segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Certas esperanças



É preciso — é mais do que preciso, é forçoso — dar boas festas, trocar embrulhinhos, querer mais intensamente, oferecer com mais prodigalidade, manter o sorriso e, acima de tudo, esquecer tristezas e saudades.

Façamos um supremo esforço para lembrar e sermos lembrados, porque assim manda a tradição e é difícil esquecer à tradição. Enviemos cartões e telegramas de felicitações àqueles que amamos e também àqueles que — sabemos perfeitamente — não gostam da gente. O Correio, nesta época do ano, finge-se de eficiente e já lá tem prontos impressos para que desejemos coisas boas aos outros, nivelando a todos em nossos augúrios.

Depois de abraçar e ser abraçado, desejar sincera e indiferentemente, embrulhar e desembrulhar presentes, cada um poderá fazer votos a si mesmo, desejar para si o que bem entender. Subindo na escala das idades, este sonhou todo o mês com um trenzinho elétrico, aquele com uma bicicleta (com farol e tudo), o outro certa moça, mais além um quarto sonhador esteve a remoer a idéia de ser ministro e o rico... bem, o rico só pensa em ser mais rico. O rico detesta amistosamente os ministros, já não tem olhos para a graça da moça, pernas para pedalar uma bicicleta e, muito menos, tempo para brincar com um trenzinho.
Dos planos de cada um, pouquíssimos serão transformados em realidade. Alguns hão de abandoná-los por desleixo e a maioria, mal o ano de 56 começar, não pensará mais nele, por pura desesperança. O melhor, portanto, é não fazer planos. Desejar somente, posto que isso sim, é humano e acalentador.

De minha parte estou disposto a esquecer todas as passadas amarguras, tudo que o destino me arranjou de ruim neste ano que finda. Ficarei somente com as lembranças do que me foi grato e me foi bom.

No mais, desejarei ficar como estou porque, se não é o que há de melhor, também não é tão ruim assim e, tudo somado, ficaram gratas alegrias. Que Deus me proporcione as coisas que sempre me foram gratas e que — Ele sabe — não chegam a fazer de mim um ambicioso.

Que não me falte aquele almoço honesto dos sábados (único almoço comível na semana), com aquele feijão que só a negra Almira sabe fazer; que não me falte o arroz e a cerveja — é muito importante a cerveja, meu Deus! —, como é importante manter em dia o ordenado da Almira.
Se não me for dado comparecer às grandes noites de gala, que fazer? Resta-me o melhor, afinal, que é esticar de vez em quando por aí, transformando em festa uma noite que poderia ser de sono.E para os pequenos gostos pessoais, que me reste sensibilidade bastante para entretê-las. Ai de mim se começo a não achar mais graça nos pequenos gostos pessoais. Que o perfume do sabonete, no banho matinal, seja sempre violeta; que haja um cigarro forte para depois do café; uma camisa limpa para vestir; um terno que pode não ser novo, mas que também não esteja amarrotado. Uma vez ou outra, acredito que não me fará mal um filme da Lollobrigida, nem um uísque com gelo ou — digamos — uma valsa.

Nada de coisas impossíveis para que a vida possa ser mais bem vivida. Apenas uma praia para janeiro, uma fantasia para fevereiro, um conhaque para junho, um livro para agosto e as mesmas vontades para dezembro.

No mais, continuarei a manter certas esperanças inconfessáveis porém passíveis — e quanto — de acontecerem.
 
 
Stanislaw Ponte Preta

 

A crônica acima foi publicada na Revista Manchete, nº 193, de 31.12.55


Feliz olhar novo

O grande barato da vida é olhar para trás e sentir orgulho da sua história. O grande lance é viver cada momento como se a receita de felicidade fosse o aqui e o agora.

Claro que a vida prega peças. É lógico que, por vezes, o pneu fura, chove demais..., mas, pensa só: tem graça viver sem rir de gargalhar pelo menos uma vez ao dia? Tem sentido ficar chateado durante o dia todo por causa de uma discussão na ida pro trabalho?

