Eu me emociono facilmente. Mas isso não tira o mérito do Sabino que
procurava um tema pitoresco ou irrisório no cotidiano das pessoas para
escrever "A ultima crônica" e coroar mais um ano desse exercício.
Faltava-lhe inspiração e a caminho de casa, até para adiar o momento de
sentar e escrever, entrou num botequim da Gávea para tomar um café junto
ao balcão. A falta de inspiração o assustava. Foi quando um negro
magrinho acompanhado da mulher e filha de fita cor de rosa espetada no
cabelo encaracolado, entraram no estabelecimento e foram sentar
silenciosamente no fundo à mesa ao lado da parede espelhada. A garotinha
com seu vestido branco e pobre estava visivelmente tensa. Prestava
atenção a tudo. Sentada, suas perninhas não alcançavam o chão, mas
também não balançavam. O pai discretamente tira do bolso algumas notas
de dinheiro e confere. Ao garçom fez o pedido apontando para o balcão
que em seguida levou um pratinho com uma única pequena fatia de bolo
amarelo, e uma Coca-Cola. Os três pareciam hipnotizados com a fatia
recém chegada, quando a mãe quebrando a hipnose procura aflita alguma
coisa na bolsa que estava no colo. Retira três pequenas velas brancas e
as coloca na fatia do bolo. O pai se apressa a riscar um fósforo e
acendeu-as. A garotinha, com o queixo na altura do mármore cinza da
mesa, assopra apagando de pronto. Bate palpa, e balbucia algo que os
pais acompanham: "Parabéns a você..."A mãe sorrindo com a alegria da
filha pega as velas de volta e guarda na bolsa. A menina com as duas
mãos pega a fatia de bolo. O pai que até aquele momento não havia se
dado conta do olhar do Sabino, ao cruzarem os olhos, tentou abaixa-los,
mas resolveu encarar, e em seguida abriu um largo sorriso.Termina a
crônica dizendo que era assim que gostaria que fosse a ultima crônica:
que fosse pura como aquele sorriso. E eu me emocionei.
Eduardo P. Lunardelli
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