Eu tenho uma amiga que, todos os anos, me enviava um belo cartão de Natal, às
vezes desenhado por ela. Este ano, em vez de cartão, chegou uma gentil mensagem
eletrônica. Eu entendo, ficou mais fácil. E dessa maneira, você manda para
quantas pessoas quiser. Mas não há comparação entre um cartão (que você custa a
jogar fora) e uma mensagem eletrônica.
Isso ainda é mais verdade para essa maravilhosa forma de comunicação que é a
carta. É difícil imaginar o que a carta representa na história da humanidade.
Primeiro, como laço afetivo. Certo, pode-se pôr sentimento numa mensagem
eletrônica. Mas ela tem um caráter menos pessoal que uma carta.
Recebendo a carta, você sabia que era só para você. Que uma determinada
pessoa, num cantinho do universo, sentou-se numa mesa, escolheu papel, uma
caneta, e começou a escrever para você. A emoção podia começar na caixa do
correio — pelo formato do envelope, pela letra que você conhecia.
Isso pelo lado afetivo. Havia outro, enorme: a carta como documento
histórico, ou literário, ou sociológico.
Aqui no Brasil, começou com a carta de Pero Vaz, o primeiro documento da
nacionalidade. Pouquíssimo tempo depois, as cartas do padre Manoel da Nóbrega
prestam informações preciosas sobre um país recém-nascido.
Não há nenhuma certeza de que as pessoas vão guardar e-mails. É uma coisa
mais precária, e a própria pressa da vida moderna conspira contra isso. Assim,
talvez deixem de se repetir coisas como:
1) As cartas de São Paulo, básicas para a história do cristianismo.
2) Dois conjuntos de cartas romanas: as de Cícero e as de Sêneca, que,
sozinhas, garantiriam um conhecimento quase íntimo de uma época grandiosa. As de
Cícero, mais pictóricas, tecidas com as histórias do dia a dia. As de Sêneca, o
retrato de um filósofo que foi o Montaigne dos romanos.
3) As cartas de Fénelon. Esse grande bispo francês foi um incomparável
diretor de consciências na França de Luís XIV. Sua correspondência é uma
combinação única de beleza literária e finura espiritual.
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Luiz Paulo Horta
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