Quero viver bem! Este ano que passou foi um ano cheio. Foi cheio de coisas boas e realizações, mas também cheio de problemas e desilusões. Normal. As vezes a gente espera demais das pessoas. Normal. A grana que não veio, o amigo que decepcionou, o amor que acabou. Normal.
O ano que vai entrar vai ser diferente. Muda o ano, mas o homem é cheio de imperfeições, a natureza tem sua personalidade que nem sempre é a que a gente deseja, mas e aí? Fazer o quê? Acabar com o seu dia? Com seu bom humor? Com sua esperança?

O que desejo para todos é sabedoria! E que todos saibamos transformar tudo em boa experiência! Que todos consigamos perdoar o desconhecido, o mal educado. Ele passou na sua vida. Não pode ser responsável por um dia ruim... Entender o amigo que não merece nossa melhor parte. Se ele decepcionou, passe-o para a categoria 3. Ou mude-o de classe, transforme-o em colega. Além do mais, a gente, provavelmente, também já decepcionou alguém.

O nosso desejo não se realizou? Beleza, não estava na hora, não deveria ser a melhor coisa pra esse momento (me lembro sempre de um lance que eu adoro): CUIDADO COM SEUS DESEJOS, ELES PODEM SE TORNAR REALIDADE.

Chorar de dor, de solidão, de tristeza, faz parte do ser humano. Não adianta lutar contra isso. Mas se a gente se entende e permite olhar o outro e o mundo com generosidade, as coisas ficam bem diferentes.

Desejo para todo mundo esse olhar especial.

O ano que vai entrar pode ser um ano especial, muito legal, se entendermos nossas fragilidades e egoísmos e dermos a volta nisso. Somos fracos, mas podemos melhorar. Somos egoístas, mas podemos entender o outro. O ano que vai entrar pode ser o bicho, o máximo, maravilhoso, lindo, espetacular... ou... Pode ser puro orgulho! Depende de mim, de você! Pode ser. E que seja!!!

Feliz olhar novo!!! Que o ano que se inicia seja do tamanho que você fizer.

Que a virada do ano não seja somente uma data, mas um momento para repensarmos tudo o que fizemos e que desejamos, afinal sonhos e desejos podem se tornar realidade somente se fizermos jus e acreditarmos neles!"



Autor: Carlos Drummond de Andrade


O tempo não cura tudo. Aliás, o tempo não cura nada, o tempo apenas tira o incurável do centro das atenções.
 
 

Receita de ano novo


Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.



Carlos Drummond de Andrade

Vista cansada

Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa idéia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.

Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.


Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.


Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima idéia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.


Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.



Otto Lara Resende

domingo, 30 de dezembro de 2012

Hora do recreio - Vamos rir um pouco


Quarto em desordem

Na curva perigosa dos cinqüenta
derrapei neste amor. Que dor! que pétala
sensível e secreta me atormenta
e me provoca à síntese da flor

que não sabe como é feita: amor
na quinta-essência da palavra, e mudo
de natural silêncio já não cabe
em tanto gesto de colher e amar

a nuvem que de ambígua se dilui
nesse objeto mais vago do que nuvem
e mais indefeso, corpo! Corpo, corpo, corpo

verdade tão final, sede tão vária
a esse cavalo solto pela cama
a passear o peito de quem ama.
 
Carlos Drummmond de Andrade
(...)
O mundo é como um espelho que devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos e seus atos. A maneira como você encara a vida é que faz toda diferença. A vida muda, quando "você muda".
 
 

Versiculos do dia

Mas agora, libertados do pecado, e feitos servos de Deus, tendes o vosso fruto para santificação, e por fim a vida eterna.
 
Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna, por Cristo Jesus nosso Senhor.

Romanos 6:22-23
Reblogged from emma-silk

sábado, 29 de dezembro de 2012


A mulher que segue a multidão geralmente não vai além da multidão. A mulher que anda sozinha consigo mesma se encontrará em lugares que ninguém jamais esteve antes.
 
 
Albert Einstein
 

Do fundo do baú

Eu tenho uma amiga que, todos os anos, me enviava um belo cartão de Natal, às vezes desenhado por ela. Este ano, em vez de cartão, chegou uma gentil mensagem eletrônica. Eu entendo, ficou mais fácil. E dessa maneira, você manda para quantas pessoas quiser. Mas não há comparação entre um cartão (que você custa a jogar fora) e uma mensagem eletrônica.
 
