Sim, a direita é meio tosca mesmo. E não me
refiro à direita horrorosa a favor da ditadura militar. Refiro-me à direita
liberal, a favor da sociedade de mercado. Ela ainda acha que pensar é arroz de
festa.
Alguns anos atrás escrevi uma coluna que falava
de uma outra dificuldade estrutural da direita liberal no Brasil: não sabe
pegar mulher. Na época, me referia a necessidade da direita liberal jovem
deixar de ser chata e criar uma "direita festiva". Não saber pegar
mulher é uma coisa muita séria para um homem. Saber pegar mulher é um traço
adaptativo importante na história do Sapiens.
Nelson Rodrigues dizia que um homem com menos de
18 anos não devia nem dizer "bom dia" para uma mulher porque só diria
besteiras.
Um jovem liberal deveria, antes de falar com uma
mulher, observar como os jovens de esquerda se movem de forma competente quando
se trata de pegar mulher. Sabem conversar sobre filmes, livros, sentimentos.
Arriscaria dizer que mesmo liberais de mais de quarenta anos continuam bobos
diante de uma mulher e acabam por falar coisas grosseiras e idiotas. Nunca se
deve menosprezar a importância de saber pegar mulher quando se trata do futuro
da humanidade em jogo.
Mas, há uma outra dificuldade estrutural da
direita liberal: só acredita em economia e não acredita em ideias, por isso
nunca investe nelas e considera um intelectual um animador de festa e jantares.
Acredita mesmo que tudo pode ser comprado e aí apanha da esquerda, que tem uma
visão mais abrangente do Sapiens, mesmo que a use para mentir ou criar mundos
absurdos. Falta à direita um repertório humanista, por isso é meio tosca.
Isso pode parecer uma questão de detalhe, mas
não é. Claro que não se trata de uma regra geral, mas, diria, se trata de um
caso quase perdido. A direita liberal acha que o pragmatismo econômico é a
única forma de ação que existe no homem. Aqui já aparece sua pobreza de
espírito: deixa para a esquerda toda a rica reflexão acerca da humanidade e do
"cuidado" para com nosso sofrimento, agonia e inseguranças. A falta
de compreensão para com o sofrimento humano é uma das piores faces que a
direita liberal apresenta para o mundo. E isso cria a reserva do "mercado
humanista" para a esquerda.
A "mania econômica" da direita liberal
a cega para o fato que muito já se produziu em matéria de reflexão sobre a
humanidade ao longo dos séculos, e, com isso, condena os mais jovens às
inutilidades do humanismo raso da esquerda, nascido do ressentimento.
Por isso, essa direita será sempre incapaz de
enfrentar a esquerda no plano das ideias. Contará sempre com partidos
fisiológicos para lidar com a inquestionável hegemonia intelectual da esquerda
no país. E nunca terá interlocução no mundo da produção de conteúdo porque,
exatamente, não acredita na inteligência.
No fundo, é a velha mesquinharia característica
de quem vê a vida a partir do "livro-caixa da loja". Falta uma certa
coragem espiritual à direita liberal, o que, reconheçamos, não falta à esquerda
em geral. Não consegue entender que, se a vida é em grande parte uma cadeia
produtiva sem garantia ou piedade, ela é, também, uma narrativa sobre esse
sentimento asfixiante de contingência, abandono e solidão que acomete o Sapiens
há milênios.
Narramos nossa vida e nossas experiências porque
precisamos dessas narrativas. Na falta de certezas sobre o sentido maior das
coisas, aprendemos, ao longo dos milênios, a sentar ao redor do fogo para
contar histórias, experiências, medos e projetos de como superá-los.
A direita não acredita na importância das
narrativas sobre a vida, sobre nossas vitórias e sobre nossas derrotas. E
quando olha para esses assuntos, o faz, sempre e unicamente, com os olhos do
marketing. E o pecado do marketing é sua estrutural contradição para com a
ideia de autenticidade. E todos, inclusive quem trabalha com o marketing, sabe
desse abismo que o separa da ânsia de verdade que nos assola desde o
Paleolítico. Falta à direita liberal humildade para aprender com nossas
sombras. Falta a ela reverência pelo fracasso.
Luiz Felipe Pondé
(Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/luizfelipeponde/2016/09/1814522-a-direita-nao-acredita-em-ideias-e-acha-que-intelectual-e-animador-de-festa.shtml.
Acesso em: 19 setembro 2016.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário