quinta-feira, 31 de março de 2016
Um doutor no Calvário: as observações de um perito sobre a morte de Cristo
Autor do livro “A Paixão de Cristo segundo o Cirurgião”,
o doutor Pierre Barbet, cirurgião do Hospital de São José, em Paris, é
quem fez, até agora, o estudo médico mais completo da Paixão de Cristo,
conforme se deduz do Santo Sudário. Na impossibilidade de abranger todos
os aspectos, resumimos alguns de maior interesse.
a) Lesões sofridas na Via Crucis
Barbet descobre no Santo Sudário lesões provocadas pelas quedas de
Jesus na Via Crucis. São chagas na face anterior do joelho, sobretudo na
direita. Esta última apresenta escoriações de forma e tamanho diversos,
de bordos recortados e situadas exatamente na região rotuliana. Para
cima e para fora se observam duas chagas redondas de dois centímetros de
diâmetro. As lesões são menos evidentes e numerosas no joelho esquerdo.
As marcas da cruz sobre as costas despontam com nitidez na imagem
dorsal da silhueta da relíquia. Sobre o ombro direito, na parte externa
da região supra escapular, é visível uma extensa zona escoriada para
baixo e para dentro, que oferece a forma de um retângulo de 10
centímetros de comprimento por 9 de largura. Mais abaixo na região
escapular, observa-se outra zona escoriada que apresenta as mesmas
características (forma redonda com um diâmetro de 14 centímetros),
exatamente situada na região subescapular, na ponta do omoplata
esquerdo.
b) Topografia das chagas das mãos
Graças às observações do professor Barbet sobre o Santo Sudário,
completadas depois com detidas experiências anatômicas, pôde-se
localizar a topografia exata das chagas que produziram os pregos nas
mãos de Jesus ao ser crucificado. Os pregos não atravessaram a palma,
como vulgarmente se acredita, mas sim o carpo ou região do pulso, isto
é, o pulso, precisamente pelo espaço livre, chamado de Destot, limitado
pelos ossos semilunar, piramidal, grande e ganchoso. Com efeito, no
Santo Sudário se descobre na mão esquerda, que é a mais visível, uma
chaga redonda, muito nítida, na altura do carpo, da qual parte um filete
de sangue que se irradia obliquamente para cima e para a direita até
alcançar a margem cubital do antebraço.
c) O golpe da lança e a chaga do flanco
É crença muito comum situar o coração à esquerda do tórax, mas esta
localização não é exata. O coração ocupa uma posição média e anterior e
repousa sobre o diafragma, detrás dos pulmões e do peitilho ósseo
esternocostal, no mediastino anterior. Somente sua ponta fica situada
nitidamente à esquerda, enquanto sua base supera pela direita o esterno.
Certamente como consequência da opinião popular, que localiza o
coração à esquerda do peito, existe uma tradição de opiniões que colocam
o golpe de lança como desferido no flanco esquerdo de Jesus. Não todas,
entretanto. Santo Agostinho, por exemplo, fala em “A Cidade de Deus” de
latere dextro, flanco direito, tal como São Francisco de Assis. Segundo
Barbet, o Santo Sudário veio elucidar com seu testemunho objetivo este
problema, como tantos outros. A silhueta do tecido, com a manifestação
clara da ferida, prova que o cadáver de Cristo sofreu o golpe da lança
no costado direito e não no esquerdo. Observa-se assim na imagem
anterior do lençol um enorme coágulo de sangue no lado direito, que se
estende para cima uns seis centímetros e descende em uma dimensão de 15.
Sua margem interna aparece mordiscada com recorte arredondado. Esta
mancha de sangue ressalta no lençol, vista a pleno dia, por sua
tonalidade carmim. A parte superior do coágulo, a mais próxima à chaga, é
a mais espessa e a mais larga, e nela se distingue nitidamente um
rastro oval, que é evidentemente a estampagem da chaga do flanco. Esta
chaga mede 4,4 centímetros de comprimento por 1,5 de largura.
Barbet deduz que a ferida foi aberta por uma lança usada por um
soldado de infantaria do chão, a qual penetrou pelo quinto espaço
intercostal direito, atravessou a pleura e o pericárdio e feriu a
aurícula direita. O sangue que brotou da ferida provinha de tal
aurícula, e a água, do pericárdio, em virtude da agonia
extraordinariamente penosa do Salvador.
A morte que está morta
Ela é aquela Princesa Adormecida
no seu claro jazigo de cristal.
Aquela a quem, um dia - enfim - despertarás...
E o que esperavas ser teu suspiro final
é o teu primeiro beijo nupcial!
- Mas como é que eu te receava tanto
(no teu encantamento lhe dirás)
e como podes ser assim - tão bela?!
Nas tantas buscas, em que me perdi,
vejo que cada amor tinha um pouco de ti...
E ela, sorrindo, compassiva e calma:
- E tu, por que é que me chamavas Morte?
Eu sou, apenas, tua Alma...
Mário Quintana
no seu claro jazigo de cristal.
Aquela a quem, um dia - enfim - despertarás...
E o que esperavas ser teu suspiro final
é o teu primeiro beijo nupcial!
- Mas como é que eu te receava tanto
(no teu encantamento lhe dirás)
e como podes ser assim - tão bela?!
Nas tantas buscas, em que me perdi,
vejo que cada amor tinha um pouco de ti...
E ela, sorrindo, compassiva e calma:
- E tu, por que é que me chamavas Morte?
Eu sou, apenas, tua Alma...
Mário Quintana
‘Impotentes e frustrados’ são os mais agressivos na internet, diz psicóloga
Autoria de Solon Maia
Impotência,
frustração e uma necessidade de se impor sobre outras pessoas. Assim, a
psicóloga americana Pamela Rutledge, diretora do Media Psychology
Research Center (Centro de Pesquisas sobre Psicologia e Mídia), na
Califórnia, avalia a agressividade de muitos “comentaristas” de redes
sociais em tempos de polarização política no Brasil.
Referência em um ramo recente da
psicologia dedicado a estudar as relações entre a mente e a tecnologia,
Rutledge ressalta que as pessoas “são as mesmas”, tanto em ambientes
físicos quanto virtuais. Mas faz uma ressalva sobre a impulsividade de
quem dedica seu tempo a ofender ou ameaçar pessoas nas caixas de
comentários de sites de notícias e páginas de política:
“Já estamos acostumados com a ideia
de que nosso comportamento obedece a regras sociais, mas ainda não
percebemos que o mesmo vale na internet“.
Além da polarização política ou
ideológica, a especialista comenta a ascensão de temas como diversidade
sexual, racismo e machismo ao debate público, graças às redes sociais.
“Tudo isso já acontecia, mas não tínhamos conhecimento.”
Leia os principais trechos da entrevista.
BBC Brasil – Estamos mostrando o nosso ‘lado negativo’ nas redes sociais?
Pamela Rutledge – As
pessoas são as mesmas, online ou offline. Mas a internet tem a ver com
respostas rápidas. As pessoas falam sem pensar. É diferente da
experiência social offline, em que você se policia por conta da
proximidade física do interlocutor. Nós já estamos acostumados com a
ideia de que nosso comportamento obedece a regras sociais, mas ainda não
percebemos que o mesmo vale na internet.
BBC Brasil – No Brasil, a
polarização política tem levado pessoas com visões distintas a se
ofenderem e ameaçarem, tanto em comentários em sites de notícias quanto
nas redes sociais. A internet estimularia o radicalismo?
Rutledge – As redes sociais encorajam pessoas com posições extremas a se sentirem mais confiantes para expressá-las. Pessoas
que se sentem impotentes ou frustradas se comportam desta maneira para
se apresentarem como se tivessem mais poder. E as pessoas costumam se
sentir mais poderosas tentando diminuir ou ofender alguém.
BBC Brasil – Os comentários na internet são um índice confiável do que as pessoas realmente acreditam?
Rutledge – Depende do tópico. Mas as pessoas que tendem a responder de maneira agressiva não representam o sentimento geral.
BBC Brasil – As pessoas com opiniões menos radicais têm menos disposição para comentar do que as demais?
Rutledge – Sim. Porque
os comentários agressivos têm mais a ver com a raiva das pessoas do que
com uma argumentação para mudar a mente das outras. Quem parte para a
agressividade, não está dando informações para trazer alguém para seu
lado, estas pessoas querem apenas agredir.
BBC Brasil – A “trollagem”,
gíria de internet para piadas ou comentários maldosos sobre anônimos e
famosos, muitas vezes feitos repetidamente, é vista por muita gente como
diversão. Há perigos por trás das piadas?
Rutledge – No caso das
celebridades que são alvo da ”trollagem”, os fãs vêm defendê-las, então,
elas não costumam precisar tomar qualquer iniciativa. No caso dos
anônimos, a recomendação é usar ferramentas para solução de conflitos,
como encorajar seus amigos e conhecidos a não serem espectadores, mas a
tomarem atitudes em defesa do ofendido. Isso não significa discutir com
os autores das ofensas, porque isso alimenta os ”trolls” e é isso que
eles querem.
BBC Brasil – Os procedimentos de segurança do Facebook e do Twitter são suficientes para proteger os alvos de bullying?
Rutledge – Seria
ingênuo esperar que qualquer companhia, mesmo do tamanho do Facebook e
do Twitter, seja capaz de monitorar e ajudar neste tipo de situação. E
não dá para deixar só para as empresas aquilo que devemos ser
responsáveis, nós mesmos. É importante que as pessoas entendam como
funcionam as ferramentas e seus mecanismos para privacidade. Se a
conclusão for que o Facebook não oferece o suficiente, que as pessoas se
posicionem e reclamem: ”Não é suficiente”.
BBC Brasil – Que tipo de doenças são ligadas ao uso da internet ou das redes sociais?