Isso ainda é mais verdade para essa maravilhosa forma de comunicação que é a carta. É difícil imaginar o que a carta representa na história da humanidade. Primeiro, como laço afetivo. Certo, pode-se pôr sentimento numa mensagem eletrônica. Mas ela tem um caráter menos pessoal que uma carta.
 
Recebendo a carta, você sabia que era só para você. Que uma determinada pessoa, num cantinho do universo, sentou-se numa mesa, escolheu papel, uma caneta, e começou a escrever para você. A emoção podia começar na caixa do correio — pelo formato do envelope, pela letra que você conhecia.
 
Isso pelo lado afetivo. Havia outro, enorme: a carta como documento histórico, ou literário, ou sociológico.
 
Aqui no Brasil, começou com a carta de Pero Vaz, o primeiro documento da nacionalidade. Pouquíssimo tempo depois, as cartas do padre Manoel da Nóbrega prestam informações preciosas sobre um país recém-nascido.
 
Não há nenhuma certeza de que as pessoas vão guardar e-mails. É uma coisa mais precária, e a própria pressa da vida moderna conspira contra isso. Assim, talvez deixem de se repetir coisas como:
 
1) As cartas de São Paulo, básicas para a história do cristianismo.
 
2) Dois conjuntos de cartas romanas: as de Cícero e as de Sêneca, que, sozinhas, garantiriam um conhecimento quase íntimo de uma época grandiosa. As de Cícero, mais pictóricas, tecidas com as histórias do dia a dia. As de Sêneca, o retrato de um filósofo que foi o Montaigne dos romanos.
 
3) As cartas de Fénelon. Esse grande bispo francês foi um incomparável diretor de consciências na França de Luís XIV. Sua correspondência é uma combinação única de beleza literária e finura espiritual.
 
 
Leia a íntegra clicando aqui
 
Luiz Paulo Horta

Um golpe de mestre

O ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal, pode ter vários defeitos, mas de bobo ele não tem nada. Com a decisão de negar-se a decretar a prisão imediata dos condenados no julgamento do mensalão, ele consegue, de uma tacada só, atingir seis objetivos:
 
1. Esvazia (ainda que em aparência) o discurso de parcialidade do julgamento, exaustivamente repetido pelos críticos da condenação;
 
2. Reafirma a credibilidade do STF junto à opinião pública, pois se ele deixasse a decisão para qualquer outro ministro (ou mesmo para o plenário) choveriam críticas em caso da ausência de decretação imediata da prisão (como “herói nacional”, Barbosa é o único ministro do Supremo acima do bem ou do mal; isso é fato, ainda que não seja salutar para as instituições);
 
3. Impede uma crise institucional mais séria, que já se desenhava nos últimos dias, com ameaças de cassação de ministro do STF, por parte do presidente da Câmara, e de processo por prevaricação de deputado, por parte de ministros do Supremo;
 
4. Não se arrisca à utilização da prisão imediata como jogada de mídia por parte dos acusados (publicou-se, há alguns dias, que alguns dos acusados, se presos, exigiriam ser algemados e fotografados, em óbvia vitimização);
 
5. Impede o desgaste de — uma vez mais — ser obrigado a justificar eventual mudança jurisprudencial do STF;
 
6. Deixa o problema da questão dos mandatos dos parlamentares nas mãos do Congresso.
Negar a prisão, nesse momento, significa rejeitar a execução imediata da decisão condenatória do STF. Assim, a cassação efetiva dos mandatos também só se dará após o trânsito em julgado do acórdão (ou seja, depois de interpostos os recursos — embargos declaratórios — por parte dos condenados).
 
Ou seja, até lá o desgaste de ter membros condenados por corrupção passiva, peculato e formação de quadrilha é do Congresso.
 
E o STF ainda pode tripudiar: “Se vocês acham que a competência para cassar é de vocês, por que não promovem (ou tentam promover, já que a votação é secreta) a cassação dos parlamentares condenados, nos termos regimentais? Ou preferem assistir passivamente à atuação, em plenário e em comissões (como a de Constituição e Justiça), de congressistas condenados criminalmente por corrupção, peculato etc...?”
 
