quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Saiba morrer o que viver não soube

Meu ser evaporei na lida insana
do tropel de paixões que me arrastava.
Ah! Cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
em mim quase imortal a essência humana.
De que inúmeros sóis a mente ufana
existência falaz me não dourava!
Mas eis sucumbe Natureza escrava
ao mal, que a vida em sua origem dana.
Prazeres, sócios meus e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta e si não coube,
no abismo vos sumiu dos desenganos.
Deus, ó Deus!... Quando a morte à luz me roube
ganhe um momento o que perderam anos
saiba morrer o que viver não soube.


Bocage
 
*Leia: Saiba descer o que subir não soube - paródia de Olavo Bilac

Saiba descer o que subir não soube

Meus dias consumir de terra em terra,
em banquetes com reis todos os dias;
comigo a pança encheu também Tobias
na Alemanha, na França, na Inglaterra...
Oh! secretário que tão bem comias!
Não sejas mole: dente agudo ferra
na própria língua, que ainda agora encerra
o chorume daquelas iguarias!
Marinhas
(1), meu nego, se tu visses
o que de bom nesta barriga coube,
é impossível que ao pranto resistisses.
Quando o Rio a Petrópolis me roube
(2)
desça o trem com finas gulodices,
saiba descer o que subir não soube!

(1) - Conselheiro Marinhas, amigo íntimo do presidente Campos Sales
(2) - Crítica às freqüentes viagens do Presidente Campos Sales a Petrópolis,
       durante o verão.

 Olavo Bilac

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