Rutledge – A resposta
simples é não, não há doenças causadas pela internet. Há preocupações
recorrentes com o vício em internet ou em redes socais. Mas vícios são
doenças bastante sérias e a internet não cria personalidades com vícios.
As pessoas usam as redes da mesma forma que usam álcool, jogos,
chocolate, ou qualquer outra coisa que mascare problemas maiores.
BBC Brasil – Problemas como…?
Rutledge – Falta de autoestima, depressão. É importante chegar à real causa do vício, apenas cortar a internet não muda nada.
BBC Brasil – Temas como
diversidade sexual, racismo e machismo, vistos como tabus até
recentemente, são hoje bastante populares online. Como vê estes tópicos
ganhando atenção?
Rutledge – É sempre
positivo que as pessoas debatam e desenvolvam seu conhecimento sobre
temas. Mesmo que a conversa termine de forma negativa, isso ainda vale
para que se perceba o que está acontecendo a seu redor. Afinal, tudo
isso já acontecia, mas não tínhamos conhecimento – e isso significa que
estamos nos aproximando da possibilidade de transformá-las.
BBC Brasil – Quais são os conselhos para os pais ajudarem seus filhos a não embarcarem nas ondas de ódio das redes sociais?
Rutledge – A primeira
coisa é conversar com as crianças desde muito cedo sobre tecnologia.
Muitos evitam porque não entendem bem a tecnologia. Mas a tecnologia é
apenas o “lugar” onde as coisas estão acontecendo; o principal ainda são
os valores. Então, se algo está acontecendo em qualquer plataforma que
os pais não conheçam bem, a sugestão é que chamem as crianças e peçam
que elas deem seu ponto de vista. Aí sim eles poderão entender como as
crianças estão lidando com a questão e, a partir daí, decidir quais
devem ser as preocupações. A responsabilidade pode ser compartilhada. É
importante ensinar os filhos a pensarem criticamente.
BBC Brasil – Muitos acham que
ler históricos de conversas dos filhos ou usar apps para controlá-los é a
melhor forma de ajudar as crianças. O controle é uma boa saída?
Rutledge – Os pais
precisam entender que devem escutar seus filhos. Claro que cada situação
tem suas características, mas geralmente controlar significa que você
não conversou com eles e não lhes deu oportunidades para tomar decisões.
O problema é que, em algum momento, eles
vão precisar tomar decisões por si mesmos e você não vai estar ali, nem
o seu “app de controle”. Então, é muito melhor dialogar, e isso costuma
ser muito difícil para os pais, que tendem dizer o que os filhos devem
fazer, sem conversa.
Da BBC Brasil
quarta-feira, 30 de março de 2016
A Falta de Cultura Ética da Nossa Civilização
Creio que o exagero da atitude puramente intelectual, orientando, muitas
vezes, a nossa educação, em ordem exclusiva ao real e à prática,
contribuiu para pôr em perigo os valores éticos. Não penso propriamente
nos perigos que o progresso técnico trouxe diretamente aos homens, mas
antes no excesso e confusão de considerações humanas recíprocas,
assentes num pensamento essencialmente orientado pelos interesses
práticos que vem embotando as relações humanas.
O aperfeiçoamento moral e estético é um objetivo a que a arte, mais do que a ciência, deve dedicar os seus esforços. É certo que a compreensão do próximo é de grande importância. Essa compreensão, porém, só pode ser fecunda quando acompanhada do sentimento de que é preciso saber compartilhar a alegria e a dor. Cultivar estes importantes motores de ação é o que compete à religião, depois de libertada da superstição. Nesse sentido, a religião toma um papel importante na educação, papel este que só em casos raros e pouco sistematicamente se tem tomado em consideração.
O terrível problema magno da situação política mundial é devido em grande parte àquela falta da nossa civilização. Sem «cultura ética» , não há salvação para os homens.
Albert Einstein, in 'Como Vejo o Mundo'
O Amor não Tem nada que Ver com a Idade
Penso saber que o amor não tem nada que ver com a idade, como acontece
com qualquer outro sentimento. Quando se fala de uma época a que se
chamaria de descoberta do amor, eu penso que essa é uma maneira redutora
de ver as relações entre as pessoas vivas. O que acontece é que há toda
uma história nem sempre feliz do amor que faz que seja entendido que o
amor numa certa idade seja natural, e que noutra idade extrema poderia
ser ridículo. Isso é uma ideia que ofende a disponibilidade de entrega
de uma pessoa a outra, que é em que consiste o amor.
Eu não digo isto por ter a minha idade e a relação de amor que vivo. Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido, e que tendem a menosprezar o amor como fator de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério.
José Saramago, in "Revista Máxima, Outubro 1990"
Eu não digo isto por ter a minha idade e a relação de amor que vivo. Aprendi que o sentimento do amor não é mais nem menos forte conforme as idades, o amor é uma possibilidade de uma vida inteira, e se acontece, há que recebê-lo. Normalmente, quem tem ideias que não vão neste sentido, e que tendem a menosprezar o amor como fator de realização total e pessoal, são aqueles que não tiveram o privilégio de vivê-lo, aqueles a quem não aconteceu esse mistério.
José Saramago, in "Revista Máxima, Outubro 1990"
Fotografia
Fotografia de Oli Scarff / Getty Images, 31.03.2014
Fotografia de Ben Stansall / AFP, 31.03.2014
Fotografia de Ben Stansall / AFP, 31.03.2014
Governos de alguns estados restituem IPVA de carros roubados ou furtados
Só o estado de São
Paulo vai devolver mais de R$ 20 milhões. Veja lista dos estados que
devolvem valor do IPVA para os motoristas.
Este ano, os governos começam a devolver o dinheiro do IPVA, do ano
passado, de carros roubados e furtados. Só o estado de São Paulo vai
devolver mais de R$ 20 milhões.
Num período de seis meses, a administradora Ana Lúcia Ratti teve duas
surpresas. “Eu deixei o carro perto do trabalho, fui numa reunião,
quando voltei não estava mais lá”, conta.
A segunda surpresa? Os ladrões também roubaram o carro do marido. “Esse
o prejuízo foi maior porque era um carro antigo, carro de colecionador,
e não tinha seguir”, diz Ana.
Quem é vítima desse tipo de crime tem direito a receber o valor do IPVA
que foi pago no ano. Em São Paulo essa lei é de 2008, mas ela existe
também em outros estados como Minas Gerais, Goiás e Ceará, por exemplo.
Em São Paulo, a Secretaria da Fazenda faz o depósito numa agência do
Banco do Brasil e o dinheiro fica lá por dois anos. Depois o valor vai
para um posto da Secretaria da Fazenda e fica depositado por outros três
anos. Se o contribuinte não correr atrás, depois desses cinco anos,
perde o dinheiro.
“Isso é levantado pela Secretaria da Fazenda a partir dos BO. O valor
da restituição é calculado a razão de 1/12 avos por mês da perda de
propriedade do veículo”, explica o supervisor fiscal da Secretaria da
Fazenda de SP, Gabriel Luís Osés Lassa.
O motorista que pagou o valor integral do IPVA em janeiro: R$1200, por
exemplo, e o carro dele foi roubado ou furtado nesse mesmo mês, têm
direito a receber tudo o que pagou. Já, se o roubo ou furto acontecer em
abril, o motorista terá direito a receber R$ 900, o que equivale aos
meses restantes do ano.
Apesar de no ano passado, mais de 189 mil veículos terem sido roubados
ou furtados, e como muito motorista está com o IPVA atrasado, só uma
parte vai receber o imposto de volta, que começa a cair na conta este
ano. “A partir do momento que o veículo é recuperado, volta a incidir o
imposto”, explica Gabriel.
Ana soube pela reportagem que tinha direito à restituição do imposto, e
claro, comemorou a notícia. “Pelo menos, restitui um pouquinho do
prejuízo, né?”, fala Ana.
Para receber a restituição do IPVA, o dono do veículo precisa levar no
Banco do Brasil a identidade e o documento do carro. Se o ladrão roubou
também o documento, essa informação deve constar no Boletim de
Ocorrência.
Veja abaixo a lista de alguns estados que restituem o IPVA:
SÃO PAULO
A Secretaria de Fazenda do estado já começou a devolver o IPVA para proprietários de veículos roubados. O reembolso é referente à restituição proporcional do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e beneficia os proprietários que haviam pago o imposto quando ocorreu o crime. Clique aqui e veja como restituir o valor do IPVA de veículos roubados.
MINAS GERAIS
A devolução é proporcional ao período que a pessoa ficou sem o veículo, desde que ele foi roubado até o dia 31/12 de cada ano. O prazo é de cinco anos para fazer o requerimento. O pedido pode ser feito a qualquer momento na Secretaria da Fazenda.
CEARÁ
No Ceará, o motorista que tiver o carro roubado só pode pedir isenção do IPVA caso o roubo tenha ocorrido até o último dia do ano anterior, ou seja, para não pagar o IPVA de 2016, o veículo precisa ter sido roubado até o dia 31 de dezembro de 2015. Neste caso, o motorista precisa se dirigir à um posto da Secretaria da Fazenda do Ceará com um Boletim de Ocorrência, dá-se início a contagem de 30 dias para o processo de isenção iniciar.
Veja abaixo a lista de alguns estados que restituem o IPVA:
SÃO PAULO
A Secretaria de Fazenda do estado já começou a devolver o IPVA para proprietários de veículos roubados. O reembolso é referente à restituição proporcional do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e beneficia os proprietários que haviam pago o imposto quando ocorreu o crime. Clique aqui e veja como restituir o valor do IPVA de veículos roubados.
MINAS GERAIS
A devolução é proporcional ao período que a pessoa ficou sem o veículo, desde que ele foi roubado até o dia 31/12 de cada ano. O prazo é de cinco anos para fazer o requerimento. O pedido pode ser feito a qualquer momento na Secretaria da Fazenda.
