sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Separatismos

Foto: Alliance / DPA
Não sei se os escoceses votarão por sair de baixo das saias da rainha Elizabeth hoje, ou não, mas o fato de o ímpeto separatista ter chegado a este ponto (as últimas pesquisas davam um empate técnico entre o “sim” e o “não”) num país do Reino Unido — aquela aconchegante matriz da Commonwealth, que os britânicos inventaram para fingir que ainda têm um império — mostra como nem as presumíveis zonas de conforto do mundo estão livres dos contrassensos da História.
A secessão escocesa seria uma bonita vitória de ideais abstratos, mas respeitáveis, como independência e identidade nacionais, porém seria, ou será, um contrassenso. Isso se você concordar que o senso da História deveria ser para a integração cada vez maior de nacionalidades, em vez de um retorno ao tribalismo.
 
E todos os ímpetos separatistas, por mais nobres e justos que sejam, são movidos por uma saudade da tribo. Ou, no caso da Escócia, do clã.
 
Não há analogia possível entre a secessão escocesa e outros movimentos separatistas no mundo — mesmo porque não há analogia possível entre a relação da Inglaterra com o resto do Reino Unido e a relação de qualquer outro governo do mundo com suas províncias —, mas todos têm em comum esse caráter regressivo, essa nostalgia tribal.
 
Você pode simpatizar com a rebeldia de uma Catalunha ou de um País Basco, ligados ao governo central em Madri apenas por frágeis formalidades, ou com o País de Gales, que talvez seja o próximo pedaço da Grã-Bretanha a pedir seu boné. Mas cada reivindicação de autonomia de um desses países autodefinidos por uma cultura e uma língua próprias é um passo na direção errada. Acho eu.
 
Mas é difícil resistir aos apelos do separatismo. Uma vez alguém me mostrou num mapa o que, na sua opinião, era o país perfeito. Começava na Toscana, incluía o Piemonte, pegava um naco da Cote d’Azur e toda a Provence.
 
Era um país em que não faltaria nada, nem em paisagens nem em gastronomia nem em qualidade de vida (e que vinhos!), e que só precisaria eliminar uma fronteira nacional e criar outra para existir.
 
Tem gente que defende a sério uma secessão gaúcha, mas volta e meia surgem especulações menos sérias sobre como seria um país desejável do Sul. Ele talvez incluísse o Paraná, mas há controvérsias.

 
Santa Catarina não poderia ficar de fora, se por mais não fosse, pelas suas praias. E anexaríamos o Uruguai, certamente. Tudo puro delírio, claro. Se bem que... Não, não. Puro delírio.
 
Há quem diga que já houve uma secessão no Brasil. São Paulo separou-se do resto e há anos é a sua própria União independente. Não sei.
 
 
Luis Fernando Veríssimo é escritor

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