Um homem trabalha na seção de engarrafamento onde será produzida a Coronavac, vacina da SinoVac contra a doença do coronavírus (COVID-19), no centro biomédico do Instituto Butantan, em São Paulo,
A ausência da apresentação de dados de eficácia sobre a vacina Coronavac nesta quarta-feira, dia 23, durante coletiva de imprensa realizada no Instituto Butantã, deixou a comunidade científica preocupada em relação à eficácia do imunizante.
O governo de São Paulo já havia adiado a apresentação dos dados,
programada inicialmente para o dia 15. Agora, a divulgação foi novamente
postergarda. O novo anúncio do resultado dos testes está programado
para daqui a duas semanas.
“O
problema é que a falta de uma explicação mais consistente sobre o
motivo de tantos adiamentos começa a deixar os cientistas desconfiados
de que pode ter havido algum problema com a vacina”, diz Maria Amélia Veras, epidemiologista da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo e do Observatório Covid-19 BR.
Segundo
o Instituto Butantã, os dados não foram apresentados porque haveria
divergências com os resultados dos testes clínicos em países como a
Turquia e a Indonésia, onde as avaliações também estão sendo conduzidas.
Os
cientistas brasileiros que vêm acompanhando a evolução da vacina dizem
que poucos voluntários receberam a dose de imunização na Turquia e na
Indonésia, o que não justificaria um problema de divergências nos testes. “A maior parte dos testes aconteceu no Brasil mesmo”,
diz Fernando Reinach, biológo, PHD em biologia celular e molecular pela
Cornell University e autor do livro “A Chegada do Novo Coronavírus no
Brasil”.
“O
novo adiamento dos resultados dos testes de fase 3 da Coronavac
levantam a suspeita de que possa haver algum problema com a eficácia da
vacina ou com o ensaio clínico do Butantã”, afirma Reinach.
Existe
a desconfiança de que os resultados possam ter sido inconclusivos ou
que a vacina teria uma baixa eficácia, já que o Instituto Butantã ainda
não divulgou os dados que sobre o índice de eficiência do imunizante.
“Toda a comunidade científica esperava que os resultados fossem
divulgados nesta quarta, conforme o Butantã havia anunciado, e ficamos
pasmos com o cancelamento da abertura das análises”, diz Veras.
Os cientistas também se revelam preocupados pelo fato de que nem mesmo a China registrou a vacina ainda. “Não sabemos muito bem o que se passa na China, por se tratar de um país fechado”, afirma Gonzalo Vecina, médico sanitarista e presidente da Anvisa entre 1999 e 2003. “Pode
ser que estejam tomando um cuidado especial ou estejam envoltos em
questões burocráticas, mas o fato é que sem o registro da vacina na
China é impossível haver um registro pela Anvisa no Brasil”.
Vecina
também alerta que o resultado dos ensaios clínicos de fase 3 ainda não
foram publicados em revistas científicas, o primeiro passo de processos
de comprovação da eficácia de vacinas e medicamentos. Após a publicação, a comunidade científica internacional analisa os dados do estudo e dá seu parecer.
Outro fator potencialmente preocupante é o real índice de eficácia da Coronavac. De
acordo com o Butantã, os testes clínicos mostraram um índice de
eficácia no limiar de 50%, embora ninguém tenha visto os dados. Outras
vacinas, como as da Pfizer e Moderna, apresentam uma eficácia de 95%.
“Uma taxa de 50% significa que apenas metade da população que receber a vacina estará de fato imunizada”,
explica Vecina. Caso isso aconteça, um dos problemas que é a população
pode acreditar que está totalmente imunizada e descuidar de medidas
essenciais como usar máscara e manter o distanciamento social, embora ao
menos parte das pessoas de fato adquira anticorpos contra o
coronavírus.
A
comunidade científica também acredita que o calendário de vacinação
proposto pelo governo de São Paulo, com início em 25 de janeiro, talvez
precise ser revisto. Como a divulgação dos dados sobre os testes 3
da vacina foram postergados para 15 dias, existe uma probabilidade de
não haver tempo hábil para providenciar o registro junto à Anvisa e
começar a imunização em janeiro. Além disso, é preciso que antes a China
registre a vacina.
Até
agora, as vacinas que já obtiveram registros em órgãos internacionais
são as da Pfizer e da Moderna, autorizadas nos Estados Unidos. “Em relação à Coronavac, o processo não caminhou tanto assim”, diz Vecina.
Por Carla Aranha - Exame
Nenhum comentário:
Postar um comentário