Muitos advogados japoneses estão vivendo na pobreza. Ou buscando trabalhos fora da profissão para sobreviver.
E, segundo os advogados, a culpa da crise recai nas autoridades
governamentais que, em 2001, sonharam com um sistema jurídico dinâmico,
como o dos EUA.
Como primeira providência, um conselho governamental elaborou um plano
para elevar o número de advogados, promotores e juízes, então em torno
de 20 mil, para 50 mil, em 2018. O governo criou cursos de Direito de
três anos, copiando o sistema americano.
O plano deu certo. O número de profissionais de Direito no Japão saltou
de pouco mais de 17 mil, em 2000, para cerca de 37 mil, em 2015, de
acordo com o The Wall Street Journal e o Jornal da ABA (American Bar
Association).
Mas surgiu um problema: não há demanda para tantos advogados, promotores e juízes no país. Por
exemplo, o índice de criminalidade no Japão está mais baixo do que
nunca — está muito longe do modelo americano. Há falta de crimes para
tantos advogados, promotores e juízes.
Em outras áreas as coisas também não vão bem. Por exemplo, o número
de falências também é baixo e, em vez de crescer, está baixando. O
número de ações civis, protocoladas a cada ano, não se altera há mais de
uma década. Contenciosos entre empresas ou entre consumidores e empresas são muito mais raros que nos EUA.
“Litígios entre pessoas também são raros, porque os japoneses são
pouco litigiosos, culturalmente. Preferem resolver suas disputas por
meios informais, como através de negociações privadas entre as partes
envolvidas”, diz o advogado Shinichi Sakano.
Outro fator tem raiz cultural. Tradicionalmente rigorosos com suas
regras, os japoneses têm um Judiciário que, costumeiramente, pune as
duas partes em litígio. Esse desestímulo à judicialização de
controvérsias faz qualquer um pensar duas vezes antes de ir à Justiça.
Como está difícil para todos os advogados gerar negócios, uma seccional
da ordem veiculou um comercial de 30 segundos na TV, no estilo drama
samurai, em que um advogado, de terno e gravata, aparece no último
minuto para salvar uma jovem de um contrato fraudulento. Mas a entidade
desistiu do anúncio após um mês de veiculação, porque não estava
funcionando.
Tábua de salvação
A única área do Direito que está indo relativamente bem é a de
Família, em que há disputas tais como divórcio, custódia de filhos e
heranças. Há um número maior de disputas sobre a guarda de pessoas
idosas – um problema comum em um país em que mais de um terço da
população tem mais de 65 anos.
O advogado Shinichi Sakano, que tem uma banca em Osaka, com um sócio,
disse aos jornais que está muito difícil para a maioria dos advogados
sobreviver — e até mesmo para pagar as contas.
Entre os advogados que estão trabalhando regularmente, a renda média
caiu para 9 milhões de ienes (286.805 reais) por ano, o que é pouco em
um país caro como o Japão (em comparação com os EUA). Em 2006, a renda
média era de 17,5 milhões de ienes.
Tradicionalmente, o Japão tem menos advogados que os Estados Unidos e
países da Europa. A diferença se manteve após o plano governamental para
ampliar o número de profissionais de Direito:
Número de advogados por 100 mil habitantes em 2015
Estados Unidos: 377
Reino Unido: 240
Alemanha: 202
França: 91
Japão: 29
Há outros “problemas” que tornam a probabilidade das pessoas buscarem a
Justiça no Japão muito menor que nos EUA. Um deles é que as indenizações
por danos são muito mais baixas no Japão, tanto para demandantes como
para advogados.
No Japão também não existe o sistema do honorário de sucumbência, pelo
qual o advogado só recebe alguma coisa (uma percentagem da causa) se for
vencedor, em um processo de indenização por danos. É um sistema bem
popular nos EUA, principalmente entre os advogados que especializam em
danos por acidente ou imperícia médica.
Não existe também um mecanismo jurídico que permita a formação de ações
coletivas. E, porque o sistema japonês é baseado no europeu, também não
existe o conceito de “discovery”, que permite a cada parte requisitar
informações, documentos e provas da outra parte. Isso dificulta, por
exemplo, obter provas incriminatórias de uma grande corporação.
Mas a situação vai melhorar em alguns anos, disse aos jornais o
ex-presidente do Tribunal Superior de Hiroshima, Kozo Fujita. Os
estudantes estão perdendo interesse nos cursos de Direito. O problema é
que o sistema “está perdendo mentes brilhantes para outras carreiras
profissionais”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário