Tenho inveja dos cronistas novos. Não porque eles não sabem que todas
as crônicas de Natal já foram escritas e podem escrevê-las de novo. Mas
porque podem fazer isto sem remorso.
Tem a crônica de Natal tipo “o que eu gostaria que Papai Noel me
trouxesse”. A Luana Piovani ou um fac-símile razoável, a paz entre os
povos, um centroavante para o Internacional (ou um fac-símile razoável)
etc.
Tem as infinitas variações sobre
problemas encontrados por Papai Noel no mundo moderno (seu trenó levado
num assalto, sua dificuldade em se identificar em portarias eletrônicas,
protestos de ambientalistas contra o seu tratamento das renas, suspeita
de exploração de trabalho escravo, suspeita de pedofilia etc.).
Tem as muitas maneiras de atualizar a história da Natividade (Maria e
José em fila do SUS, os Reis Magos chegando atrasados porque foram
detidos por patrulhas israelenses ou militantes palestinos, Jesus vítima
de uma bala perdida).
Tem as versões diferentes da cena na manjedoura, inclusive — juro que
já li esta, se não a escrevi — narrada do ponto de vista do boi.
Todas já foram feitas.
Há tantas crônicas de Natal possíveis quanto há meios de se desejar felicidade ao próximo.
Os cartões de fim de ano são outro desafio à criatividade humana. Pois todas as suas variações também já foram inventadas.
Quando eu trabalhava em publicidade, todos os anos recebia encomendas
de saudações de Natal e Ano Novo “diferentes”, porque os clientes não
se contentavam em apenas desejar que o Natal fosse feliz e o Ano Novo
fosse próspero.
Uma vez sugeri um cartão de Natal completamente branco com a frase
“Aquelas coisas de sempre…” num canto, mas acho que este foi considerado
diferente demais.
E dê-lhe poesia, pensamentos inspiradores, má literatura e a busca desesperada do diferente.
Um cartão em forma de sapato, de dentro do qual saía uma meia: a meia
para o Papai Noel encher de presentes e o sapato para entrar no Ano
Novo de pé direito. Coisas assim.
Enfim, tudo isto é apenas para desejar a você aquelas coisas de sempre…
Luis Fernando Veríssimo
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