sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Para que servem a geografia e o trabalho do geógrafo nos dias de hoje?

Podemos dizer que foi para servir à guerra e á alienação das pessoas que surgiu a geografia moderna, na Alemanha do século XIX, voltada para a formação de um estado poderoso que conseguisse rivalizar com a Inglaterra e a França.

Mas a geografia foi remodelada, redesenhada em seus contornos, sendo que hoje existem preocupações mais humanas, sociais, voltadas para a busca holística da compreensão das coisas, dos fatos, das formas como os homens constroem seus espaços, como se relacionam com a natureza.

A geografia e o trabalho do geógrafo devem estar intercalados com o compromisso com o desenvolvimento da sociedade, com o planejamento e gestão do meio ambiente, pois a natureza não suporta mais a forma como a intervenção vem sendo feita.

A natureza protesta cotidianamente e cabe ao geógrafo estudar e alertar sobre a melhor forma de como esse protesto não deve ser soado de forma insistente, evitando impactos ambientais irreversíveis e calamitosos. A natureza segue o princípio da física de que toda ação corresponderá reação igual e em sentido contrário, prova disso talvez encontremos na relação entre devastação na Amazônia e a catástrofe da inundação que houve em Nova Orleans, ou então entre explosões atômicas na Índia e no Paquistão e o terremoto no fundo do mar que originou a tsunami que inundou boa parte da costa do sudeste asiático, tendo chegado até a África, matando mais de cem pessoas na Somália.

A geografia e o trabalho do geógrafo devem ser voltados para a formação de novas consciências, novos paradigmas, cujos princípios devem nortear as bases do comportamento humano, livres de infrações violentas contra os semelhantes, fomento de injustiças sociais, bem como de alterações profundas no meio ambiente, cujos impactos recrudescem as incertezas quanto à permanência da vida em um planeta seriamente ameaçado, sobretudo quando o capitalismo e o capital globalizado ditam de forma draconiana regras e leis que no futuro irão redundar em calamidades inenarráveis.

A geografia e o trabalho do geógrafo devem ser desprendidos, sempre voltados para o bem-estar do próximo, para a luta por um mundo melhor, assim como fez Josué de Castro em sua batalha fabulosa em prol de um mundo sem fome e em paz, como fez Milton Santos, ao estudar e denunciar o espaço como lócus das injustiças sociais, como lócus da reprodução das relações sociais de produção.

Geografia deve rimar com justiça, com solidariedade, com amor, nunca com guerras, alienação ou ocultação de realidades. A geografia e o trabalho do geógrafo devem estar em consonância com a realidade de cada lugar, sempre mostrando causas e conseqüências, as condições de existência negadas ao longo da evolução do pensamento geográfico, apenas percebido a partir da década de setenta do século passado.

Antes do advento da geografia crítica, o conhecimento geográfico era algo sem a menor serventia, a não ser para a manutenção das estruturas de poder, para a efetivação dos interesses do capital, quando a geografia teorético-quantitativa ganhou status impecável para os interesses do planejamento público e privado, para os interesses do capital transnacional que na época, em meados da década de cinquenta, começava a migrar para o terceiro mundo e precisava de reconhecimento espacial em moldes matemático-estatísticos.

A geografia é a única ciência que pode responder às indagações quanto ao futuro da humanidade, do planeta terra, da biodiversidade, pois ao analisar de forma combinada o social e o físico permite visão panorâmica sobre os desafios lançados pelo atual estágio alcançado pelo desenvolvimento técnico, e, para tanto, cabe ao geógrafo prescrever e buscar ordenar de forma racional os rumos trilhados pela humanidade.


José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.

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