CEARÁ
No Ceará, o motorista que tiver o carro roubado só pode pedir isenção do IPVA caso o roubo tenha ocorrido até o último dia do ano anterior, ou seja, para não pagar o IPVA de 2016, o veículo precisa ter sido roubado até o dia 31 de dezembro de 2015. Neste caso, o motorista precisa se dirigir à um posto da Secretaria da Fazenda do Ceará com um Boletim de Ocorrência, dá-se início a contagem de 30 dias para o processo de isenção iniciar.
GOIÁS
O Detran/Go isenta do pagamento do IPVA, o motorista que tem o carro roubado, desde que ele comprove que foi vítima de roubo. Se o veículo for encontrado, a isenção é proporcional ao tempo em que o dono ficou sem ele. A Secretaria da Fazenda de Goiás esclarece que o motorista que tiver o veículo roubado ou furtado no Estado pode pedir a restituição do IPVA "não utilizado" à Sefaz. O pedido é feito em requerimento padronizado, disponível no site www.sefaz.go.gov.br, e deve ser entregue nas delegacias fiscais, nas unidades Vapt Vupt da Secretaria e no protocolo geral, no complexo fazendário.
O Detran/Go isenta do pagamento do IPVA, o motorista que tem o carro roubado, desde que ele comprove que foi vítima de roubo. Se o veículo for encontrado, a isenção é proporcional ao tempo em que o dono ficou sem ele. A Secretaria da Fazenda de Goiás esclarece que o motorista que tiver o veículo roubado ou furtado no Estado pode pedir a restituição do IPVA "não utilizado" à Sefaz. O pedido é feito em requerimento padronizado, disponível no site www.sefaz.go.gov.br, e deve ser entregue nas delegacias fiscais, nas unidades Vapt Vupt da Secretaria e no protocolo geral, no complexo fazendário.
TOCANTINS
No Tocantins existe uma lei de 2001 que determina a devolução do IPVA de veículos roubados e furtados. Diferente de alguns estados, existe um calendário para o pagamento do imposto, que varia de acordo com o final da placa. O dinheiro devolvido irá corresponder ao proporcional do IPVA.
No Tocantins existe uma lei de 2001 que determina a devolução do IPVA de veículos roubados e furtados. Diferente de alguns estados, existe um calendário para o pagamento do imposto, que varia de acordo com o final da placa. O dinheiro devolvido irá corresponder ao proporcional do IPVA.
PARÁ
Para obter a devolução de imposto já pago é necessário protocolar processo junto a Secretaria da Fazenda. Chamado de restituição de indébito, os detalhes do pedido estão em
http://www.sefa.pa.gov.br/index.php/orientacoes/manual-de-atendimento/1209-restituicao-indébito. O pedido é feito junto as Coordenações regionais da Secretaria da Fazenda em todo o estado.
Para obter a devolução de imposto já pago é necessário protocolar processo junto a Secretaria da Fazenda. Chamado de restituição de indébito, os detalhes do pedido estão em
http://www.sefa.pa.gov.br/index.php/orientacoes/manual-de-atendimento/1209-restituicao-indébito. O pedido é feito junto as Coordenações regionais da Secretaria da Fazenda em todo o estado.
SERGIPE
Para pedir a restituição, a pessoa precisa dar entrada no pedido diretamente na Secretaria da Fazenda, mas tem que levar uma documentação que inclui o boletim de ocorrência da polícia e também a comprovação de que informou o roubo do veículo no DETRAN. Além disso, o pagamento só ocorre no exercício seguinte ao do IPVA que já foi pago.
Para pedir a restituição, a pessoa precisa dar entrada no pedido diretamente na Secretaria da Fazenda, mas tem que levar uma documentação que inclui o boletim de ocorrência da polícia e também a comprovação de que informou o roubo do veículo no DETRAN. Além disso, o pagamento só ocorre no exercício seguinte ao do IPVA que já foi pago.
PERNAMBUCO
A Secretaria da Fazenda de Pernambuco (Sefaz-PE) informa que realiza a devolução do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de carros roubados. O valor é restituído com base no período em que o proprietário permaneceu sem o carro, sendo computado mensalmente. Ou seja, o contribuinte pode ter uma devolução de 1/12 avos até 12/12 avos do valor pago de imposto.
A Secretaria da Fazenda de Pernambuco (Sefaz-PE) informa que realiza a devolução do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de carros roubados. O valor é restituído com base no período em que o proprietário permaneceu sem o carro, sendo computado mensalmente. Ou seja, o contribuinte pode ter uma devolução de 1/12 avos até 12/12 avos do valor pago de imposto.
BAHIA
Para pedir a restituição, o motorista deve registrar o Boletim de Ocorrência na Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos e, com isso, essa ocorrência já passa a constar no sistema do Detran. No exercício posterior, o contribuinte deve solicitar através de processo a devolução do IPVA em uma unidade da Sefaz no SAC, e receberá em conta corrente o valor proporcional referente aos meses que ele ficou sem a posse do veículo.
Para pedir a restituição, o motorista deve registrar o Boletim de Ocorrência na Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos e, com isso, essa ocorrência já passa a constar no sistema do Detran. No exercício posterior, o contribuinte deve solicitar através de processo a devolução do IPVA em uma unidade da Sefaz no SAC, e receberá em conta corrente o valor proporcional referente aos meses que ele ficou sem a posse do veículo.
PARAÍBA
Na Paraíba, segundo a Receita Estadual, todo contribuinte que pague IPVA tem direito a receber a devolução do valor pago. Para ter direito é preciso ir até a Receita Estadual com o boletim de ocorrência policial e os comprovantes de compra do veículo.
Na Paraíba, segundo a Receita Estadual, todo contribuinte que pague IPVA tem direito a receber a devolução do valor pago. Para ter direito é preciso ir até a Receita Estadual com o boletim de ocorrência policial e os comprovantes de compra do veículo.
RIO GRANDE DO SUL
Para receber a restituição, o dono do carro tem que registrar a ocorrência e encaminhar requerimento à Receita Estadual. Quando o dinheiro é liberado após o requerimento à Receita Estadual, o dono do carro não é avisado. Mas pode acompanhar o processo pelo site da secretaria (www.sefaz.rs.gov.br).
Para receber a restituição, o dono do carro tem que registrar a ocorrência e encaminhar requerimento à Receita Estadual. Quando o dinheiro é liberado após o requerimento à Receita Estadual, o dono do carro não é avisado. Mas pode acompanhar o processo pelo site da secretaria (www.sefaz.rs.gov.br).
RIO DE JANEIRO
Para restutuir o valor do IPVA, o motorista não é avisado e tem que abrir um processo nas inspetorias para obter a restituição. O registro do Boletim de Ocorrência é basta para obter o direito à restituição, nos termos do art. 13-A da Lei 2877/97, pois há comunicação entre os sistemas do DETRAN_RJ e da SEFAZ_RJ, que permitem que seja visualizado o cadastro do roubo nos sistemas. O formulário de restituição está no site da Secretaria da Fazenda.
Para restutuir o valor do IPVA, o motorista não é avisado e tem que abrir um processo nas inspetorias para obter a restituição. O registro do Boletim de Ocorrência é basta para obter o direito à restituição, nos termos do art. 13-A da Lei 2877/97, pois há comunicação entre os sistemas do DETRAN_RJ e da SEFAZ_RJ, que permitem que seja visualizado o cadastro do roubo nos sistemas. O formulário de restituição está no site da Secretaria da Fazenda.
DISTRITO FEDERAL
O contribuinte tem de comunicar à Secretaria de Fazenda, pessoalmente em uma das agências da Receita do DF, o roubo e apresentar o BO. A partir da reclamação é aberto processo administrativo que irá gerar a cobrança proporcional do valor do imposto.
O contribuinte tem de comunicar à Secretaria de Fazenda, pessoalmente em uma das agências da Receita do DF, o roubo e apresentar o BO. A partir da reclamação é aberto processo administrativo que irá gerar a cobrança proporcional do valor do imposto.
Se o contribuinte já tiver pago o valor total, fazemos a restituição. Caso não tenha pago, ele ganha um prazo para pagamento e calculamos o valor proporcional ao tempo de uso do veículo até a ocorrência.
RECIFE
A Secretaria da Fazenda de Pernambuco (Sefaz-PE) informa que realiza a devolução do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de carros roubados. O valor é restituído com base no período em que o proprietário permaneceu sem o carro, sendo computado mensalmente. Ou seja, o contribuinte pode ter uma devolução de 1/12 avos até 12/12 avos do valor pago de imposto.
MARANHÃO
A Secretaria da Fazenda de Pernambuco (Sefaz-PE) informa que realiza a devolução do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de carros roubados. O valor é restituído com base no período em que o proprietário permaneceu sem o carro, sendo computado mensalmente. Ou seja, o contribuinte pode ter uma devolução de 1/12 avos até 12/12 avos do valor pago de imposto.
MARANHÃO
A Secretaria de Estado da Fazenda
(Sefaz) informa que o estado do Maranhão não adota a medida de
restituição de valor pago do Imposto Sobre a Propriedade de Veículos
Automotores (IPVA), nos casos de veículos roubados.
No entanto, o Maranhão não realiza a cobrança de IPVA's futuros, sendo
que, para que isso aconteça é necessário que o proprietário do veículo
furtado dê entrada a um processo de comunicação de roubo (com
requerimento, CPF do requerente, Boletim de Ocorrência policial ou
Quaisquer outros documentos relativos à justificativa) junto à
Secretaria de Estado da Fazenda e junto ao DETRAN-MA, para cancelamento
de cobrança do imposto ao proprietário do veículo roubado.
AMAZONAS
O Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas (Sefaz) informou que não devolve as quantias pagas, apenas interrompe a cobrança a partir do momento em que é apresentado o Boletim de Ocorrência.
