domingo, 10 de março de 2013

Poder, dinheiro e sexo


"Meu Deus, eu queria tanto ouvir um pecado novo." Esta frase me foi dita por uma amiga minha, uma verdadeira dama, citando um padre amigo seu. Esta fala revela a repetição dos temas humanos: dinheiro, poder, sexo. Nada há de novo embaixo do sol, como diz a Bíblia Hebraica. Iniciantes acham que há.
 
Posso imaginar a monotonia do confessionário. Para nós, mero mortais, a ideia, por exemplo, de uma mulher contando suas infidelidades, reais ou imaginárias, é uma delícia de luxúria. Para o apreciador do sexo frágil, o segredo do mundo está entre as pernas das mulheres.
 
Aliás, a luxúria é um dos sete pecados capitais. E pecado é coisa séria, apesar de hoje estar na moda achar que não existem mais pecados. Eu, que sou um medieval, creio mais neles do que nas ciências humanas.
 
Ingênuos acreditam que a vida mudou em sua "essência". Mesmo o caso do Vatileaks repete a velha história de poder, dinheiro e sexo.
 
Mesmo Jesus, em seus 40 dias no deserto (que por sua vez simbolizam os 40 anos do povo hebreu perdido no Sinai, pós-Egito), foi tentado nesta velha chave: poder, ouro, mulheres.
 
Mas existe uma hierarquia nesta estrutura. Por exemplo, ninguém nunca perdeu mulher perseguindo dinheiro (ouro), mas sim perdeu muito dinheiro perseguindo mulher, portanto, dinheiro é mais essencial e seguro do que começar por mulheres. Uma vez tendo o dinheiro, elas virão.
 
"Sabedorias" como essa falam do pecado, essa marca de nossa natureza humana.
 
Prever o comportamento humano a partir do pecado é quase uma ciência exata.
 
Uma coisa chata sobre essa ciência exata do pecado é justamente ela furar nossas utopias.
 
E o mundo moderno, assim como é o tempo da técnica e da ciência, é também o tempo da mentira moral generalizada que se diz utopia.
 
Adianto que não uso pecado aqui como algo necessariamente religioso, mas sim como traço de comportamento verificável do tipo "ratinho do Pavlov": os sete pecados capitais funcionam "cientificamente" melhor do que a luta de classes.
 
Lembre, por exemplo, da inveja que seu colega de trabalho tem quando você tem mais sucesso do que ele.
 
E se ele não reagir de modo banal, isto é, babar de inveja, saiba que você está diante de alguém de caráter. Coisa rara.
 
As feias querem matar suas colegas mais bonitas. A única esperança das feias é que as bonitas sejam mesmo burras e superficiais.
 
Mas a luxúria é top. Depois da revolução sexual pensamos que a luxúria não existe mais e que "sexo salva". Pensar isso é coisa de iniciante.
 
O que caracteriza o pecado é que ele extenua a pessoa. A ideia mais perto disso é a ideia de vício. Vício em drogas, álcool. Luxúria seria o vício no sexo.
 
Alguns especialistas acham que não existe vício em sexo e que falar disso é simplesmente ser "moralista" ou ter inveja de quem faz muito sexo.
 
Eu suspeito de que quem acha que não existe vício em sexo é que não faz sexo o suficiente, por isso não sabe o que é estar submetido a um desejo que destrói a alma.
 
Neste caso, a simples visão de uma mulher, suas pernas, sua voz, seus gestos, implica no silêncio do resto do mundo.
 
Os antigos e medievais entendiam mais da natureza humana do que nós, principalmente porque eram menos utópicos e não sofriam dessa bobagem de achar que é a "ideologia" que determina quem somos.
 
A "crítica da ideologia" é uma das pragas contemporâneas e virou uma espécie de fetiche do pensamento, que nos impede de ver o óbvio: poder e dinheiro trazem sexo, seja homem ou mulher, isso não é "ideológico".
 
Quase todo mundo faz quase o tempo todo quase tudo por poder, dinheiro e sexo.
 
Sobre o risco de conceitos virarem fetiche, o livro de Luís de Gusmão, "O Fetichismo do Conceito" (Topbooks), é uma pérola. Recomendo para quem acredita em "mitos".
 
Autores como Evagrio Pônticos (345-399), Santo Agostinho (354-430) e São Tomás de Aquino (1225-1274) podem nos ensinar bastante sobre natureza humana.
 
Saia da moda e leia os antigos e os medievais. Para eles, o pecado é a perda da autonomia da vontade. Quem nunca viveu isso, que se cale e vá brincar.
 
 
Luiz Felipe Pondé, pernambucano, filósofo, escritor e ensaísta, doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela Universidade de Tel Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como comportamento contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários títulos, entre eles, "Contra um mundo melhor" (Ed. LeYa).
 
 
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