Em “A face de Deus é vespas”, a
senhora escreve: “Queremos ser felizes como os flagelados da cheia, que
perderam tudo/ e dizem-se um aos outros nos alojamentos: ‘Graças a Deus,
podia ser pior’”. A qual imagem a tragédia ambiental de Rio Doce a
remete?
Cataclismos funcionam às vezes como purgativos. O de Mariana,
somado ao turbilhão de horrores que presenciamos diuturnamente no Brasil e no
mundo, soam para mim como anúncios de uma calamidade maior (a lama do Rio Doce
é simbólica). O silêncio que sucede aos desastres, quem sabe, nos fará ouvir.
Ouvir o quê? A resposta, ou ao menos a pergunta pelo sentido da vida. Não vejo
sinais para otimismo, a não ser o que a fé oferece quando convoca a esperança
no auxílio divino. Em meio a tanta treva, aguardo um renascimento na política,
na igreja — como no tempo de São Francisco — de quem ele foi o
grande arauto. Foi horrível a capa do “Charlie Hebdo”. O que
quiseram dizer com um corpo furado de balas que vertia champagne? Não é
voltando imediatamente a restaurantes e cafés e dizendo “não temos
medo” que responderemos ao fogo. Agora somos chamados a um recolhimento,
a um silêncio que nos permita ouvir atentamente, encontrar e admitir nossa
culpa. Há necessidade de oração, conversão, volta evangélica para a vida
interior, para valores esquecidos, desaparecendo sob lama, sangue e cinza. Uma
comoção maior, que não se acabe com flores e velas sobre os cadáveres e
fotografias sentimentais sobre filas de refugiados. Não sei o que fazer. Só uma
certeza me acode: devo começar em meu coração, dentro da minha casa, a radical
mudança para o amor, o perdão, a tolerância, para a atenção real para o meu
próximo, o que, segundo Jesus, resume a lei e os profetas.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/cultura/livros/lirica-biblica-existencial-aos-80-adelia-prado-reflete-sobre-mundo-18164825#ixzz3t58Sbrp0
Sugestão de postagem de Marisa Bello
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