MATO GROSSO
A partir do registro do Boletim de Ocorrência, a polícia informa ao Detran a data do roubo e a partir deste informe o IPVA é suspenso. Se o imposto já estiver pago, no vencimento do imposto no ano seguinte ao sinistro, o contribuinte precisa entrar com processo na Sefaz solicitando a restituição. O valor restituído é proporcional aos meses do ano em que o motorista ficou sem o carro (se o roubo ocorreu em março, é recolhido o proporcional a janeiro, fevereiro e março e devolvido o restante.) A restituição é feita por depósito na conta do contribuinte.
AMAZONAS
O Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas (Sefaz) informou que não devolve as quantias pagas, apenas interrompe a cobrança a partir do momento em que é apresentado o Boletim de Ocorrência.
MATO GROSSO
A partir do registro do Boletim de Ocorrência, a polícia informa ao Detran a data do roubo e a partir deste informe o IPVA é suspenso. Se o imposto já estiver pago, no vencimento do imposto no ano seguinte ao sinistro, o contribuinte precisa entrar com processo na Sefaz solicitando a restituição. O valor restituído é proporcional aos meses do ano em que o motorista ficou sem o carro (se o roubo ocorreu em março, é recolhido o proporcional a janeiro, fevereiro e março e devolvido o restante.) A restituição é feita por depósito na conta do contribuinte.
Elaine Bast - São Paulo, SP
G1
terça-feira, 29 de março de 2016
As Chamadas Verdades Essenciais do Homem
As chamadas verdades essenciais do homem lembram-me às vezes números
de um grande programa que os tambores anunciam pelas ruas fora que vai
ser deslumbrante e cumprido à risca, e que os pobres atores, à noite,
realizam sabe Deus como, a passar em claro cenas inteiras. A afirmar e a
prometer, nenhum bicho leva a palma ao colega antropóide. Mas é vê-lo
em plena representação, ou depois dela, no camarim, nu e lavado. Que
miséria! A justiça imanente que pregou e demonstrou, acrescenta-lhe, por
segurança, o ergástulo e o carrasco; ao pecado, junta-lhe a confissão; à
predestinação, o livre arbítrio; à morte, a ressurreição. Lembra-me
sempre a velha história dos castelos de heroísmo e fidelidade, com a
portinha da traição disfarçada nas muralhas...
Miguel Torga, in "Diário (1943)"
Miguel Torga, in "Diário (1943)"
A Ignorância e a Burrice
"As constelações servem para esclarecer a noite". Bela frase, não? A mim, soa
como Guimarães Rosa, o uso ambíguo do verbo esclarecer sugerindo algo de arcaico e
místico. Um astrólogo certamente enxergaria nela vestígios simbólicos, as
constelações servindo para aclarar a obscuridade de nossos destinos. Um marinheiro, por
outro lado, veria na frase a expressão de uma verdade empírica: à noite, navegamos
orientados pelas estrelas — conhecimento indispensável quando nos faltam
instrumentos. Eu fico com a ressonância lírica — me basta.
Juro: se pudesse, roubava a frase para
dizê-la como um comentário displicente depois de observar longamente o céu salpicado de
estrelas numa noite de lua nova, lá no alto da serra. Sim, depois de um longo silêncio
eu sussurraria ao teu ouvido num tom grave e sorrateiro: "As constelações servem
para esclarecer a noite", e certamente mais duas estrelas se acenderiam no teu rosto,
cheias de admiração pela sabedoria que eu teria se a frase fosse minha...
E nem seria difícil me apropriar da
frase, visto que ela talvez hoje envergonhe seu autor anônimo, depois de ter sido
enjeitada pelos bedéis do senso comum que julgaram as redações da galera que prestou
vestibular para UFRJ este ano. Eles não só não gostaram da frase como a incluíram em
uma mensagem eletrônica que fizeram circular pela Internet (eu só recebi agora) reunindo
o que consideraram ironicamente como "pérolas": frases que continham erros mais
ou menos crassos — fosse de informação, sintaxe ou grafia.
Há outras frases igualmente geniais. Por
exemplo: "O Brasil é um país abastardo com um futuro promissório".
Engraçadíssima síntese histórica, sociológica e econômica! E se há erro no uso do
"abastardo", salva-se o "promissório" — que, basta consultar o
Aurélio, serve de sinônimo de "promissor", sim — além de criar uma
ambigüidade semântica digna dos melhores humoristas.
Outra na mesma linha: "É preciso
melhorar as indiferenças sociais e promover o saneamento de muitas pessoas". Esta é
irretocável! Nossa indiferença social é mais do que visível, é chocante, e certamente
o saneamento de algumas pessoas poderia ser a solução — isto é, se crermos que
certas pessoas são mesmo saneáveis... Um jovem sustentar essa esperança me enche de
genuína alegria.
Outras duas me surpreenderam
positivamente por seu evidente surrealismo: "A Geografia Humana estuda o homem em que
vivemos". Ora, não sei se existe mesmo uma geografia humana, mas certamente não
faltariam acadêmicos que defenderiam a idéia de que o homem é um produto da cultura e
que, portanto, o homem antecede o homem — isto é, vivemos "em" um homem
que nos é dado ou imposto sob a forma de uma língua, costumes, preconceitos e gostos que
seria mesmo importante estudar, até para podermos saneá-lo.
A segunda diz assim: "A História se
divide em 4: Antiga, Média, Moderna e Momentânea (esta, a dos nossos dias)". O.K.,
era pra se dizer "contemporânea", mas na velocidade em que anda a história o
rapaz ou a moça foi talvez premonitório — ou deveria eu dizer promontório?
Finalmente, três frases que foram
rejeitadas certamente apenas por seu tom coloquial, pois a verdade delas é tão
cristalina que dispensa qualquer defesa: "Com a morte de Jesus Cristo os apóstolos
continuaram a sua carreira." (E com enorme sucesso, ressalte-se). "Os pagãos
não gostavam quando Deus pregava sua dotrina e tinham a idéia de eliminá-lo."
(Está certo, faltou o u de doutrina, mas a ênclise chiquérrima compensa-a com sobras).
"Entre os povos orientais os casamentos eram feitos "no escuro" e os noivos
só se conheciam na hora h."
Pois é, eis aí exposta a diferença
entre a ignorância e a burrice. Ignorância é falta de conhecimento. Burrice é
preconceito travestido de conhecimento. O ignorante pode ou não ter consciência do que
não sabe. O burro tem certeza de que sabe o que, na verdade, não sabe. O burro, enfim,
privilegia o mediano, o medíocre, o conhecido e reiterado. Está condenado a repetir,
cego para a "milionária contribuição de todos os erros" de que falava Mário
de Andrade — ou seria Oswald?
Bom, ficam desde já convidados os
autores das frases citadas a comparecer a este jornal para receber a Comenda Mário de
Andrade (ou será Oswald?) em reconhecimento a sua modesta, mas decisiva, contribuição
ao nosso milionário acervo de erros. Pois, vítimas de um ensino dominado pelos burros,
conseguiram dar um brilho de genialidade à própria ignorância. Parabéns e obrigado
— minhas melhores esperanças repousam sobre vós.
Antônio H. Caetano
Desqualificar o inimigo
Quando a "guerra" esta perdida, resta fuga em massa, e campanha para
desqualificar o inimigo. O PMDB já desembarcou do governo, onde a bem da
verdade, ocupava mais cargos do que dava apoio. Como sempre. E,
proximamente, o veremos no poder de novo, e desta vez, com o presidente
do seu partido, no comando da nação. Dizem seus aliados que o Brasil
não tem nada a Temer. Veremos. Quanto a desqualificar o inimigo, tática
usada na Itália pelos réus do processo "Mãos limpas" que inspirou a
Lava-Jato, foi exatamente desqualificar a justiça, como o Lula, e a
Organização Criminosa que lidera, tentam contra o juiz Sérgio Moro. O
ridículo da ação pode ser medido na proporção do capital moral do Lula e
do PT, contra os seis milhões de manifestantes do ultimo dia 13 de
Março. Lula não é mais nada no quadro político brasileiro. Não cuida de
outra coisa a não ser fugir da polícia e da justiça. É evitado pelos
políticos até no telefone. Ao contrário o juiz Sérgio Moro aparece entre
os 50 mais influentes do mundo. É o cara.
Eduardo P. Lunardelli
segunda-feira, 28 de março de 2016
Tu És uma Mulher Rara
Minha Anuska, onde foste buscar a ideia de que és uma mulher como outra
qualquer? Tu és uma mulher rara, e, além do mais, a melhor de todas as
mulheres. Tu própria não sonhas as qualidades que tens. Não só diriges a
casa e as minhas coisas, como a nós todos, caprichosos e enervantes, a
começar por mim e a acabar no Aléxis. Nos meus trabalhos desces ao mais
pequeno pormenor, não dormes o suficiente, ocupada com a venda dos meus
livros e com a administração do jornal. Contudo, conseguimos apenas
economizar alguns copeques - quanto aos rublos, onde estão eles?
Mas a teu lado nada disso tem importância. Devias ser coroada rainha, e teres um reino para governar: juro-te que o farias melhor que ninguém. Não te falta inteligência, bom senso, sentido da ordem e, até... coração. Perguntas como posso eu amar uma mulher tão velha e feia como tu Aí, sim, mentes. Para mim és um encanto, não tens igual, e qualquer homem de sentimentos e bom gosto to dirá, se atentar em ti. Por isso é que às vezes sinto ciúmes. Tu própria nem sabes a maravilha que são os teus olhos, o sorriso e a animação que pões na conversa. O mal é saíres poucas vezes, se não ficarias admirada com o teu êxito. Para mim é melhor assim - no entanto, Anuska, minha rainha, sacrificaria tudo, até os meus ataques de ciúmes, se quisesses sair e distraíres-te. Sim, muito gostaria que te divertisses. E se tivesse ciúmes, vingava-me querendo-te ainda mais.
