quarta-feira, 1 de março de 2017

Você pode ser o antidepressivo de alguém.

Não sei bem como são os medicamentos antidepressivos e aqui não estou falando contra, nem recomendando que alguém interrompa a medicação receitada pelo psiquiatra. Não é sobre usar ou não medicamentos, mas sobre lugares da vida em que substâncias químicas jamais serão suficientes.
     
Eu gostaria de algo pra tomar e pronto, todas as minhas questões fossem resolvidas. Gostaria muito de ser uma pessoa bem resolvida, eu sou como você. Cheio de problemas feito livro de aritmética e de dúvidas feito barrar de pesquisar do Google.     

Você já leu a bula de um Prozac? Elas não ensinam nada sobre caso a gente ter alma sensível às coisas mais bobas da vida, desconsideram veementes o sentimento de quando surge a vontade de engolir as nuvens do céu. O Prozac não vai me dizer se devo insistir ou desistir de algumas amizades, nem me explicar qual é a relação amorosa mais apropriada.

Para viver além da medicação é preciso deitar no chão. Tirar os sapatos, cantar mesmo sem dom suas músicas favoritas, desenhar essa realidade paralela de quem não tem dom de representar fielmente os objetos. Fazer de conta ser qualquer coisa.

Você também necessitará ter dois dois olhos capazes de chorar com ou sem motivo. Tudo bem se borrar a maquiagem que acabara de preparar ou sua cara inchar como um panda alucinado. Tudo bem mesmo! Pandas são até desenhos animados que salvam seus amigos lutando karatê, parecer um panda é melhor que engolir o choro e viver entalado de tristeza.

Chame seus amigos e vá pra algum lugar. Se eles não quiserem ir, se você acha já ter irritado tanto o mundo que agora está sozinho, tudo bem, tudo bem também. Aproveite-se. Escolha o seu lugar. Talvez dê pra dançar. Talvez seja o momento de viajar. Com certeza há milhares de “talvez” para achar conversando consigo mesmo. Falar sozinho não existe se você está acompanhado de si.

Eu sei, você  esquecerá estas palavras nas horas de agonia, eu mesmo esqueço, tudo bem. Também, se precisar tomar algo além do receitado pelo médico , por favor, tome algumas horas deixando doer. Não há nada de errado em sentir um dia ficar mais pesado e entortar os ombros. Se é o fim? É sim. Mas também é sempre o recomeço, todo dia, passo a passo.

Para viver com menos comprimidos é preciso aceitar determinadas doses de loucura. Nem tudo em você é mesmo uma coisa normal, mas como ser normal é fruto de comparações com outras pessoas, mais uma vez, tudo okay. Você pode ser o louco delas assim como muitas vezes elas são as loucas para ti.

E se puder, quando puder, a hora que puder. Estenda as suas mãos, saia um pouco do seu mundo e suas estrelas, tente tocar em outra pessoa com suas galáxias todas. Os seus ouvidos podem ser o barquinho que ajudará um marinheiro que caiu do naufrágio a chegar em terra firme. O “tudo bem, eu te entendo” sincero e empático pode se transformar numa bússola a mostrar uma nova rota. É só se deixar ser.

Seus braços têm a capacidade de enrolar um corpo dando a poderosa substância mística e ao mesmo tempo científica, denominada aqui de abraçaço. Não é o abraço comum de dois empresários que fecharam um negócio lucrativo. Mas o abraçaço de uma criança que encontrou outra criança há dois minutos atrás, e já quer que ela seja uma criatura espalhafatosa de tão feliz.

Você pode achar e relutar que não, você não. Mas há alguém por aí com uma receita psiquiátrica imaginária com seu nome. Recomendando que sejam utilizadas várias doses da sua companhia e do seu afeto. Pode ser alguém de perto, de longe, de mais ou menos perto e longe. É alguém que mais cedo ou mais tarde aparece, muitas vezes sem saber o porquê, precisando de uma cápsula da sua presença.

Mesmo que nunca diga explicitamente, quem sabe um sorriso de alívio, um aperto no dedo mindinho, algo nele dirá; – Você é o antidepressivo que eu tomei sem receita.

A mágica é que nessa hora, essa pessoa será seu antidepressivo também, e vocês parecerão duas belas caixas sorridentes de medicação sem bula e sem contra-indicações.

Alan Lima 

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