sábado, 6 de maio de 2017

O perigo do pensamento positivo

Um artigo de Barbara Ehrenreich (publicado no New York Times e reproduzido em seu blog) vem corroborar uma série de diagnósticos sobre a recente crise dos 4 trilhões de dólares. 
Como se sabe, investidores (= “indivíduos que investem em cima do dinheiro alheio como gatos investem em cima de ratos”) no mercado imobiliário norte-americano passaram anos financiando imóveis em condições “irresistíveis” para pessoas que não podiam pagar por eles. Isso era visto como um incentivo à compra da casa própria, como uma ajuda a populações de baixa renda, um trabalho social, etc. Acontece que as pessoas começaram a não pagar e os investidores começaram a falir.
Já falei aqui sobre a influência do café nesse processo, como droga euforizante (“O capitalismo e a Starbucks”, 15.11.2008). 
O artigo de Ms Ehrenreich fala do efeito deletério do pensamento positivo, essa praga que arruína o mundo dizendo no ouvido das pessoas: “Todos os seus desejos serão realizados, basta querer”. 
Diz ela que existe na cultura americana um esforço generalizado, que vai desde programas de TV a pastores de igreja, desde estratégias de mercado até livros de auto-ajuda, levando as pessoas a “acreditarem que elas irão conseguir o que querem, não apenas porque isso as fará sentir-se melhor, mas porque pensar positivamente nas coisas, visualizá-las, ardentemente, com concentração, fará com que elas aconteçam”. É o bom e velho otimismo norte-americano erigido em força mágica.
Ela prossegue: 
“Todo mundo sabe que você só consegue um emprego que pague mais de 15 dólares a hora se for uma pessoa positiva, uma pessoa livre de dúvidas, sem visão crítica, e sorridente. (...) Os livros nos aeroportos gritam contra o negativismo e advertem o leitor a ser otimista o tempo inteiro, cheio de confiança. As empresas reforçam isto proporcionando aos seus funcionários palestras motivacionais cheias de histeria”. 
É algo entranhado na cultura dos EUA, essa crença maníaca de que não apenas as coisas podem dar certo, mas darão certo mesmo, se quisermos pra valer.
Daí, segundo Ehrenheich, que “ninguém estava psicologicamente preparado para tempos duros, quando eles chegaram, porque, de acordo com as premissas do pensamento positivo, pensar em problemas é atraí-los”. 
E toda essa bolha de trilhões de dólares era administrada por “uma nova classe de bilionários e centi-milionários que moram em Lear-Jets e se hospedam em hotéis de milhares de dólares a noite, e que podem mandar um avião particular comprar seu vinho preferido ou trazer o animal de estimação que deixaram para trás”.
Isto quer dizer que devemos ser derrotistas, lúgubres, medrosos? De jeito nenhum. Essa é a burrice equivalente no extremo oposto. Mas não tenho dúvidas de que a economia mundial entrou nesta crise devido, em grande parte, a essa crença absurda de que basta querer para conseguir, de que nossos desejos existem para serem satisfeitos, se os desejarmos com força suficiente.

Bráulio Tavares

Mundo Fantasmo 

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