sábado, 9 de janeiro de 2010

São Luiz de Paraitinga da cidade de Pombal


Quando eu vi no JN um dos mais importantes conjuntos arquitetônicos do período do café no Estado de São Paulo sendo destruído pelas águas que inundaram a cidade de São Luiz do Paraitinga, eu confesso que vi tudo aquilo como se fora uma cena de um filme, gravado nas ruas de Pombal ao longo dos últimos 50 anos.

Aqueles 90 prédios tombados pelo patrimônio histórico estadual e o mercado publico sendo sucumbido pelas águas eram cenas que estão dentro de mim em persistentes reprises de uma fita eternamente rebobinada.

A metade da centenária igreja matriz de São Luiz de Toloza, á desabar como um castelo de areia, e uma outra igreja também centenária, a mais antiga da cidade, a Capela das Mercês, sendo atingida pela catástrofe perdendo inclusive aquele órgão a ar, do século XVIII que era desenterrado dos escombros, era para mim uma releitura de crônicas das ruas de Pombal, do tipo de quando o Sobrado de dona Jardas era destruído e catavam-se escadas, janelas e telhas no meio dos escombros, como se fora troféus ou souvenis para se colocar na mesa como peso de papel.

Um rio que invade a cidade, agonizando e reclamando o seu trajeto, soterrado pela desenfreada e irresponsável destruição das matas ciliares, são coisas que lembram a terrinha, onde os esgotos putrefatos deságuam em seu leito. Casarões centenários, também tombados pelo patrimônio histórico estadual, tombam literalmente na calada da noite para, em seu lugar, se construir um “negocio ai qualquer”. Torre de igreja desaprumada do seu nível, ameaçando cai na cabeça do povo, são males que a minha terra tem de montão e não precisamos sequer da força da natureza para ajudar a destruí-los, relegá-los ao esquecimento ou jogando por terra a história de um povo contada e escrita ao longo dos três últimos séculos.

Na minha terra as águas revoltosas são substituídas por mentes insanas, tratores barulhentos que rompem o silencio da noite e risos regados a wisk nas madrugadas, quando os algozes do patrimônio da cidade se reúnem para traçar planejarem as suas investidas, vendendo a história do povo por trinta dinheiros.

São praças desfiguradas, grupos folclóricos discriminados, tradições seculares esquecidas na gaveta do tempo onde as traças corroem até a última página da nossa historia.

O fantasma dos tropeiros que subiam a Borborema, trazendo a riqueza e a fé, que construíram a nossa cidade, talvez nunca mais faça sua imaginaria viagem, ou se o fizer, correm o risco de não mais reconhecer a cidade que ajudaram a construir, pela simples ausência dos seus ícones, mais representativos, e concluam que de nada valeu o esforço em levar e trazer a riqueza e a sabedoria que contribuiu para a construção da identidade da cidade de Pombal.

Não queremos que se faça a leitura errada de que se quer uma cidade congelada no tempo e no espaço um “universo numa casca de noz”. Não!

Toda cidade, seja nova ou antiga, tem que ter a sua identidade preservada. Alguma coisa que, ao retornar de longos êxodo, os seus filhos se reconheçam nas suas ruas. Um lugar onde se possa tirar uma foto nova que se compara com uma outra foto antiga e seja inevitável que uma lágrima caia do canto dos olhos e salte feito gota de chuva no zinco quente. É isso que se quer.

Uma rua onde se foi moleque, para se contar aos filhos e netos as histórias dos moradores esquisitos da casa da esquina, ou a casa grande de paredes altas e brancas na entrada da cidade onde se fugia dos fantasmas que assombravam nossa infância.

O povo de São Luiz do Paraitinga sabe disso e vai reconstruir a sua cidade, partindo do pouco que restou dessa catástrofe. Já o povo de Pombal, lamentavelmente não sabe disso e aos poucos vai destruindo o muito que se tem, transformando o passado da nossa cidade em uma foto amarela na parede de algum filho seu, inconformado com o poder do dinheiro que nos compra até os sonhos mais reais.


Jerdivan Nobrega de Araújo

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