terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Crônica para mulher do nariz grande

A mulher de nariz grande chega bem antes em qualquer ambiente.
 
É a que chega primeiro também na vida de um homem.
 
Sai, quase sempre, sem bater a porta. Prefere uma bela vingança.
 
A mulher de nariz grande fareja, degusta, vê, ouve e tateia na velocidade da luz. Como se o nariz grande se intrometesse nos outros sentidos.
 
Para o bem e para o mal. A mulher de nariz grande chega bem antes.
 
Chega primeiro para matar a sua curiosa fome de viver. Chega primeiro porque odeia ter saudade e não poder matá-la imediatamente.
 
Para o bem ou para o mal, a mulher de nariz grande chega do nada. Inclusive para aplicar um flagrante delito no canalha.
 
Ela fareja de longe a desgraça.
 
Até no altar a mulher de nariz grande deve chegar primeiro do que o noivo, desmentindo todo o folclore.
 
A mulher de nariz grande é a que, entre todas as suas semelhantes, tem menos inveja do pênis.
 
A porção mulher que até então se resguardara, amigo, aflora, freudianamente, diante da presença dela.
 
A mulher de nariz grande me lembra o melhor conto que já li na vida: “O Nariz”, de Nikolai Gogol, evidentemente.
 
A mulher de nariz grande puxa oxigênio e aroma dos jardins para a cama até em uma manhã de segunda.
 
Na horizontal, o nariz grande vira uma ponte para a margem esquerda do nirvana.
Em um colchão d´água de motel barato, é ponte sobre o Danúbio.
 
Ao contrário de Pinóquio, quando mente, digo, quando ilude, a mulher do nariz grande cresce as orelhas, Deus castiga.
 
Graças a tal temor, a mulher de nariz grande é a que menos utiliza o dom de iludir os tontos como este que vos digita.
 
A mulher de nariz grande emite as mais lindas e barulhentas onomatopeias quando goza ou até mesmo quando se aproxima do solene momento. Ela sente antes o incêndio das horas.
 
Mesmo em uma distância transatlântica, amigo, saiba: é a mulher do nariz grande que estará mais perto do que qualquer outra.
 
 
Xico Sá
 
 
*Da folha de S. Paulo

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