Enquanto escrevo este texto, a cerimônia de abertura da Paraolimpíada (ou
Paralimpíada?) está em pleno curso. Na maior parte dos sites, jornais e
emissoras de rádio e TV, predomina a forma "Paralimpíada", como
desejam os comitês oficiais (o Olímpico e o Paralímpico). Na Folha e no UOL, a forma empregada é
"Paraolimpíada", como determinam os cânones da língua.
Não quero me meter na discussão sobre as razões
que o Comitê Paralímpico Internacional (International Paralympic Committee) tem
para exigir que se suprima o "o" de "olympic" e,
consequentemente, de "olímpico" na formação do nome do seu comitê em
inglês, português etc. Parece que o que motiva o CPI (IPC, no original) a impor
a supressão do "o" é algo de fundo comercial e sabe Deus mais o quê.
O que temos em "paraolímpico" (ou
"paralímpico"?) é a formação de um termo que resulta da soma do
elemento grego "par(a)-" com o adjetivo "olímpico". De
acordo com o "Houaiss", o elemento "par(a)-" ocorre com a
noção de "junto", "ao lado de", "ao longo de",
"para além de", o que se vê em vocábulos como "paramédico",
"parapsicologia", "paratireoide", "paranormal"
etc.
A Paraolimpíada (ou Paralimpíada?) não é a
Olimpíada, mas segue muitos dos seus ritos (os esportes, as premiações, as
cerimônias, o espírito que norteia as competições etc.), ou seja, é algo
paralelo à Olimpíada, daí o nome levar o "par(a)-".
Pois bem. Chegamos ao xis da questão: a
supressão do "o".
"Portuguesmente" falando, essa
supressão do "o" não faz o menor sentido, já que, na nossa língua, o
que pode ocorrer é a supressão da vogal final do primeiro elemento e não da
vogal inicial do segundo elemento.
Vejamos: de "hidr(o)-" +
"elétrico" tem-se "hidroelétrico" ou
"hidrelétrico" (e não "hidrolétrico"); de
"gastro-" + "intestinal" tem-se
"gastrointestinal" ou "gastrintestinal" (e não
"gastrontestinal"). Poderíamos, pois, ter também
"Parolimpíada" e "parolímpico".
Muitos desses vocábulos que resultam da
supressão da vogal final do primeiro elemento (como
"gastrenterologista", "gastrenterologia", entre tantos
outros) podem causar surpresa, estranheza etc., o que talvez decorra da maior
ou menor incidência desta ou daquela forma.
Mais surpresa ainda causam formas que surgem de
um processo que não é da língua, como o que se vê em "Paralimpíada" e
"paralímpico". Espúrias, essas formas contradizem o que é natural no
nosso idioma, fato que justifica a opção da Folha e do UOL pelas formas vernáculas.
O "Houaiss", o "Aulete" e o
"VOLP" ignoram solenemente as formas impostas pelos comitês
internacionais, ou seja, só registram "paraolímpico" e
"Paraolimpíada".
Aproveito para lembrar um caso que não é
propriamente semelhante, mas tem alguma afinidade. Refiro-me à Petrobras, que,
quando fundada, era "Petrobrás", e assim ficou até a década de 90,
quando perdeu o acento agudo. Os argumentos foram bizarros. Um deles dizia que
"não existe acento em inglês". De acordo com esses gênios,
investidores internacionais poderiam achar que se tratava de um apóstrofo
("Petrobra's"), o que poderia fazer um gringo achar que...
Haja bobagem! Como se sabe, a suíça Nestlé nunca
prosperou em canto nenhum do mundo justamente por causa do acento... É isso.
Pasquale Cipro Neto
(Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/colunaseblogs/pasquale/2016/09/1811218-paraolimpiada-ou-paralimpiada.shtml.
Acesso em: 08 setembro 2016.)
Um comentário:
Tudo bem que a língua é viva e está em constante mudança, isso eu concordo. Mas ter pessoas que controlem o que é ou não para ser usado (a revisão ortográfica inclusive) mostra-se um processo de "idiotização", "imbecialização" sem limites. Tristes realidades.
Parabéns pelo blog. Boas compilações e fotos!
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