Corpográficos. Vulcanográficos, ambigráficos, personográficos. Tramográficos, aracnográficos, espacialográficos. Ascensográficos. Impulsográficos. Aerográficos. Corrosivográficos. Levitográficos. Sabergráficos. Vorticegráficos. Pelegráficos. Inundográficos. Rebentográficos. Anjográficos. Riscográficos. Ventográficos.
Branca de Oliveira é acostumada com complexas tecnologias. Leva-nos, contudo, neste trabalho a uma viagem na potencialidade do material mais simples da história da arte: a grafite. À aventura na forma mais básica das artes visuais: o desenho. Não é somente o retorno ao elemento fundante do gesto imagético, mas um aprofundamento no fantasma da tecnologia que, historicamente, nos dispensou as mãos. Branca volta a elas, devolve-as ao gesto e ao corpo que, desenhando, pratica seu primeiro movimento: ir além de si. Esse gesto liga, relaciona, anexa. Tenta, testa, e por isso risca, arranha, suja, deixa acontecer. Funda nexos.
Toda a experimentação é desenho. Desenho é design, é gesto de significação. Mas desenho é também grafo. Grafo é linha que conecta e desconecta uma coisa com outra, e a linha à outra linha. Grafar implica uma gramática: grafamos com vértices, arestas, paralelos, setas, laços, nervuras, ranhuras, arcos. Olhar esse trabalho de Branca de Oliveira implica deixar-se levar pelas linhas, aceitar seus emaranhados; ao mesmo tempo, duvidar deles. Prestar atenção em seus limites e direcionamentos.
Podemos, sem dúvida, olhar para os símbolos, os signos, os sinais. Para o universo de conteúdos aos quais nos lança esta experiência. Mas eles seriam completamente outros se não fossem desenhados.
É que o desenho nos traz a sombra. O desenho nos dá o erro; no mais básico dos gestos, a potencialidade do que poderia ser e não ser. O desenho não é somente o grafo e sua história, mas é ainda o desajuste no mapa, o que estremece na planta, o que alucina na imagem desenhada, a imagem corpografada nascida nesse ponto simples da mão que atua com a grafite. A imagem levitografada, ambigrafada é toda não imagem. Às vezes, quando algo escapa, é então que algo foi desenhado.
Ficamos sabendo que a mutegrafia é diurna, que é também noturna. Olhando bem, vemos que o corpo desenhado é corpográfico. E que é possível corpografar. Basta começar por algum lugar como ela começou. Problema seria fazer o começo. Então nosso olhar roda, roda; roda até encontrar o quadrado mágico, o palíndromo, o design… Ambigrafamos quando transformamos qualquer um, em verso e reverso… problema, sabemos, é versar e reversar. Por isso, olhar atentamente é o caminho. Sabendo que o desenho de Branca de Oliveira começa no morfismo, mas rompe com ele: dimórfico mórfico, eis como seria o caso de tentar entendê-lo.
Mas um desenho não se entende simplesmente, antes, é preciso vê-lo. Encantados com a narrativa, curiosos da alegoria, concentrados no conjunto de detalhes que nos põem em estado de vertigem mental, fixamos os olhos. Ora, o desenho é um gesto sempre sutil que exige a concentração mais delicada. Quanto há para interpretar? O que se pode dizer?
Não é preciso dizer nada. Basta ver, ainda que o último fio seja intangível aos nossos olhos.
Márcia Tiburi

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