sexta-feira, 19 de maio de 2017

Casamento do céu e do inferno

No azul do céu de metileno
a lua irônica
diurética
é uma gravura de sala de jantar.


Anjos da guarda em expedição noturna
velam sonos púberes
espantando mosquitos
de cortinados e grinaldas.


Pela escada em espiral
diz-que tem virgens tresmalhadas,
incorporando à via-láctea,
vaga-lumeando...


Po uma frincha
o diabo espreita com o olho torto.


Diabo tem uma luneta
que varre léguas de sete léguas
e tem o ouvido fino
que nem violino.


São Pedro dorme
e o relógio do céu ronca mecânico.


Diabo espreita por uma frincha.
Lá embaixo
suspiram bocas machucadas.
Suspiram rezas? Suspiram manso,
de amor.


E os corpos enrolados
ficam mais enrolados ainda
e a carne penetra na carne.


Que a vontade de Deus se cumpra!
Tirante Laura e talvez Beatriz,
o resto vai para o inferno.


Carlos Drummond de Andrade

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