Nise da Silveira nasceu em Alagoas, no dia 5 de fevereiro de 1905, e
foi uma das mais importantes psiquiatras no Brasil. Em 1926, ao se
formar na Faculdade de Medicina da Bahia, onde era a única mulher em uma
turma de 157 alunos, Nise apresentou o estudo: “Ensaio sobre a
criminalidade da mulher no Brasil”. No ano seguinte, ao mudar-se para o
Rio de Janeiro com o marido e colega de turma, o sanitarista Mario
Magalhães, começou a atuar como psiquiatra e iniciou uma coluna sobre
medicina para o jornal A Manhã. “Na época em que ainda vivíamos os
manicômios e o silenciamento da loucura, Nise da Silveira soube
transformar o Hospital Engenho de Dentro em uma experiência de
reconhecimento do engenho interior que é a loucura”, explica Christian
Ingo Lenz Dunker, psicanalista e professor titular do Instituto
Psicologia da USP.
Envolvida com os círculos marxistas da época,
Nise foi denunciada por uma colega de trabalho, que era enfermeira, e
presa pelo chefe da polícia política do Estado Novo, Filinto Müller, de
1934 a 1936. No presídio Frei Caneca, dividiu a cela com Olga Benário, a
militante comunista alemã que à época era mulher de Luís Carlos
Prestes, e conheceu o escritor Graciliano Ramos, que a retratou em seu
livro Memórias do cárcere. “(…) lamentei ver a minha conterrânea fora do
mundo, longe da profissão, do hospital, dos seus queridos loucos.
Sabia-se culta e boa. Rachel de Queiroz me afirmara a grandeza moral
daquela pessoinha tímida, sempre a esquivar-se, a reduzir-se, como a
escusar-se a tomar espaço”, retratou o escritor. Em liberdade, porém
colocada na clandestinidade, Nise entrou em contato com leituras de
Spinoza e publicou o livro Cartas a Spinoza.
A arte e os psicóticos
Em
1944, Nise passa a trabalhar no Hospital Pedro II, antigo Centro
Psiquiátrico Nacional, no Rio de Janeiro. Totalmente avessa ao choque
elétrico, cardiazólico e insulínico, à camisa de força e ao isolamento,
entre outras técnicas torturantes, Nise implanta, com o psiquiatra Fábio
Sodré, a Terapia Ocupacional no tratamento psiquiátrico. Nesse mesmo
ano, cria a Seção de Terapêutica Ocupacional e Reabilitação (STOR) do
Centro Psiquiátrico Pedro II. Nise dirigiu o STOR, famoso por oferecer
um atelier de pintura aos pacientes como forma de reabilitação, até sua
aposentadoria, em 1974. Por meio das artes plásticas, a psiquiatra foi
pioneira ao defender que a comunicação com os esquizofrênicos graves só
poderia ser estabelecida inicialmente em nível não verbal, daí a
importância dos desenhos.
Um das maiores contribuições de Nise foi
o Museu de Imagens do Inconsciente, criado em 1952 para reunir a rica e
complexa iconografia concebida por seus pacientes no STOR. Outro feito
da psiquiatra foi introduzir entre os psicóticos o convívio com gatos e
cachorros, a fim de promover a afetividade entre os internos e os
animais. “Entre seus gatos e cartas, entre Espinoza e Jung, entre
mandalas, pinturas e imagens do inconsciente, ela sempre recebia os
errantes, visionários e candidatos a curadores de almas. Com a mesma
benevolência e inquietude de quem sabia que a verdade do homem não pode
ser pensada sem sua loucura”, afirma Christian.
Nise fundou o
primeiro serviço de egressos psicóticos, a Casa das Palmeiras, em 1956, a
primeira instituição que desenvolveu um projeto de
desinstitucionalização dos manicômios no Brasil. Durante a ditadura
militar que vigorou no Brasil de 1964 a 1985, criou em 1968 o Grupo de
Estudos C. G. Jung. Foi membro fundadora da Sociedade Internacional de
Psicopatologia da Expressão, com sede em Paris. Voraz leitora de Machado
de Assis, costumava afirmar que seu primeiro contato com a psicologia
havia sido com a obra do escritor.
Nise da Silveira publicou dez
livros e escreveu uma série de artigos científicos que muito
contribuíram para os estudos da psiquiatria. Morreu, aos 94 anos de
idade, no dia 30 de outubro de 1999.
Um pensamento de Nise que
merece ser eternamente lembrado: ” Não se curem além da conta. Gente
curada demais é gente chata. Todo mundo tem um pouco de loucura. Vou
lhes fazer um pedido: Vivam a imaginação, pois ela é a nossa realidade
mais profunda. Felizmente, eu nunca convivi com pessoas ajuizadas”.
“É necessário se espantar, se indignar e se contagiar, só assim é possível mudar a realidade…”
Nise da Silveira
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