quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Um verbo decisivo

Ansiosos por descobrirem mais um “inimigo” político, eleitores, ou melhor, torcedores me criticam por não tomar partido, por estar em cima do muro nessa briga de foice entre os presidenciáveis. E estou mesmo, porque, em meio a paixões desenfreadas, esse é o lugar mais indicado para quem dispõe de um espaço privilegiado e se recusa a transformá-lo em palanque. Proselitismo aqui só contra o uso da violência pelos candidatos, cujas divergências, aliás, são menos ideológicas e mais idiossincráticas.
 
Na verdade, combatem de preferência as pessoas, mais do que as ideias. Quem gosta de baixo nível deve procurar o “território livre” da internet — livre principalmente para xingamentos e acusações sem provas. Alguém sugeriu que, a exemplo deste jornal, que na seção “Dos leitores” se recusa a publicar cartas com ofensas, as emissoras de TV deveriam criar um código de conduta nos debates, uma espécie de pacto de não agressão pessoal pelas partes em disputa.
 
Se até nas selvagens lutas de vale-tudo do MMA há limites para os golpes, por que não estabelecer restrições éticas na guerra eletrônica? Claro que muitos iam acusar a medida de censura, cerceamento da liberdade de expressão. Mas os que ligam a televisão para ver debates, e não embates, com certeza aplaudiriam.
 
Pode-se dizer que houve um avanço domingo passado, pois na TV Record o tom foi menos belicoso, bem mais moderado, os candidatos menos provocativos, diferentemente de como se portaram no SBT, quando transformaram os blocos em rounds e o estúdio em ringue. Resta saber se, como nos conflitos armados, trata-se apenas de uma trégua ou da suspensão definitiva das hostilidades. Há algumas hipóteses para a nova postura.
 
A primeira seria o efeito da disposição do Tribunal Superior Eleitoral de punir os ataques com perda de tempo no rádio e na televisão, como aliás acaba de fazer com os dois concorrentes. Outra é que o baixo nível teria sido transferido para as redes sociais. Há ainda a possibilidade de que pesquisas qualitativas teriam mostrado rejeição à estratégia dos ataques virulentos.
 
Daí a opção pelas denúncias contra os partidos e os governos, mais do que contra os governantes. De fato, assistiu-se a um desfile de escândalos para ver em que administração houve mais corrupção, se na do PSDB ou do PT, e quem de um lado ou de outro recebeu mais propina.
 
O teste final será nesta semana, com o acirramento da disputa em consequência da troca de posições nas pesquisas de opinião. É possível que vença não quem apresentou o melhor programa de governo, mas quem usou com mais eficácia contra o/a adversário/a o verbo que virou moda nessa campanha: desconstruir.
 
 
Zuenir Ventura

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