Qualquer pessoa pode expressar restrições pontuais à atuação do ministro Barbosa (inclusive sobre sua conduta no caso do mensalão, embora tais restrições não correspondam, por evidente, a acreditar na inocência dos acusados).
 
Sua postura, em julgamentos passados, mostrou-se, por diversas vezes, excessivamente draconiana e parece óbvio que a convivência com ele, em plenário e fora dele, deve ser dificílima.
 
Mas essa decisão, independentemente do mérito da condenação (até porque, nesse aspecto, Inês já é morta, velada e enterrada, ou seja, o caso está encerrado), foi, antes de tudo, uma prova de inteligência. Verdadeiro golpe de mestre.
 
Otávio Bravo é promotor de Justiça e professor de Direito Penal e de Direito Internacional da PUC-Rio

Fonte: O Globo

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Sucesso de 1971 - There's No More Corn On The Brasos


Sentir culpa deixa o chocolate mais gostoso

Tem aquele sabor extra de coisa errada ou proibida, sabe? Aí fica irresistível.
 
Pesquisadores da Northwestern University fizeram o teste com 40 mulheres. Eles as dividiram em dois grupos: um teria de ler uma revista sobre dieta e saúde (daquele tipo “como manter seu corpo em forma”, ou “elimine as gordurinhas”) e o outro leu revistas que nada tinham a ver com o bem-estar. Depois ganharam e comeram uma barra de chocolate.
 
E adivinha quem se deliciou mais com a refeição? O pessoal que tinha acabado de ver imagens de homens e mulheres saradas – com matérias sobre como se tornar um deles. Elas gostavam quase 20% mais dos doces do que as outras mulheres. O sentimento de culpa, por comer algo que pode engordar, deixou o chocolate bem mais gostoso.
 
O único problema é que isso serve para outras coisas um pouco mais prejudiciais à saúde, como álcool e cigarro.
 
Fonte: Superinteressante

Cuidado com a sua vida moderna.


Reblogged from emeriemichelle

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Coração leviano



Sugestão de postagem do amigo e professor Sebastião Formiga

Fragmentos teóricos sobre a crônica

A crônica consiste num gênero textual em que se faz uma reflexão pessoal sobre acontecimentos pitorescos do cotidiano. Ela não se limita à mera reprodução de fatos, mas vai além, mostrando ângulos não percebidos. É fragmentária, pois não tem a pretensão de abordar o fato como um todo, mas apenas alguns detalhes significativos. Esse gênero, na maioria das vezes, é um texto curto e rápido, escrito quase sempre numa linguagem comum ou familiar.
 
“Conforme Coutinho e Souza, o fato, que é em geral um fim para o jornalista, para o cronista é um pretexto para divagações, comentários e reflexões. É um gênero textual altamente pessoal, uma reação individual e íntima diante da vida, das coisas ou dos seres (2001, p. 562-563). Num estilo leve, o cronista pode tratar de problemas sociais, de fraquezas humanas, de fatos ocorridos na sociedade, de uma notícia marcante, de um filme, de uma viagem, entre outros temas.
 
“Geralmente, a crônica aborda fatos do dia a dia, ao primeiro olhar, sem importância. Para Martins e Saito (2006), o cronista faz com que esses fatos banais sejam significativos, na medida em que mostra ‘a grandeza’ escondida neles.
 
“Uma das marcas desse gênero é abarcar o comentário do fato jornalístico, a ficção, a ironia, o humor diante da sociedade e a defesa de idéias, tendo sempre um olhar crítico e inesperado. A crônica tem uma estrutura livre, e pode valer-se do diálogo, do monólogo, da entrevista, da resenha e de personagens reais ou fictícios.
 
“Esse gênero pode apresentar tipologia textual de base narrativa, dissertativa, entre outras, dependendo da intenção do autor. A crônica com tipologia de base narrativa possui poucas personagens, e as referências espaciais e temporais são limitadas: as ações ocorrem num único espaço, e o tempo normalmente corresponde a alguns minutos ou algumas horas. Segundo costa, quando a crônica é ‘predominantemente narrativa, possui trama quase sempre pouco definida, sem conflitos densos, personagens de pouca densidade psicológica, o que a diferencia do conto’ (2009, p. 80).
 
