Se há uma criatura que tenha necessidade de formar e manter
constantemente firme uma personalidade segura e complexa, essa é o
professor.
Destinado a pôr-se em contato com a infância e a
adolescência, nas suas mais várias e incoerentes modalidades, tendo de
compreender as inquietações da criança e do jovem, para bem os orientar e
satisfazer sua vida, deve ser também um contínuo aperfeiçoamento, uma
concentração permanente de energias que sirvam de base e assegurem a sua
possibilidade, variando sobre si mesmo, chegar a apreender cada
fenômeno circunstante, conciliando todos os desacordos aparentes, todas
as variações humanas nessa visão total indispensável aos educadores.
É,
certamente, uma grande obra chegar a consolidar-se numa personalidade
assim. Ser ao mesmo tempo um resultado — como todos somos — da época, do
meio, da família, com características próprias, enérgicas, pessoais, e
poder ser o que é cada aluno, descer à sua alma, feita de mil
complexidades, também, para se poder pôr em contato com ela, e
estimular-lhe o poder vital e a capacidade de evolução.
E ter o coração para se emocionar diante de cada temperamento.
E ter imaginação para sugerir.
E ter conhecimentos para enriquecer os caminhos transitados.
E
saber ir e vir em redor desse mistério que existe em cada criatura,
fornecendo-lhe cores luminosas para se definir, vibratilidades ardentes
para se manifestar, força profunda para se erguer até o máximo, sem
vacilações nem perigos. Saber ser poeta para inspirar. Quando a mocidade
procura um rumo para a sua vida, leva consigo, no mais íntimo do peito,
um exemplo guardado, que lhe serve de ideal.
Quantas vezes, entre
esse ideal e o professor, se abrem enormes precipícios, de onde se
originam os mais tristes desenganos e as dúvidas mais dolorosas!
Como seria admirável se o professor pudesse ser tão perfeito que constituísse, ele mesmo, o exemplo amado de seus alunos!
E,
depois de ter vivido diante dos seus olhos, dirigindo uma classe,
pudesse morar para sempre na sua vida, orientando-a e fortalecendo-a com
a inesgotável fecundidade da sua recordação.
Cecília Meireles
*Publicado no Diário de Notícias, Rio de Janeiro, em 10 de agosto de 1930.
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