 11 anos, me encho de alegria quando vejo meus pequenos saírem levando livros emprestados, escolhendo títulos específicos, especialmente os que foram lidos por mim para eles. Continuo acreditando que a grande chance de nossas crianças se tornarem leitores de literatura é a lermos para eles. Eu acredito nisso e tenho feito a minha parte.
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