“A crônica com tipologia textual de base narrativa admite o narrador em primeira pessoa, participando dos acontecimentos, ou em terceira pessoa do discurso, observando os fatos. Conforme Costa, a crônica busca aproximar o enunciador do leitor pelo uso freqüente do discurso indireto livre e de perguntas retóricas (2009, p. 81). O discurso indireto livre ocorre quando há fusão entre personagem e narrador, pois, entremeando a narrativa, aparecem diálogos indiretos da personagem, que complementam a fala do narrador. Por sua vez, as perguntas retóricas estão presentes quando o narrador propõe ao leitor questionamentos sem esperar uma resposta, com a intenção de levá-lo a pensar sobre o assunto.”
 
(...)
 
“Há dois tipos de crônica, a literária e a não literária; ambas são construídas a partir de dados da realidade. A crônica literária pertence à ordem do narrar e a não literária, à ordem do relatar.
 
“Na crônica literária, o cronista transforma os elementos objetivos em estéticos a partir de sua liberdade e capacidade imaginativa. Reinventa o real pelo uso particular das palavras, através do emprego da linguagem conotativa e subjetiva, deixando transparecer suas emoções e desvelando poeticamente o instante. A linguagem conotativa refere-se ao significado que certas palavras e expressões assumem, modificando seu sentido literal, e a linguagem subjetiva mostra a visão pessoal do indivíduo e sua reação emotiva frente a algo. De acordo com Soares, enquanto literatura, a crônica atravessa o tempo por ser um registro poético e, muitas vezes, irônico, que capta o imaginário coletivo em suas manifestações cotidianas, perpetuando-o ( 1997, p. 64).
 
“Já na crônica não literária, o autor vale-se da realidade objetiva, com seus dados passíveis de comprovação. Para que sua intenção seja comunicada, usa sobretudo a linguagem denotativa e objetiva. Conforme Machado, a crônica não é propriamente uma notícia, mas um artigo sobre a notícia (1994, p. 240). Entre as crônicas não literárias, as mais comuns são a crônica jornalística, policial, esportiva, política, social e de moda.
 
(...)
 
“Moisés coloca que, na Idade Média, após o século XII, a crônica voltou-se para a perspectiva histórica, o que determinou umas distinção: havia obras que narravam os acontecimentos detalhadamente, com algumas explicações; outras os apresentavam numa perspectiva individual da história, como ocorre nas obras de Fernão Lopes (séc. XIV). O autor diz que existiam, além disso, os cronições, também chamados de crônicas breves, que constituíam notações simples e impessoais sobre o cotidiano (2004, p. 110).
 
“Ainda conforme Moisés, no século XVI, o termo crônica foi substituído por história. A partir do século XIX, o vocábulo foi utilizado para designar textos que tinham pouca relação com o primeiro tipo de crônica e que assumiram estrita personalidade literária. Essa forma de crônica teria sido produzida inicialmente pelo francês Julien-Louis Geoffroy, por volta de 1800, e publicade no Journal des Débats (2004, p. 110).
 
“No Brasil a crônica surgiu há uns 150 anos, com o Romantismo e o desenvolvimento da imprensa, e é considerada um dos mais antigos gêneros jornalísticos. A princípio foi designada pelo nome de folhetim.
 
(...)

 
Sintetizando
A crônica:
Quadrado pequeno pretoconsiste numa produção breve sobre um fato do cotidiano;
Quadrado pequeno pretoenvolve dados da realidade;
Quadrado pequeno pretopretende refletir e/ou divertir;
Quadrado pequeno pretocapta os aspectos singulares do fato e mostra ângulos não percebidos;
Quadrado pequeno pretoé um texto leve, escrito de forma pessoal;
Quadrado pequeno pretopossui estrutura livre;
Quadrado pequeno pretoemprega a linguagem comum ou familiar;
Quadrado pequeno pretoutiliza narrador em primeira ou terceira pessoa do discurso;
Quadrado pequeno pretopode ser literária ou não literária.”
 
