Acordo de noite , muito de noite , no silêncio todo.
Acordo de noite , muito de noite , no silêncio todo.
São - tictac visível - quatro
horas de tardar o dia.
Abro a janela diretamente ,
no desespero da insônia.
E , de repente , humano ,
O quadrado com cruz de
uma janela iluminada !
Fraternidade na noite !
Fraternidade involuntária , incógnita , na noite !
Estamos ambos despertos
e a humanidade é alheia.
Dorme.Nós temos luz.
Quem serás? Doente , moedeiro falso , insone simples como eu?
Não importa.A noite eterna ,
informe , infinita ,
Só tem , neste lugar , a
humanidade das nossas
duas janelas ,
O coração latente das
nossas duas luzes ,
Neste momento e lugar ,
ignorando-nos , somos todas vida.
Sobre o parapeito da janela
da traseira da casa ,
Sentindo úmida da noite a
madeira onde agarro ,
Debruço-me para o infinito
e , um pouco , para mim.
Nem galos gritando ainda
no silêncio definitivo !
Que fazes , camarada , da
janela com luz?
Sonho , falta de sono , vida?
Tom amarelo da tua janela incógnita...
tem graça: não tens luz
elétrica.
Ó candeeiros de petróleo da
minha infância perdida !
Álvaro de Campos, Livro de versos.
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