A alma é uma coleção de belos quadros adormecidos, os seus rostos
envolvidos pela sombra. Sua beleza é triste e nostálgica porque, sendo
moradores da alma, sonhos, eles não existem do lado de fora. Vez por
outra, entretanto, defrontamo-nos com um rosto (ou será apenas uma voz,
ou uma maneira de olhar, ou um jeito da mão...) que, sem razões, faz a
bela cena acordar. E somos possuídos pela certeza de que este rosto que
os olhos contemplam é o mesmo que, no quadro, está escondido pela
sombra. O corpo estremece. Está apaixonado.
Acontece, entretanto, que não esxiste coisa alguma que seja do tamanho
do nosso amor. A nossa fome de beleza é grande demais.(...) Cedo ou tarde
descobrirá que o rosto não é aquele. E a bela cena retornará à sua
condição de sonho impossível da alma. E só restará a ela alimentar-se da
nostalgia que rosto algum poderá satisfazer...
Rubem Alves.
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