 
VANILDA SALTON KÖCHE (et al.)
 
(KÖCHE, Vanilda Salton, MARINELLO, Adiane Fogali, BOFF, Odete Maria Benetti. Crônica. In: ___. Estudo e produção de textos: gêneros textuais do relatar, narrar e descrever. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012, p. 69-72.)
 
 
*Sugestão e indicação de postagem do amigo Adauto Neto

Fábula

Certo dia, enquanto brincava com um vaso muito valioso, um garotinho colocou a mão dentro dele e não conseguiu tirá-la. Seu pai tentou ajudá-lo, mas não obteve êxito. Eles já estavam pensando em quebrar o vaso quando o pai disse:
- Vamos, meu filho, faça mais uma tentativa. Abra a mão, estique os dedos da maneira como estou fazendo e puxe-a com força.

Para sua surpresa, o garotinho disse:
- Não posso, papai. Se eu esticar os dedos, minha moeda vai cair dentro do vaso.

Sorria, se você quiser... quase todos nós somos iguais a esse garotinho, tão apegados às pequenas coisas do mundo que não podemos aceitar a libertação. Peço que você solte aquela pequena moeda que está dentro de seu coração. Renda-se! Solte-a e permita que Deus conduza a sua vida.


                                       Billy Graham

Nosso Maia e a profecia

Sobrevivi ao fim do mundo, ao Natal com todos os excessos e agora estou preparando o fígado para sobreviver ao fim do ano. Enquanto isso, gostaria de ver a cara dos que acreditaram na tal profecia maia, que dava o dia 21 como o do encerramento de nossa passagem por este vale de lágrimas.
 
É impressionante a credulidade das pessoas, a facilidade com que acreditam em qualquer teoria, principalmente se vem envolta num halo místico: milenarismo, adventismo, sebastianismo e até comunismo.
 
Não adianta mostrar que todas as profecias apocalípticas fracassaram — do milenarismo, que previa a volta de Cristo no ano 1000, até o Bug do Milênio, que anunciava o caos eletrônico, passando pela ameaça do cometa Halley em 1910.
 
Esses crentes estão por toda parte. Na China, cerca de mil foram presos acusados de difundir o boato alarmista. A polícia de Pequim teve que divulgar um comunicado de involuntário humor, avisando que “o fim do mundo é um rumor”. Nos EUA, a Nasa precisou reunir cientistas para desmentir na internet a enxurrada de cartas de pessoas em pânico. Algumas das mensagens falavam em suicídio. Um casal queria matar os filhos para que eles não presenciassem o apocalipse, ou seja, que morressem para não ver a morte. Pode?
 
Na Noruega, um homem fabricou um bote salva-vidas para enfrentar o dilúvio universal. Na França, fanáticos acorreram para um pico de 1.200 metros de altitude, na comuna de Bugarach, porque ali, segundo a profecia, seriam poupados da tragédia planetária. Para o templo maia Gran Jaguar, na Guatemala, acorreram multidões de estrangeiros.
 
Na Argentina, um usuário anônimo de uma página no Facebook escreveu: “Convidamos a todos os crentes, seres e guerreiros de luz a um suicídio espiritual em massa no morro Uritorco, em Córdoba.” O convite acrescentava: “Abandonemos a nossa carne impura e transportemos nosso espírito através do portal interdimensional às 21h12 minutos de 21/12/12 e dessa forma sejamos o exército de luz que salvará a humanidade.” Se não era uma brincadeira, a iniciativa não teve muito sucesso: o “suicídio mágico” esperava 15 mil seguidores e só teve cerca de 150.
 
O mais engraçado é que, mesmo desmoralizado, o fim do mundo virou uma metáfora para expressar situações ou atitudes absurdas. Nada mais fim do mundo, por exemplo, do que o presidente da Câmara dos Deputados — de sobrenome sugestivo — desafiar o STF em defesa de colegas condenados, ameaçando um apocalipse institucional, que por enquanto foi evitado.