(...) Enfim, não deves admirar-te que te queira tanto, como marido e como homem. Sim, quem, se não tu, me estraga com mimos? Quem, se não tu, se fundiu comigo em corpo e alma? Todos os segredos, nesse ponto nos são comuns! E não havia eu de adorar cada átomo da tua pessoa e beijar-te como te beijo? Tu não podes compreender a mulher-anjo que és.
Mas a teu lado nada disso tem importância. Devias ser coroada rainha, e teres um reino para governar: juro-te que o farias melhor que ninguém. Não te falta inteligência, bom senso, sentido da ordem e, até... coração. Perguntas como posso eu amar uma mulher tão velha e feia como tu Aí, sim, mentes. Para mim és um encanto, não tens igual, e qualquer homem de sentimentos e bom gosto to dirá, se atentar em ti. Por isso é que às vezes sinto ciúmes. Tu própria nem sabes a maravilha que são os teus olhos, o sorriso e a animação que pões na conversa. O mal é saíres poucas vezes, se não ficarias admirada com o teu êxito. Para mim é melhor assim - no entanto, Anuska, minha rainha, sacrificaria tudo, até os meus ataques de ciúmes, se quisesses sair e distraíres-te. Sim, muito gostaria que te divertisses. E se tivesse ciúmes, vingava-me querendo-te ainda mais.
(...) Enfim, não deves admirar-te que te queira tanto, como marido e como homem. Sim, quem, se não tu, me estraga com mimos? Quem, se não tu, se fundiu comigo em corpo e alma? Todos os segredos, nesse ponto nos são comuns! E não havia eu de adorar cada átomo da tua pessoa e beijar-te como te beijo? Tu não podes compreender a mulher-anjo que és.
Mas eu provo-to, quando voltar. Que eu sou de temperamento apaixonado, mas pensas que outro temperamento apaixonado possa amar a tal ponto uma mulher como eu to provei milhares de vezes? É verdade que essas provas antigas não contam, e agora, quando voltar, parece-me que te devorarei com beijos. (Ninguém lerá esta carta, nem tu a mostrarás a ninguém).
(...) Escreves-me a frase do costume: que somos umas pessoas muito estranhas - decorreram dez anos e amamo-nos cada vez mais. Se vivermos ainda mais dez anos, dirás então: somos umas pessoas muito estranhas - vivemos juntos vinte anos e amamo-nos cada vez mais. Por mim, respondo eu. Mas viverei ainda dez anos?
(...) Anuska, estou a teus pés. Beijo-te e adoro-te. Rezo por ti e para ti. Beijo-te toda, toda. Beijo os pequenos. Diz-lhes que o paizinho não tarda. Ah, meus queridos, que Deus vos guarde.
Fiodor Dostoievski, in 'Carta a Anna Grigórievna Snítkina (1876)'
Soneto - Mulher Abstrata
Sou quem sou, simplesmente mulher, não fujo, nem nego,
Corro risco, atropelo perigo, avanço sinal, ignoro avisos.
Procuro viver, sem medo, sem dor, com calor, aconchego,
Supro carências, rego desejos, desabrocho em risos...
Matéria cobiçada... na tez macia, no calor ardente.
Alma pura, envolta em completa fissura. Sem frescuras!
Encontro prazer na forma completa, repleta, latente.
Meretriz sem pudor,mulher no ponto, uva madura!
Sou quadro abstrato, me entrego no ato à paixão que aflora.
Sou enigma permanente, sem ponto final, sem continências,
Sou mulher tão somente, vivendo o momento, sorvendo as horas.
Sou pétala recolhida, sem forma, sem cor, completa em essência.
Exalo a esperança, transpiro vontades. Não me tenhas senhora.
Sou mulher insolúvel, nada volúvel. Vivo a vida em reticências...
Corro risco, atropelo perigo, avanço sinal, ignoro avisos.
Procuro viver, sem medo, sem dor, com calor, aconchego,
Supro carências, rego desejos, desabrocho em risos...
Matéria cobiçada... na tez macia, no calor ardente.
Alma pura, envolta em completa fissura. Sem frescuras!
Encontro prazer na forma completa, repleta, latente.
Meretriz sem pudor,mulher no ponto, uva madura!
Sou quadro abstrato, me entrego no ato à paixão que aflora.
Sou enigma permanente, sem ponto final, sem continências,
Sou mulher tão somente, vivendo o momento, sorvendo as horas.
Sou pétala recolhida, sem forma, sem cor, completa em essência.
Exalo a esperança, transpiro vontades. Não me tenhas senhora.
Sou mulher insolúvel, nada volúvel. Vivo a vida em reticências...
Ângela Bretas
Despedida
Se a razão não permite
este convite que te faço
apelo ao coração,
e digo,
movido pelo descompasso
que não existe melhor abrigo
que o aconchego do teu abraço
um laço que me acorrenta
e meu peito não aguenta
quando chega a despedida,
e chora,
porque sabe que nesta vida
às vezes a melhor saída é,
mesmo chorando,
ir embora
e agora
ando eu a pé sem rumo
procurando no sumo
dos amores vazios
teu gosto
em vão,
porque ainda que diga não
só sinto firme meu chão
quando imagino teu rosto,
sorrindo,
lindo como a névoa fria
que cobre os jardins de agosto
mas,
se tudo tem um adeus
sigo então meu caminho
levando com muito carinho
além de um perene espinho
o brilho dos olhos teus.
Vinícius Cruz
este convite que te faço
apelo ao coração,
e digo,
movido pelo descompasso
que não existe melhor abrigo
que o aconchego do teu abraço
um laço que me acorrenta
e meu peito não aguenta
quando chega a despedida,
e chora,
porque sabe que nesta vida
às vezes a melhor saída é,
mesmo chorando,
ir embora
e agora
ando eu a pé sem rumo
procurando no sumo
dos amores vazios
teu gosto
em vão,
porque ainda que diga não
só sinto firme meu chão
quando imagino teu rosto,
sorrindo,
lindo como a névoa fria
que cobre os jardins de agosto
mas,
se tudo tem um adeus
sigo então meu caminho
levando com muito carinho
além de um perene espinho
o brilho dos olhos teus.
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Fábula
O piquenique das tartarugas...
Uma família de tartarugas decidiu sair para um
piquenique. As tartarugas, sendo naturalmente lentas, levaram sete anos
para se prepararem para seu passeio. Somente no segundo ano da viagem
encontraram um lugar ideal!
Ao desembalarem a cesta de piquenique, descobriram que
tinham esquecido o sal. Um piquenique sem sal seria um desastre, todas
concordaram. Após uma longa discussão, a tartaruga mais nova foi
escolhida para voltar em casa e pegar o sal. A pequena tartaruga
concordou, mas com uma condição: que ninguém comeria até que ela
retornasse.
Três, cinco, sete anos se passaram e a pequena
tartaruga não tinha retornado. A tartaruga mais velha não aguentava mais
e disse que ia comer um sanduíche.
Nesta hora, a pequena tartaruga saiu de trás de uma
árvore e gritou, Viu! Eu sabia que vocês não iam me esperar. Agora que
eu não vou mesmo buscar o sal.
Descontando os exageros da estória, na nossa vida as
coisas acontecem mais ou menos da mesma forma. Nós desperdiçamos nosso
tempo esperando que as pessoas vivam à altura de nossas expectativas.
Prof. Menegatti
domingo, 27 de março de 2016
Ambiciosa
Para aqueles fantasmas que passaram,
Vagabundos a quem jurei amar,
Nunca os meus braços lânguidos traçaram
O vôo dum gesto para os alcançar…
Vagabundos a quem jurei amar,
Nunca os meus braços lânguidos traçaram
O vôo dum gesto para os alcançar…
Se as minhas mãos em garra se cravaram
Sobre um amor em sangue a palpitar…
– Quantas panteras bárbaras mataram
Só pelo raro gosto de matar!
Sobre um amor em sangue a palpitar…
– Quantas panteras bárbaras mataram
Só pelo raro gosto de matar!
Minha alma é como a pedra funerária
Erguida na montanha solitária
Interrogando a vibração dos céus!
Erguida na montanha solitária
Interrogando a vibração dos céus!
O amor dum homem? – Terra tão pisada!
Gota de chuva ao vento baloiçada…
Um homem? – Quando eu sonho o amor dum deus!…
Gota de chuva ao vento baloiçada…
Um homem? – Quando eu sonho o amor dum deus!…
Florbela Espanca
Mudança de idade
Para explicar
os excessos do meu irmão
a minha mãe dizia:
está na mudança de idade.
Na altura,
eu não tinha idade nenhuma
e o tempo era todo meu.
Despontavam borbulhas
no rosto do meu irmão,
eu morria de inveja
enquanto me perguntava:
em que idade a idade muda?
Que vida,
escondida de mim, vivia ele?
Em que adiantada estação
o tempo lhe vinha comer à mão?
Na espera de recompensa,
eu à lua pedia uma outra idade.
Respondiam-me batuques
mas vinham de longe,
de onde já não chega o luar.
Antes de dormirmos
a mãe vinha esticar os lençóis
que era um modo
de beijar o nosso sono.
Meu anjo, não durmas triste, pedia.
E eu não sabia
se era comigo que ela falava.
A tristeza, dizia,
é uma doença envergonhada.
Não aprendas a gostar dessa doença.
As suas palavras
soavam mais longe
que os tambores nocturnos.
O que invejas, falava a mãe, não é a idade.
É a vida
para além do sonho.
Idades mudaram-me,
calaram-se tambores,
na lua se anichou a materna voz.
E eu já nada reclamo.
Agora sei:
apenas o amor nos rouba o tempo.
