terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Prazeres da "melhor idade"

A voz em Congonhas anunciou: "Clientes com necessidades especiais, crianças de colo, melhor idade, gestantes e portadores do cartão tal terão preferência etc.". Num rápido exercício intelectual, concluí que, não tendo necessidades especiais, nem tendo criança de colo, gestante ou portador do tido cartão, só me restava a "melhor idade" - algo entre os 60 anos e a morte.

Para os que ainda não chergaram a ela, "melhor idade", é quando você pensa duas vezes antes de se abaixar para pegar o lápis que deixou cair e, se ninbguém estiver olhando, chuta-o para debaixo da mesa. Ou, tendo atravessado a rua fora da faixa arrepende-se no meio do caminho porque o sinal abriu e agota terá de correr para salvar a vida. Ou quando o singelo ato de dar o laço no pé esquerdo do sapato equivale, segundo João Ubaldo Ribeiro, a uma modalina olímpica.

Privilégios da "melhor idade" são o ressecamento da pele, a esteoporose, as placas de gordura no coração, a pressão lembrando placar de basquete americano, a falência dos neurônios, as baixas de visão e audição, a falta de ar, a queda de cabelo, a tendência à obesidade e as disfunções sexuais. Ou seja, nós da "melhor idade", estamos com tudo, e os demais podem ir lamber sabão.

Outra característica da "melhor idade" é a disponibilidade de seus membros para tomar as montanhas de Rivotril, Lexotan e Frontal que seus médicos lhe receitam e depois não conseguem retirar. 

Outro dia, bem cedo, um jovem casal cruzou comigo no Leblon. Talvez vendo em mim Pterodáctilo da clássica boemia carioca, o rapaz perguntou: "Voltando da farra, Ruy?". Respondi, eufórico: "Que nada! Estou voltando da farmácia!". E esta, de fato, é uma grande vantagem da "melhor idade": você extrai prazer de qualquer lugar que ainda consiga ir. 


Ruy Castro

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