NÃO TROPECE NA LÍNGUA nº 159
3ª Edição
por Maria Tereza de Queiroz Piacentini *
Por que o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (PVOLP) da Academia Brasileira de
Letras (ACL) coloca acento gráfico na palavra superávit sendo que não há regra que o justifique?
Agnaldo Martino, São Paulo, SP.
Vamos tratar junto de déficit e hábitat, que configuram a mesma questão. O PVOLP editado em
1999 pela ACL traz os dois registros: superavit - o próprio latim, e superávit, “do latim superavit”.
Isso já nos faculta usar uma ou outra forma. O dicionário Houaiss só registra o latim nos três casos.
O Aurélio apresenta as formas acentuadas, além do latim habitat. A imprensa prefere a grafia com
o acento, porque facilita a leitura. Aliás, a acentuação gráfica nos três vocábulos tem o mero papel
de informar a tonicidade. Senão vejamos:
Dé – fi – cit
Há – bi – tat
Su – pe – rá – vit
Como se observa, não é possível afirmar que o acento nessas palavras se justifica porque elas são
proparoxítonas, como assim as denomina Napoleão Mendes de Almeida no seu Dicionário de
Questões Vernáculas (1981: 305). Se as duas primeiras são proparoxítonas, a última não pode
ser.
PLURAL: superávits, déficits e hábitats
Em Portugal resolveu-se a pendenga de outra maneira: a grafia de deficit é défice. E superávit?
Fui informada de que não é termo vulgarmente usado – preferem “excedente”. Mas poderia e
poderá ser aportuguesado como “superávite”, não?
De minha parte, ainda prefiro as formas acentuadas que estou acostumada a ver em revistas e
jornais, mesmo que não haja coerência nessa grafia!
SUB EXAMINE
Nos meios forenses é comum a dúvida entre a grafia “sub examen” e “sub examine” quando se
pretende dizer que a matéria está sendo examinada ou está “sob exame”.
Já vai longe o tempo em que estudei latim, mas tive condições de verificar a questão baseando-me
na locução adverbial in limine (desde logo, no início), originada pelo substantivo limen, que
significa “limiar, entrada”; o caso nominativo é limen; liminis o genitivo e limine o ablativo, caso
latino que representa as palavras na função de adjunto adverbial, em que aparece uma preposição,
como in, sub, de.
Então, como examen e limen pertencem à mesma declinação (neutros da 3ª) temos examen,
examinis, examine. Consequentemente, deve-se redigir sub examine.
HÁBEAS
O Word acentua automaticamente a palavra hábeas. “Mas latim não tem acento”, surpreendem-se
as pessoas. Pois este é um caso parecido com o tratado inicialmente: no Brasil se vulgarizou o uso
de “hábeas” como palavra proparoxítona no lugar de “habeas corpus”, que é a expressão latina
original e que portanto não levaria nem hífen nem acento. Para que se caracterize o latim em
qualquer texto, as palavras devem ser escritas em itálico, entre aspas ou sublinhadas. A imprensa,
no entanto, como evita o uso desse tipo de destaque, tem juntado os dois vocábulos com hífen
[habeas-corpus] ou utiliza hábeas simplesmente. Recomenda-se que os operadores do Direito
usem o termo em latim com o devido grifo.
Maria Tereza de Queiroz Piacentini
* Diretora do Instituto Euclides da Cunha e autora dos livros “Só Vírgula”, “Só Palavras Compostas” e “Língua Brasil – Crase, Pronomes & Curiosidades” - www.linguabrasil.com.br SUPERAVIT, SUB EXAMINE E HABEAS CORPUS ---
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