E ainda hoje
estico os lençóis
antes de adormecer.
os excessos do meu irmão
a minha mãe dizia:
está na mudança de idade.
Na altura,
eu não tinha idade nenhuma
e o tempo era todo meu.
Despontavam borbulhas
no rosto do meu irmão,
eu morria de inveja
enquanto me perguntava:
em que idade a idade muda?
Que vida,
escondida de mim, vivia ele?
Em que adiantada estação
o tempo lhe vinha comer à mão?
Na espera de recompensa,
eu à lua pedia uma outra idade.
Respondiam-me batuques
mas vinham de longe,
de onde já não chega o luar.
Antes de dormirmos
a mãe vinha esticar os lençóis
que era um modo
de beijar o nosso sono.
Meu anjo, não durmas triste, pedia.
E eu não sabia
se era comigo que ela falava.
A tristeza, dizia,
é uma doença envergonhada.
Não aprendas a gostar dessa doença.
As suas palavras
soavam mais longe
que os tambores nocturnos.
O que invejas, falava a mãe, não é a idade.
É a vida
para além do sonho.
Idades mudaram-me,
calaram-se tambores,
na lua se anichou a materna voz.
E eu já nada reclamo.
Agora sei:
apenas o amor nos rouba o tempo.
E ainda hoje
estico os lençóis
antes de adormecer.
No livro “Tradutor de chuvas”
A Fábula do Imperador Chinês
Há anos estou a escrever um romance só para me divertir.
Aproveitando esse clima de fim de carnaval, de começo de semestre, em
que já estamos de baixo do mau tempo político, resolvi publicar seu
primeiro capítulo aqui. Chama-se A Fábula do Imperador Chinês. O
livro não tem nada a ver com nada, muita gente vai ficar pensando “o
que deu na Marcia para publicar tal absurdo”, não é um texto político em
sentido estrito, nem trata de questões urgentes, nem que sirvam à nada,
é uma pura fantasia que conta com a maldade do leitor nesse momento.
Mas talvez haja alguém que possa se divertir com ele. E, como a falta de
imaginação está nos fazendo muito mal, ao pensar numa política da
ficção, quem sabe a gente possa começar aceitando um inicial convite ao
sonho.
O Imperador Chinês
Ao acordar Lady N percebeu o imperador chinês, herdeiro do trono do
grande Hui-Cheng, colado à parede como display de papel. Correu para
perto com um grito. Durante anos ele esteve sentado ao seu lado, meio de
costas impedindo-lhe de ver seu rosto. Tentava esboçar duas palavras
finalmente ditas na noite passada. As palavras surgiram como papelão que começa a se rasgar, ou como o pássaro de asa cortada estranhamente pousado à janela, cujos movimentos observei no fim da tarde nublada enquanto Lady N dedicava-se a pentear os próprios cabelos.
Isso foi há muitos anos. Lady N preserva, contudo, depois de tanto
tempo, os mesmos longos cabelos pelos quais daria a própria vida.
As palavras ditas pelo homem de olhos puxados eram mágicas, e eram
tenebrosas. Palavras que não deveriam ter sido ditas por ninguém, muito
menos naquelas circunstâncias a uma pessoa naquele estado. A palavra no lugar da pálpebra,
segundo a expressão poético-licenciosa de Lady N que, embora soubesse
se expressar com mais objetividade, sempre preferia dar um ar de
mistério a tudo o que dizia. A que não se ouve por dentro, disse
em sussurro ao delegado que, fazendo as vezes de carcereiro na
delegacia da pequena cidade, a conduziu aos fundos da construção
improvisada onde ela esperaria o camburão que a levaria ao presídio. Faca bem afiada das usadas para matar porcos,
afirmou com a certeza dos especialistas enquanto o gentil homem
chaveava a porta da cela com um olho amedrontado e o outro condoído. O
imperador cortou-lhe a cabeça com um golpe veloz, ela contava, seu corpo
pendeu soltando-se com leveza, pois estava magra como tecido de
algodão. Era assim que descrevia a si mesma deixando o delegado
preocupado como um filho que se condói de uma mãe alucinada. Ali, pura
cabeça, ela procurava o corpo, implorando a qualquer um que lhe desse a
chance de recuperar suas partes como se alguém pudesse fazer algo por
ela.
Sua magreza era um escândalo a olhos vistos, todos percebiam que algo
não ia bem com ela há muito tempo. Mas nesses casos, ninguém tem
coragem de dizer nada. O fato de que não comesse há dias piorava ainda
mais a situação de nossa heroína. O delegado, sabendo que na delegacia
nada havia para comer, perguntou-lhe se aceitava uma maçã, mas ela
respondeu que se alimentava há muito tempo apenas de carne seca. Sabendo
que há alguma verdade em toda a mentira, o delegado, que viu em Lady N
algo de muito familiar, prometeu que estaria com ela, que não a deixaria
só, que viria ouvi-la em breve e traria algo de comer que fosse de seu
agrado como empadas de carne seca.
Lady N, podia estar louca, era a desconfiança geral, mas de uma coisa
ela sabia, e não podemos contestá-la, ela não sentiu dor alguma no
momento do golpe, apenas o choque no atravessamento certeiro da faca.
Apesar do pescoço cortado, Lady N pode se mover e olhar de perto a fotografia, como ela nos relatou no momento em que fomos visitá-la. No lugar do corpo usava o soldado igualmente chinês que servia café da manhã nos aposentos que ela ocupava com o imperador. Na ponta da lança, a cabeça com os cachos dos cabelos soltos e os olhos bem abertos, como dos que morrem assustados.
Aqui a imagem do soldado com a cabeça na ponta da lança. Na falta, usamos esse, por enquanto:
Durante anos vitrificados atrás de cortinas de seda o imperador
amou-a desenhando três linhas sobre papel de arroz cujas folhas ela
comprava todos os meses na loja Ching perto do cais do porto. Os vendedores de lá, remanescentes da pequena família Chun, informaram-lhe há semanas que não haveria mais fornecimento de tão afilado artefato. Restou a seguinte etiqueta.
Lady N, temendo desagradar seu homem, procurou este papel por meses
em todos os mercados da cidade sem jamais reencontrar o finíssimo
produto.
Imóvel sobre seu trono, o imperador parecia não se importar.
No silêncio infinito que ambientava a solidão do homem, enlaçando-os em uma espécie de união mística,
Lady N acreditou que estaria protegida para sempre de todo frio com os
traços inapagáveis do caligrama a tinta negra que o imperador
vagarosamente desenhava para provar-lhe seu amor. Nem uma lágrima de
dúvida mancharia o cenário de névoa em que viveram por tantos e tão comoventes anos
cujos dias transcorriam um por um, cada um na sua vez, como elefantes
indianos em fila, certos de encontrar o melhor modo de seguir.
Lady N era uma pessoa nada fácil de convencer, mas não resistia a uma
fila bem organizada, sobretudo quando lembrava de seus tempos no circo
com sua elefanta Janaína. Ela que já estivera tão próxima de um elefante
agora teria que contentar-se em ser só uma cabeça cortada por um
imperador chinês.
Essas lembranças faziam pensar ainda mais em seu corpo. Quando se é
uma cabeça pensa-se mais ainda. O corpo que falta torna-se um objeto de
desejo insuportável. O corpo, ela teve tempo de dizer antes que o delegado sumisse no corredor escuro, o corpo é algo que pesa.
Sabendo que tudo não passa de alucinação, ao mesmo tempo que, tendo em
vista que há alguma verdade em toda loucura, é que aprendemos a levar a
sério o que ela tentou nos dizer.
Em um primeiro momento, sei, sabemos, que ela pensou, que neste
momento tenso em que se perde a cabeça, ou melhor, em que ela perdeu o
corpo, e assim parte considerável de sua vida, que fora a falta do papel
o motivo da decapitação. Somente agora, quando tudo se encaminha para o
fim, é que a resposta aparece com a força aterradora da verdade que não
se mede nas formas triviais.
Antes desencorpada do que acéfala, pouco antes de ir
parar na delegacia onde a encontramos dentro de uma cela, Lady N olhava
para o display tencionando as pálpebras. Um filete de sangue mancha a
imagem dividindo-a em duas. Do lado de cá, na pequena antessala do
quarto, o soldado tenta levá-la para longe. Ela tem na língua a força
descomunal do seu grito. Lança-se na direção do seu desejo, e se trata
de um desejo muito forte. Percebendo-se cansada, ela ordena ao soldado
que descanse. Não é fácil imaginar Lady N nessa situação, corpo e
cabeça, distanciados, verdadeiramente separados por um golpe mortal e
dando ordens a um soldado que a conduz para longe de si mesma. O soldado
obedece por alguns minutos até que, com a renovação dos esforços
sonoros de Lady N, três ou quatro frases depois, está novamente a
postos. Espantada que sua mera voz ecoe em sua cabeça e seja capaz de
dobrar um homem tão grande, é assim que ela está.
Mas a história de Lady N apenas começou.
Mesmo tendo sobre o soldado todo o poder, Lady N teme o soldado como temia o imperador chinês quando apareceu à sua porta.
Márcia Tiburi
O amor, quando se revela...
O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...
Fernando Pessoa
Garcia Márquez na URSS
Winston Churchill disse certa vez que a URSS era “uma
adivinhação embrulhada num mistério e guardada dentro de um enigma”. A URSS e a
China foram as duas maiores megaexperiências sociais do século 20, numa escala ciclópica
de autoritarismo, de frenesi industrializante, de exploração do trabalho, de condicionamento
ideológico. Nós aqui do Ocidente podemos apenas imaginar pelos relatos (a favor
e contra) que chegaram até nós. Vi neste saite (http://tinyurl.com/zkn78na) algumas
impressões de Gabriel Garcia Márquez quando visitou o país dos sovietes, em
1957, e que retratam tanto o país quanto o olho humanista e esperto do
jornalista e escritor.
