Uma
partida de futebol pode ser vista de várias maneiras. Uma delas, como uma
disputa esportiva, de habilidade, técnica, tática, criatividade, força física e
emoção. Outra, como um espetáculo lúdico, teatral, literário, onde estão
presentes os sentimentos e as contradições humanas.
Dizem que
Nelson Rodrigues não entendia de futebol, não enxergava bem e, no fim dos
jogos, no Maracanã, saía com Armando Nogueira e perguntava como havia sido a
partida, quem tinha sido o herói, para criar seu personagem da semana. Ele ia
para a redação e escrevia belíssimos textos, com numerosas metáforas e
deliciosos exageros. E ainda ironizava os "entendidos", que tentavam
explicar o resultado pelos detalhes técnicos e táticos.
Todos os
pensadores que escrevem nos jornais, sobre a vida e o comportamento humano,
deveriam falar mais de futebol. Eles, por escreverem muito bem, não terem os
vícios, os chavões e o futebolês, enriqueceriam a crônica esportiva.
Como sou
um filósofo e psicólogo de botequim e metido a entender de futebol, tento ter
os dois olhares. Eles, com frequência, não se combinam. Um quer saber mais e
ser mais importante que o outro.
Recentemente,
um leitor disse que, ultimamente, tenho tentado explicar demais os detalhes
técnicos e táticos. Deve ser porque estou preocupado com o 7 a 1 e com a queda do futebol
brasileiro. Quando mais penso, menos entendo.
Existem
muitas razões e discussões sobre a diminuição de talentos no Brasil. A formação
de bons jogadores não se reduziu. O que me intriga é a falta dos excepcionais,
os que estão no nível intermediário entre um Neymar, que surge sem aplicativos,
e o grande número de bons jogadores, espalhados pelo Brasil e pelo mundo.
Porque, em vez de um Tardelli, não temos um Suárez? No lugar de um William, um
Hazard? Em vez de um Oscar, um Iniesta? No lugar de um Fernandinho, um Kroos?
Muitos
técnicos e comentaristas dizem que os jovens de mais talento precisam aprender
a jogar coletivamente, a ter os mesmos deveres e obrigações dos outros e que só
vão brilhar se atuarem em times com ótimo conjunto. Isso é óbvio, essencial.
Mas não significa que eles têm de treinar da mesma maneira que os outros e serem
colocados em uma forma de produção em série, para exportação. Somos todos
diferentes.
Quando
jogava no juvenil do América-MG, eu, que era apenas uma promessa e que, sem
nenhuma falsa modéstia, me tornei apenas um excelente jogador, longe dos
grandes da história, tinha uma atenção diferente. O técnico Biju me falava que
eu deveria treinar junto com todos, tentar melhorar minhas virtudes e corrigir
minhas deficiências, mas que, se eu quisesse ser um craque, deveria treinar o
que sabia fazer muito bem, separado, exaustivamente, para fazer ainda melhor.
O mundo e
o futebol ficariam sem graça se não existissem os diferentes, se houvesse
apenas um sistema tático, um único tipo de jogador para a mesma posição, uma
única emissora para transmitir uma partida tão esperada, uma única visão
filosófica, psicológica, um único estilo de vida e um único tipo de sorvete de
coco.
Tostão
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