(...) Mas justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e
manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito das
partes, e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade.
Os juízes tardinheiros são culpados, que a lassidão comum vai tolerando. Mas
sua culpa tresdobra com a terrível agravante de que o lesado não tem meio de
reagir contra o delinqüente poderoso, em cujas mãos jaz a sorte do litígio
pendente.
Nas sejais, pois, desses magistrados, nas mãos de quem os autos penam como as
almas do purgatório, ou arrastam sonos esquecidos como as preguiças do mato.
(...) Não acompanheis os que, no pretório, ou no júri, se convertem de
julgadores em verdugos, torturando o réu com severidades inoportunas,
descabidas, ou indecentes; como se todos os acusados não tivessem direito à
proteção dos seus juízes, e a lei processual, em todo o mundo civilizado, não
houvesse por sagrado o homem, sobre quem recai acusação ainda inverificada.
Não estejais com os que agravam o rigor das leis, para se acreditar com o
nome de austeros e ilibados. Porque não há nada menos nobre e aplausível que
agenciar uma reputação malignamente obtida em prejuízo da verdadeira
inteligência dos textos legais.
Não julgueis por considerações de pessoas, ou pelas do valor das quantias
litigadas, negando as somas, que se pleiteiam, em razão da sua grandeza, ou
escolhendo, entre as partes na lide, segundo a situação social delas, seu
poderio, opulência e conspicuidade.
Porque quanto mais armados estão de tais armas os poderosos, mais inclinados
é de recear que sejam à extorsão contra os menos ajudados da fortuna; e, por
outro lado, quanto maiores são os valores demandados e maior, portanto, a lesão
argüida, mais grave iniqüidade será negar a reparação, que se demanda.
Não vos mistureis com os togados, que contraíram a doença de achar sempre
razão ao Estado, ao Governo, à Fazenda; por onde os condecora o povo com o
título de "fazendeiros". Essa presunção de terem, de ordinário, razão contra o
resto do mundo, nenhuma lei a reconhece à Fazenda, ao Governo, ou ao Estado.
Antes, se admissível fosse aí qualquer presunção, havia de ser em sentido
contrário; pois essas entidades são as mais irresponsáveis, as que mais abundam
em meios de corromper, as que exercem as perseguições, administrativas,
políticas e policiais, as que, demitindo funcionários indemissíveis, rasgando
contratos solenes, consumando lesões de toda a ordem (por não serem os
perpetradores de tais atentados os que os pagam), acumulam, continuamente, sobre
o tesouro público terríveis responsabilidades.
Ruy Barbosa de Oliveira, jurista, político, diplomata,
escritor, filólogo, tradutor e orador brasileiro.
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