Diz Gabo: “Parece que estamos viajando rumo a um
horizonte inatingível num mundo bem peculiar, onde o tamanho de tudo excede as
proporções humanas, e precisamos mudar toda a nossa percepção da normalidade
para tentar entender este país. (...) O alfabeto russo tem um aspecto tal que
as letras das placas parecem estar se desmanchando em pedaços, o que nos dá uma
impressão de ruína. (...) Este é um povo que parece precisar
desesperadamente de fazer amigos. (...) Dá para entender a velha piada americana de
que os soviéticos acham que inventaram tudo, desde o garfo até o telefone.
Enquanto o mundo ocidental acelerava rumo ao progresso tecnológico, eles
estavam aqui tendo que criar o básico. Se um turista em Moscou encontrar um
sujeito nervoso que diz ter inventado o refrigerador, não pense que ele é
maluco. É bem possível que ele tenha precisado inventar algo que já existia no
Ocidente. (...) O povo
russo não toma café, e encerra as refeições com chá. Eles tomam chá a qualquer hora. Os
melhores hotéis de Moscou nos servem um chá chinês de tal qualidade poética, de
um aroma tão sutil que a vontade que a gente tem é de derramá-lo na cabeça.
“Os soviéticos
exprimem seus sentimentos da maneira mais exaltada. Demonstram sua felicidade
como se estivessem dançando uma dança cossaca. Estão prontos a dar a alguém a
única camisa que possuem, e quando se despedem de um amigo choram lágrimas
verdadeiras. Mas tornam-se discretos e furtivos quando a conversa descamba para
a política. (...) Quem vê fotos das
vitrines das lojas, todas vazias, tem dificuldade em crer que os soviéticos
tenham armas nucleares. Mas a vitrine vazia confirma a veracidade desse fato.
As armas nucleares, os foguetes espaciais, a agricultura mecanizada, as usinas
elétricas e os esforços titânicos para transformar um deserto em terra
cultivável têm como resultado o fato de que para isto o povo soviético tem
usado sapatos ruins e roupas mal cosidas, e tem passado por grandes
necessidades nos últimos 50 anos.”
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo sábado, 26 de março de 2016
Luz depois do mergulho
Depois de te amar saio refrescada
transparente nascida água
matéria de cisterna
de fosso fundo eterna
na tua profundidade
depois de me encharcar volto cristalina
do escuro à tona respiro
busco a luz que te defina:
água, talvez
água fugaz corpo piscina
Claudia Roquette-Pinto
A donzela Arabela (O amanuense Belmiro)
Aconteceu-me ontem uma coisa realmente extraordinária. Não tendo conseguido conter-me em
casa, desci para a Avenida, segundo habito antigo. Já ela estava repleta de
carnavalescos, que aproveitavam, como podiam, sua terceira noite.
Pus-me a examinar colombinas fáceis, do lado da Praça Sete, quando inesperadamente me vi envolvido no fluxo de um cordão. Procurei desvencilhar-me, como pude, mas a onda humana vinha imensa, crescendo em torno de mim, por trás, pela frente e pelos flancos. Entreguei-me, então, aquela humanidade que me pareceu mais cansada que alegre. Os sambas eram tristes e homens pingavam suor. Um máscara-de-macaco deu-me o braço e mandou-me cantar. Respondi-lhe que, em rapaz, consumi a garganta em serenatas e que esta, já agora, não ajudava. Imagino a figura que fiz, de colarinho alto e pince-nez, no meio daquela roda alegre, pois os foliões e engraçaram comigo, e fui, por momentos, o atrativo do cordão. Tanto fizeram que, sem perceber o disparate, me pus a entoar velha canção de Vila Caraíbas.
Uma gargalhada espantosa explodiu em torno de mim. Deram-me uma corrida e, depois de me terem atirado confete à boca, abandonaram-me ao meio da rua embriagado de éter. Novo cordão levou-me, porém, para outro lado, e, nesse vaivém, fui arrastado pelos acontecimentos. Um jato de perfume me atingia às vezes. Procurava, com os olhos gratos, a origem dessa caricia, mas percebia, desanimado, que aquele jato resvalara de outro rosto a que o destinara uma boneca holandesa. Contudo, aquelas migalhas me consolaram e comoviam. Dêem-me um jato de éter perdido no espaço e construirei um reino. Mas a boneca holandesa foi arrastada por um príncipe russo, que a livrou dos braços de um marinheiro.
Bebendo aqui, bebendo ali, acabei presa de grande excitação, correndo atrás de choros, de blocos e cordões. Não sei como, envolvido em que grupo, entrei no salão de um clube, acompanhando a massa na sua liturgia pagã.
Lembra-me que homens e mulheres, a um de fundo, mãos postas nos quadris do que ia à frente, dançavam, encadeados, e entoavam os coros que descem do Morro.
Toadas tristes, que vêm da carne.
A certo momento, alguém enlaçou o braço, cantando: “Segura, meu bem, segura na mão, não deixes partir o cordão...” O braço que se lembrou do meu braço tinha uma branca e fina mão. Jamais esquecerei: uma branca e fina mão. Olhei ao lado: a dona da mão era uma branca e doce donzela. Foi uma visão extraordinária. Pareceu-me que descera até a mim a branca Arabela, a donzela do castelo que tem uma torre escura onde as andorinhas vão pousar. Pobre mito infantil! Nas noites longas da fazenda, contava-se história da casta Arabela, que morreu de amor e que na torre do castelo entoava doridas melodias.
Efeito da excitação de espírito me que me achava, ou de qualquer outra perturbação, senti-me fora do tempo e do espaço, e meus olhos só percebiam a doce visão. Era ela, Arabela. Como estava bela! A música lasciva se tornou distante, e as vozes dos homens chegavam a mim, lentas e desconexas. Em meio dos corpos exaustos, a incorpórea e casta Arabela. Parecia que eu me comunicava com Deus e que um anjo descera sobre mim. Meu corpo se desfazia em harmonias, e alegre música de pássaros se produzira no ar. Não me lembra quanto tempo durou o encantamento e só vagamente me recordo de que, em um momento impossível de localizar, no tempo e no espaço, a mão me fugiu. Também tenho uma vaga idéia de que alguém me apanhou do chão, pisado e machucado, e me pôs num canapé onde, já sol alto, fui dar acordo de mim.
O mito donzela Arabela tem enchido minha vida. Esse absurdo romantismo de Vila Caraíbas tem uma força que supera as zombarias do Belmiro sofisticado e faz crescer, desmesuradamente, em mim, um Belmiro patético e obscuro. Mas viviam os mitos, que são o pão dos homens.
Nesta noite de quarta-feira de cinzas, chuvosa e reflexiva, bem noto que vou entrando numa fase da vida em que o espírito abre mão de suas conquistas, e o homem procura a infância, numa comovente pesquisa das remotas origens do ser.
Há muito que ando em estado de entrega. Entregar-se a gente as puras e melhores emoções, renunciar aos rumos da inteligência e viver simplesmente pela sensibilidade — descendo de novo cautelosamente, a margem do caminho, o véu que cobre a face real das coisas e que foi, aqui e ali, descerrado por mão imprudente — parece-me a única estrada possível. Onde houver claridade, converta-se em fraca luz de crepúsculo, para que as coisas se tornem indefinidas e possamos gerar nossos fantasmas. Seria uma fórmula para nos conciliarmos com o mundo.
Pus-me a examinar colombinas fáceis, do lado da Praça Sete, quando inesperadamente me vi envolvido no fluxo de um cordão. Procurei desvencilhar-me, como pude, mas a onda humana vinha imensa, crescendo em torno de mim, por trás, pela frente e pelos flancos. Entreguei-me, então, aquela humanidade que me pareceu mais cansada que alegre. Os sambas eram tristes e homens pingavam suor. Um máscara-de-macaco deu-me o braço e mandou-me cantar. Respondi-lhe que, em rapaz, consumi a garganta em serenatas e que esta, já agora, não ajudava. Imagino a figura que fiz, de colarinho alto e pince-nez, no meio daquela roda alegre, pois os foliões e engraçaram comigo, e fui, por momentos, o atrativo do cordão. Tanto fizeram que, sem perceber o disparate, me pus a entoar velha canção de Vila Caraíbas.
Uma gargalhada espantosa explodiu em torno de mim. Deram-me uma corrida e, depois de me terem atirado confete à boca, abandonaram-me ao meio da rua embriagado de éter. Novo cordão levou-me, porém, para outro lado, e, nesse vaivém, fui arrastado pelos acontecimentos. Um jato de perfume me atingia às vezes. Procurava, com os olhos gratos, a origem dessa caricia, mas percebia, desanimado, que aquele jato resvalara de outro rosto a que o destinara uma boneca holandesa. Contudo, aquelas migalhas me consolaram e comoviam. Dêem-me um jato de éter perdido no espaço e construirei um reino. Mas a boneca holandesa foi arrastada por um príncipe russo, que a livrou dos braços de um marinheiro.
Bebendo aqui, bebendo ali, acabei presa de grande excitação, correndo atrás de choros, de blocos e cordões. Não sei como, envolvido em que grupo, entrei no salão de um clube, acompanhando a massa na sua liturgia pagã.
Lembra-me que homens e mulheres, a um de fundo, mãos postas nos quadris do que ia à frente, dançavam, encadeados, e entoavam os coros que descem do Morro.
Toadas tristes, que vêm da carne.
A certo momento, alguém enlaçou o braço, cantando: “Segura, meu bem, segura na mão, não deixes partir o cordão...” O braço que se lembrou do meu braço tinha uma branca e fina mão. Jamais esquecerei: uma branca e fina mão. Olhei ao lado: a dona da mão era uma branca e doce donzela. Foi uma visão extraordinária. Pareceu-me que descera até a mim a branca Arabela, a donzela do castelo que tem uma torre escura onde as andorinhas vão pousar. Pobre mito infantil! Nas noites longas da fazenda, contava-se história da casta Arabela, que morreu de amor e que na torre do castelo entoava doridas melodias.
