segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Carta aos amigos

Caros Amigos,

Desagradando alguns, nisso peço sincero perdão na medida do desagrado de parecer pedante, escreverei na orthographia etymologica sob pena de não fazer, faltar mais gravemente com o bem que me sinto devedor.

Cheguei aos quarenta annos. É imperioso não perder tempo e a urgência toma as descisões. Chega de distrações. A vida não é um parque de diversão, mas exige uma séria aposta, que de chofre toma de nós tudo que pensamos ter e de facto não temos e nos enriquece com aquillo que nunca imaginariamos ser.

Rendi-me: apostarei com Pascal. É preferível perder até a “verdade”, com Dostoievsky, que perder Christo. Apresso-me já em dizer, antes que o equivoco falle, que não me refiro ao nazareno, mas a uma realidade radicada no coração da vida, que felizmente João, por falta doutra palavra, chamou Palavra, em grego logos.

O preconceito quase sempre é uma falsa gravidez. Sendo refletido não escapa á psyche e não raro se emaranha com a subjetividade, sentimentos ou ressentimentos de toda especie. Dante Alighieri, nos previne, como só um iniciado nos mysterios pode fazer, que a presunção é a principal enfermidade que ameaça o intellecto. O preconceito é essa presunção.

Muito bem, que presumia eu, para reputar como indigno de cidadania á patria sapiencial? Presumia que o maior expositor da Sophia Perennis era um apostata que havia negado na pratica o que recomendava na theoria. Estou a fallar de Réné Guénon, que por razões de ordem iniciatica e não religiosa, conceitos que não devem se confundir, sob penna, de como eu ficar privado, por tanto tempo, de luz, completar o restantes de seus dias não como um fiel catholico mas como um devoto piedoso de ritos do islã, no Egipto.

Bom, retirado o veu, podemos ver Guénon, ou melhor, não ver, pois elle não é elle, dito doutro modo: é em pessoa a impessoalidade da Tradição, que já chamamos de Sophia Perennis. Por Tradição, devo de pronto, excluir qualquer acepção com tudo que entendemos até então como tal, ou seja, como costume. Este, que quase sempre pode se contar entre os maiores antipodas dAquella.

Vamos ao ponto: dizer Tradição é exposar um conhecimento cuja origem não é humana. O homem foi apenas um fiel depositario. Sua ordem é completamente transcedente, ou seja, metaphysica. A mente moderna, completamente dada a imanencia, é incapaz de comprehender, por essa mesma razão.

Guénon, como uma misericordia, appella aos homens, principalmente, os ocidentaes, mais prejudicados entre todos, para que vejam o estrago e a miséria m que estão enredados e pelo horror dessa visão sejam affectados e operem uma transformação, uma metanoia, uma mudança do intellecto, não de ordem racional, pois há que se desfazer a confusão entre o que é intellectual, de character superior e espiritual, de todo racional que é por natureza condicionado, pela qual permitam o Ser vivenciar suas múltiplas formas até áquella fusão onde os entes se dão sem serem confundidos, pois como o mesmo Guénon, ilumina, onde não há eu, também não há o outro.

Termino lembrando que Guénon é odiado, por quase todo o mundo: por theosophistas, elle mesmo escreveu uma obra sobre a theosophia como uma pseudo-religião; pelos espiritas; pelas falsas organizações esotericas; pelos theologos que se acham competentes em fallar do aspecto iniciatico, como se fosse condicionado como é a religião; por fim, todos os avidos de poderes psychicos do movimento new age e os profanos e detratores da Verdade sophianica, que só conhecem e valorizam o aspecto individual transitorio e contigente da existencia.

Convido-vos a estudar Guénon, não por proselitismo, elle mesmo era altamente refratario a isso, pois acreditava piamente naquillo que uma vez os antigos e iniciados christãos de Alexandria no Egipto, não sendo dispensavel lembrar, que como um authentico gnostico, é para lá que Guénon foi, chamavam de logoi spermatokoi, ou seja, a Tradição, a entrega, da Sophia Perennis, que como Luz, no dizer de São João ilumina “todo” o homem que vem ao mundo e o faz por dentro, de modo interior, esoterico, não enriqueceriamos, entretanto, se não fizessemos menção da enphase dada pelo evangelista, de que a Luz brilhou “nas” trevas, ou seja, não de fora, do exterior, do exoterico.

Como Guénon attenderei a necessidade de saber o que os antigos porta-vozes da Tradição, quer na ambiencia metaphysica helenica, Platão e Aristoteles, vendantica, Shankara, ou islamica, Abenarabi, por exemplos, e me retirar da turba cega, confusa e degenerada de todos os modernos, que servem apenas para affligir a nossa alma, impedindo a realização daquillo que o grande iniciado nos mysterios de Eleusis, o poeta Pindaro, ordenou: “torna-te o que tu és!”.

Euphrasio

Eufrásio é pombalense atualmente radicado em São Paulo.

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