sábado, 26 de dezembro de 2020

Os ditadores não morrem

Hesitei sobre o título desta crónica. A torrente de informação é de tal forma intensa nestes tempos conturbados, que é por vezes difícil escolher um tema, discernir sobre aquilo que nos parece realmente importante, e separar as evidências do que é, aparentemente, acessório.

 No momento em que começo a escrever este pequeno comentário, terminou a “Caravana da Liberdade”, que transportou as cinzas de Fidel Castro, durante 9 dias, pela ilha de Cuba, pondo assim fim a um quase interminável funeral. Durante este período de luto para algumas franjas da esquerda, assistimos a tudo: louvores à revolução cubana, destemperados elogios à figura do déspota e, noutro lado, a comparações ignorantes com ditadores do século passado. Estive tentado em titular este escrito com um rotundo: os ditadores também morrem! Mas, afinal, parece que não. Quando se pensava que Fulgêncio Baptista estava bem morto e enterrado, alguns fizeram questão de nos recordar que ele foi presidente eleito, que depois fez suspender a Constituição, transformando o regime cubano numa ditadura. Castro mandou-o para o exílio com uma Revolução onde se destacou o irmão Raul, actual presidente, e esse ícone e figura emblemática na minha juventude, Che Guevara. Um ditador deu o lugar a um tirano. A morte de Fidel fez, assim, ressuscitar o ditador que o antecedeu.

 Apetece dizer: “Os ditadores não morrem!”.

 Foi possível ler crónicas onde se desenterraram Hitler, Mussolini, Estaline, Franco e, veja-se bem, Salazar, o ditador saloio de Santa Comba. Que haja quem tente branquear a História, compreende-se, mas que haja quem a tente reescrever, é inadmissível. No caso de Fidel, a História se encarregará de relatar, desapaixonadamente, o papel de Castro e do castrador castrismo. Até à morte do próximo ditador, deixem as cinzas sossegar e esperar que o povo cubano saiba fazer o luto e regresse às ruas para tocar e dançar boleros. E reclamar por liberdade e democracia.

 Outro tema quente, é o que se passa na Europa.

 A Áustria disse não à extrema-direita e em Itália o europeísmo foi derrotado num referendo. Com um calendário recheado em 2017, a Europa vai enfrentar tempos conturbados: eleições na Alemanha, Holanda e França, um brexit a contaminar a zona euro e, previsivelmente, o fortalecimento do italexit. Seria bom que a Europa deixasse de ser um clube de burocratas e se dedicasse mais às pessoas, aos europeus. Com a eleição de Trump, a Europa tem uma ocasião ímpar para se impor e impor os seus valores democráticos e humanistas. Não podemos cair na tentação de experiências populistas cujos resultados, veja-se a História recente, podem ser devastadores, fatais.

 Por cá foi a animação habitual, com a Caixa Geral de Depósitos a liderar os títulos dos media.

 Igualmente a merecer destaque o regresso do feriado de 1 de Dezembro. E com ele um ataque, justificado, a Passos Coelho e à “geringonça de direita”. A vida está a correr mal ao líder do PSD.

Às críticas, não disfarçadas, do Presidente da República, somou-se o “não!” de Santana Lopes. Com Rui Rio (e outros) à espreita, os tempos de Passos Coelho não vão ser fáceis.

 Por cá, no nosso Alentejo, as ruas (algumas) iluminaram-se abundantemente com as cores do Natal.

Com que custos? E em detrimento do quê? Em 2017 saberemos. Até porque, por cá, vamos ter eleições autárquicas. E é também nas urnas que se derrubam ou se afastam “ditadores”.

 Se não nos virmos antes, votos de um Santo Natal.

João Espinho – Portugal, 5/12/2016

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