Efeito da excitação de espírito me que me achava, ou de qualquer outra perturbação, senti-me fora do tempo e do espaço, e meus olhos só percebiam a doce visão. Era ela, Arabela. Como estava bela! A música lasciva se tornou distante, e as vozes dos homens chegavam a mim, lentas e desconexas. Em meio dos corpos exaustos, a incorpórea e casta Arabela. Parecia que eu me comunicava com Deus e que um anjo descera sobre mim. Meu corpo se desfazia em harmonias, e alegre música de pássaros se produzira no ar. Não me lembra quanto tempo durou o encantamento e só vagamente me recordo de que, em um momento impossível de localizar, no tempo e no espaço, a mão me fugiu. Também tenho uma vaga idéia de que alguém me apanhou do chão, pisado e machucado, e me pôs num canapé onde, já sol alto, fui dar acordo de mim.
O mito donzela Arabela tem enchido minha vida. Esse absurdo romantismo de Vila Caraíbas tem uma força que supera as zombarias do Belmiro sofisticado e faz crescer, desmesuradamente, em mim, um Belmiro patético e obscuro. Mas viviam os mitos, que são o pão dos homens.
Nesta noite de quarta-feira de cinzas, chuvosa e reflexiva, bem noto que vou entrando numa fase da vida em que o espírito abre mão de suas conquistas, e o homem procura a infância, numa comovente pesquisa das remotas origens do ser.
Há muito que ando em estado de entrega. Entregar-se a gente as puras e melhores emoções, renunciar aos rumos da inteligência e viver simplesmente pela sensibilidade — descendo de novo cautelosamente, a margem do caminho, o véu que cobre a face real das coisas e que foi, aqui e ali, descerrado por mão imprudente — parece-me a única estrada possível. Onde houver claridade, converta-se em fraca luz de crepúsculo, para que as coisas se tornem indefinidas e possamos gerar nossos fantasmas. Seria uma fórmula para nos conciliarmos com o mundo.
Cyro Versiani dos Anjos
Texto extraído do livro “O amanuense Belmiro”, Editora José Olympio – Rio
de Janeiro, 1971, pág. 19.
As mentes inchadas
Algumas
ideias aderem a nosso espírito e não desgrudam
Estou, mais uma
vez, a reler os Pensamentos do francês Joseph Joubert. Algumas
ideias aderem a nosso espírito e não desgrudam. Assim é meu caso pessoal com
Joubert: sou seu prisioneiro. Mas quem foi ele afinal? Nascido no coração do
século 18, Joseph Joubert foi amigo de Diderot, e também de Chateaubriand, de
quem chegou a se tornar secretário. Faleceu em 1824, em Paris, aos setenta
anos. Moralista e ensaísta, é quase completamente desconhecido no Brasil. Leio
e releio seus pensamentos na edição espanhola da Edhasa, de 1995, livro
organizado por Carlos Pujol.
Não é preciso uma
ordem, já que Joubert pensa e escreve por aforismos — isto é, por raciocínios
compactos e dispersos, expressos em poucas palavras. Verdadeiras flechadas.
Desde logo, seu poder de síntese me fascina. Abro ao acaso o livro organizado
por Pujol. Esbarro em uma primeira frase: “Há muitíssimas coisas que só se
fazem bem quando se fazem por necessidade”. O filósofo fala de mim — ou pelo
menos é o que sinto. É o que sentimos quando lemos escritores que nos desafiam.
Uma necessidade secreta me leva a voltar a seus pensamentos.
Algumas linhas à
frente, outra ideia completa a primeira: “A idade. O espírito não se apaga, mas
há que alimentar esse fogo com outra lenha”. Chego, esse mês, aos 65 anos de
idade. Preciso de novos alimentos. Estranho: cada vez que releio Joubert, tenho
o sentimento de que o leio pela primeira vez. Na verdade, leio sim. O que li
ontem não é mais o que leio agora. Sua escrita me provoca muitos sustos. Ela me
desloca e esbofeteia.
Diz Joubert: “A
filosofia dos antigos. Prefiro suas nuvens a nossos seixos”. O pensamento
contemporâneo parece, de fato, atulhado de cascalhos. Frequentar a internet,
por exemplo, é muito atraente e divertido, mas é também dispersivo. Seixos são
fragmentos de rocha, pedras toscas que, em vez de nos reforçar, nos ferem.
Restam cicatrizes, que lemos com dificuldade. Na grande rede, a fragmentação,
em vez de nos elevar, nos arranha, sem chegar, no entanto, a rasgar nosso
sangue. Melhor a elevação dos antigos, que nos leva a tomar distância de nós
mesmos. E a nos olhar com vigor, mas também com piedade. Mas é preciso ter
cuidado com as conclusões. Alerta Joubert: “O orgulho é o cúmulo da
ignorância”. Não acreditar demais em si.
Em Joseph
Joubert, a dispersão é um antídoto contra a arrogância do desfecho. Ele escreve
por impulsos, assim como pensamos por impulsos também. O pensamento odeia as
conclusões últimas, porque as percebe como uma amputação. Devemos nos dispersar
para nos salvar. Alerta: “Toda loucura se deve a um excesso de rigor, de tensão
e de atenção exclusiva”. O melhor pensamento, o mais fértil, é aquele que surge
da divagação. E, assim, se liberta da loucura da precisão. “Os poetas, buscando
a beleza, encontram mais verdades que os filósofos que buscam a verdade”, diz.
Mas a dispersão é diferente da fragmentação — aquela que fere e afasta. No
mundo virtual, pisamos em cacos de vidros. Lendo Joubert, em um tapete de
plumas.
Joubert
pensa e escreve por aforismos — isto é, por raciocínios compactos e dispersos,
expressos em poucas palavras. Verdadeiras flechadas. Desde logo, seu poder de
síntese me fascina.
É preciso,
contudo, não ser arrogante e reconhecer que mesmo a imaginação tem sua origem
em nossas limitações. “O medo nutre a imaginação”, ele escreve. É de algumas de
nossas piores coisas, de nossos mais brutais defeitos que, enfim, arrancamos a
beleza. A arrogância — que crê que o bom só procede do bom — é, na verdade, um
obstáculo. Precisamos aceitar o que temos de pior para chegar a um pouco do que
temos de melhor. Lembro aqui de um pensamento de Fernando Pessoa, que capturo
em O eu profundo. Diz assim: “A lucidez só
deve chegar ao limiar da alma. Nas próprias antecâmaras do sentimento é
proibido ser explícito”, Pessoa escreve. Também Clarice não se cansou de nos
dizer que a verdade é sempre implícita e, na maior parte das vezes,
inalcançável. Resta-nos evocá-la. Roçar de leve em sua face áspera. E ficar com
isso.
É por isso também
que Joubert faz a defesa do silêncio — o que é muito útil em nossos tempos de
zoeira e dispersão. Escreve: “O silêncio. Delícias do silêncio. Os pensamentos
hão de nascer da alma, e as palavras do silêncio. Um silêncio atento”. Os
meninos que esbofeteiam imagens nas lan houses navegam em um turbilhão. Não conseguem
ficar quietos, não podem silenciar. A máquina devora seus corações. Quantos
deles podem, de fato, permanecer quietos? O silêncio — a solidão — lhes é
insuportável. Contudo, e ainda que pareça um paradoxo, é do silêncio que as
palavras, enfim, surgem. Imperfeitas. Insuficientes. Cheias de defeitos, mas
também de emoção. Sempre me surpreendo com esses meninos que hoje, além da fast
food das cadeias
internacionais, se empanturram de imagens coloridas. Encontro um comentário de
Joubert que talvez lhes caiba: “Mentes esfregadas pelo fósforo e que parecem
luminosas. E, no entanto, brilham, mas não iluminam”.
A dispersão no
pensamento de Joubert, em vez de levar a um cenário estilhaçado, promove uma
espécie de flutuação. Um recolhimento — como o do menino que, armado só com uma
lanterna, se esconde sob os lençóis para ler o Robinson
Crusoe. Eu mesmo fiz isso aos onze anos de idade, e a
experiência da caverna marcou minha vida. Já tentei escrever um livro sobre
ela, mas as palavras não expressam o que vivi, e desisti. Talvez meu problema
tenha sido exatamente este: ter me deixado guiar pelo ideal da precisão. As
palavras, por melhor que as definam os dicionários, desconhecem o rigor
absoluto. São ambíguas, vivem de metáforas e de alusões. São insuficientes.
Não é fácil, sequer,
escutar a nós mesmos. Volto a Joubert: “A alma fala consigo mesmo em
parábolas”. Fala de modo indireto, evoca mais do que fala. Trata-se de uma fala
que nem sempre podemos traduzir, podemos talvez apenas sentir. Infelizmente,
vivemos o século do estilo oficial, da linguagem padronizada, do culto ao
correto. Nesse sistema de rigidez, as alusões nos escapam, e com elas o
espírito individual também. Anota Joubert: “Maneira, de mania. Se é
involuntária, é um tic. Se é natural, nós a chamamos de originalidade. Se é
deliberada, estudada, é jargão, charlatanismo”. Só a volta ao pessoal e ao que
é natural abre caminho para uma chegada a si. No ano de 1805, em pleno
alvorecer do século 19, Joubert escreve ainda: “Muita inchação nas mentes e
muita magreza no estilo: uma das características desse século”. De que século
ele realmente fala?
JOSÉ CASTELLO
É escritor e jornalista. Autor do romance Ribamar,
entre outros livros. Vive em Curitiba (PR).
(http://rascunho.com.br/colunistas/josecastello/as-mentes-inchadas;
acesso em: 22-03-2016)
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