quarta-feira, 28 de outubro de 2020

É a casa que mora em mim


Sempre fui um homem doméstico e até hoje nutro muita proximidade com tudo quanto me rodeia.

Na juventude, quase morei sozinho numa "república", longe dos olhos da minha residência. Foi assim que comecei a atrelar-me a casa onde nasci. Distante dela passei a sentir-me um caule sem raiz. Um timoneiro que, vencidas as tormentas e calmarias, sempre retorna ao mesmo cais.

Muito tempo depois, descobri que, na verdade, "essa casa mora em mim" e, onde eu vá, ela me acompanha feito tartaruga que leva sua casa nas costas.

Pois bem, nessa pandemia pude explorar cada pedacinho do chão de minha casa. Descobri novos espaços entre a mobília, encontrei talheres perdidos e um cheiro de adubo que povoa o quintal. Claro que tive outras descobertas e predileções. Percebi, por exemplo, que tenho uma boca de fogão preferida para fazer o meu café. Entre as seis, é sempre a ela que recorro com um fósforo na mão. Sempre ela. Parece uma conclusão inútil e desinteressante para o nobre leitor, mas para mim é uma grande descoberta. Não fossem essas pequenas e insignificantes escolhas, como aquietar essa certeza que teima em dizer-me, sob a chama, que essa casa irrecorrivelmente mora em mim?

Teófilo Júnior

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