Na inflamada discussão pautada pela PEC em prol da redução da maioridade penal, uma figura deveria ser a central: o adolescente em conflito com a lei. Mas será mesmo que é dele que estamos falando? Especialistas reunidos em São Paulo em um debate organizado pelo Ministério Público e pela Defensoria de São Paulo e instituições civis, acreditam que não. Em meio ao afã popular de reduzir a criminalidade, quem anda aparecendo mais é o adolescente em conflito com a sociedade. Ou melhor: a sociedade em conflito com o adolescente.
O encontro, aberto ao público, foi convocado com o intuito de reunir experts em saúde, violência, justiça e educação para analisar os possíveis impactos da responsabilização penal aos 16 anos – e não aos 18, como acontece hoje no Brasil e na maior parte do mundo. Todos os participantes se alinharam contra a redução da maioridade penal, e, de acordo com as palavras do procurador geral de justiça de São Paulo, Marcio Elias Rosa, que presidiu os trabalhos, acreditam que a PEC 171/93 “não se justifica sob nenhum aspecto”.
Em cada área de conhecimento, profissionais e acadêmicos deram seu aporte para elucidar essa ideia, mas concluíram que nenhuma ciência é capaz de dar respostas absolutas e que a saída para o atual embate será uma construção coletiva. A questão, eles dizem, é como queremos tratar os nossos jovens. “Não é cabível lançar essa pergunta [se a idade deve baixar] à ciência, porque a responsabilidade pelos próprios atos é uma decisão social”, afirmou o psiquiatra Daniel Martins de Barros, coordenador do Núcleo de Psiquiatria Forense do Hospital das Clínicas. Em sua fala, Daniel de Barros expôs os estágios do desenvolvimento cerebral humano e explicou que a região frontal do cérebro – a responsável pelo autocontrole e a projeção de futuro – é a última a ficar pronta. “Esse amadurecimento só se dá no início da idade adulta, por volta dos 18, 20 anos”, explicou. Por essa razão, a maioridade penal costuma ser fixada em 18 anos, já que o ser humano “não só deve ser consciente do que faz, ele também precisa ter autocontrole”.
Para o sociólogo Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do Conselho de Administração do Fórum de Segurança Pública e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Fundação Getúlio Vargas, a questão é muito mais complexa, porque “vivemos atualmente uma enorme disputa por narrativas” – ou seja, modos de enxergar e conduzir as coisas. De um lado, Renato sinaliza a falha de um “Estado extremamente ineficiente em garantir a vida” e, de outro, uma “narrativa extremamente punitivista” de uma população que quer se livrar do crime procurando a quem culpar. “A violência nos levou a um modelo de enfrentamento que não se mostra eficiente. E agora queremos aplicar o mesmo remédio para diminuir a criminalidade entre os jovens?”, questiona. Se a maioridade penal for reduzida, na visão do especialista, o destino dos jovens infratores passará às mãos da polícia. “Nossa sociedade dotou de protagonismo uma instituição que, na prática, é a responsável pelo combate aos crimes, como se fossem heróis. É a polícia quem faz as prisões em flagrante, que no Brasil determina a investigação criminal. Na prática, o que está em debate é como o Estado está deixando a PM atuar em seu lugar”. Com o nível de truculência de uma polícia que é considerada das mais violentas do mundo, há muito o que temer.
Em cada área de conhecimento, profissionais e acadêmicos deram seu aporte para elucidar essa ideia, mas concluíram que nenhuma ciência é capaz de dar respostas absolutas e que a saída para o atual embate será uma construção coletiva. A questão, eles dizem, é como queremos tratar os nossos jovens. “Não é cabível lançar essa pergunta [se a idade deve baixar] à ciência, porque a responsabilidade pelos próprios atos é uma decisão social”, afirmou o psiquiatra Daniel Martins de Barros, coordenador do Núcleo de Psiquiatria Forense do Hospital das Clínicas. Em sua fala, Daniel de Barros expôs os estágios do desenvolvimento cerebral humano e explicou que a região frontal do cérebro – a responsável pelo autocontrole e a projeção de futuro – é a última a ficar pronta. “Esse amadurecimento só se dá no início da idade adulta, por volta dos 18, 20 anos”, explicou. Por essa razão, a maioridade penal costuma ser fixada em 18 anos, já que o ser humano “não só deve ser consciente do que faz, ele também precisa ter autocontrole”.
Para o sociólogo Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do Conselho de Administração do Fórum de Segurança Pública e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Fundação Getúlio Vargas, a questão é muito mais complexa, porque “vivemos atualmente uma enorme disputa por narrativas” – ou seja, modos de enxergar e conduzir as coisas. De um lado, Renato sinaliza a falha de um “Estado extremamente ineficiente em garantir a vida” e, de outro, uma “narrativa extremamente punitivista” de uma população que quer se livrar do crime procurando a quem culpar. “A violência nos levou a um modelo de enfrentamento que não se mostra eficiente. E agora queremos aplicar o mesmo remédio para diminuir a criminalidade entre os jovens?”, questiona. Se a maioridade penal for reduzida, na visão do especialista, o destino dos jovens infratores passará às mãos da polícia. “Nossa sociedade dotou de protagonismo uma instituição que, na prática, é a responsável pelo combate aos crimes, como se fossem heróis. É a polícia quem faz as prisões em flagrante, que no Brasil determina a investigação criminal. Na prática, o que está em debate é como o Estado está deixando a PM atuar em seu lugar”. Com o nível de truculência de uma polícia que é considerada das mais violentas do mundo, há muito o que temer.
No desfecho do encontro, o procurador Jefferson Aparecido Dias, membro da Red de Niñez y Adolescencia da Federación Iberoamericana del Ombudsman, trouxe à tona o exemplo vivido pelo Uruguai em relação à redução da maioridade penal no ano passado. “Assim como no Brasil, a sociedade uruguaia era amplamente a favor da redução. Foi proposto um plebiscito, do qual se esperava apenas a confirmação dessa visão, mas que, depois de uma campanha de esclarecimento sobre os possíveis efeitos da medida, terminou pendendo fortemente para o lado do não”. Para ele, assim como os demais, há esperança de deslocar a energia que está sendo gasta com a PEC 171/93 para “outros e mais urgentes” debates.
Por C. M., EL PAÍS
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