 
 
Zuenir Ventura
O Globo

Arte


Professor Vacilius Lima, nosso mais novo seguidor

Nossos agradecimentos ao Prof. Vacilius por acessar este espaço e se tornar o nosso mais novo seguidor.
 
Obrigado e sinta-se em casa.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

A Canção e a Lenda da Cabocla Maringá sob a ótica da maringaense Ângela Xavier

Em 07 de março de 2010 postamos aqui no blog um artigo entitulado " A Canção e a Lenda da Cabocla Maringá" , de autoria dos professores  José Romero Araújo Cardoso e Gilberto de Sousa Lucena em que retrata a história da origem da canção maringá e sua relação com a cidade de Pombal-PB.
 
Recentemente, a internauta Ângela Xavier, natural de Maringá-PR, em comentário a dita postagem, traz uma abordagem abrangente sobre o tema o qual julgo merecedor de destaque tanto pelo seu contraponto a questão anterioremente aqui publicada quanto pela possibilidade do nosso blog em oportunizar democraticamente o direito de opinião.
 
Leia abaixo a posição da internauta maringaense sobre o tema:



Em que pesem os fatos históricos narrados no presente artigo, creio que seus autores foram deselegantes ao se referirem aos maringaenses como “usurpadores” que “indevidamente, sem nenhum direito histórico ou geográfico” se apoderaram da composição de Joubert Carvalho. Sou filha de pioneiros, ambos paraibanos e que ajudaram a construir esta cidade. Mas eles não estavam aqui sozinhos. O historiador João Laércio Lopes Leal lembra que os nordestinos eram numerosos e deram grande contribuição na formação da cidade. Vinham abrir picadas, trabalhavam nas lavouras, eram furadores de poços, operários na construção de casas, carregadores de sacos de café. Todos conheciam a realidade da seca no nordeste, tanto que vieram para cá em busca de uma vida melhor, mas não esqueceram suas raízes e sua cultura. A temática do poema pode ter sido inicialmente dirigida “apenas” à cidade de Pombal, mas a “realidade sertaneja” a quem os autores se referem é mais abrangente e com certeza atinge o fluxo de nordestinos que migraram para o estado do Paraná e se estabeleceram em Maringá, pois naquela época a migração de paraibanos (não somente os de Pombal) para outros estados brasileiros era sim uma realidade no sertão nordestino.

Considero absurda a afirmação de que “em tese, não há a menor relação da mensagem poética com a cidade paranaense de Maringá, a qual nunca foi constituída por caboclos, como o sertão da Paraíba”. Dizer isso é o mesmo que desconhecer a história da colonização de Maringá. Ora, se eles estavam aqui arando a terra, na qualidade de “retirantes” como não se identificar com os versos da canção popular? Será que os autores saberiam dizer quantas caboclas bonitas e nordestinas (que aqui estavam) se identificaram com a história da cabocla Maringá, narrada nos versos de Joubert de Carvalho? Saberiam eles dizer quantas Marias deixaram em seu estado de origem um amor antigo, cujo coração jamais se esqueceria? Afirmar que a população de Maringá nunca foi constituída por caboclos é negar a história da nossa colonização. Meu pai era o próprio caboclo, cuja fala de homem popular nunca negou o sotaque. Autêntico paraibano daqueles que faziam repentes em praça pública. Existiu e ainda existe aqui forte influência europeia, mas a formação de Maringá não se constituiu somente de europeus. A troca de culturas ocorrida na época da colonização foi uma das nossas maiores riquezas e as famílias de europeus, principalmente as italianas que aqui estavam logo nos ensinaram seus costumes. Aprendemos a comer polenta, macarronada com frango, pão feito em casa e outras comidas que nunca havíamos visto antes. De nossa parte, ensinamos a fazer cuscuz, tapioca, galinha a cabidela, mingau e tantas outras variedades da cozinha nordestina.

Temos o privilégio de não sofrer com estiagens a ponto de expulsar os filhos da terra para outros estados. Mas temos espaço e coração generoso para acolher quem chega disposto a trabalhar e a nos ajudar a crescer, como o caso dos irmãos nordestinos e tantos migrantes outros migrantes. Esta canção ficou conhecida aqui porque os nordestinos se identificavam com a letra, pelas lembranças que trazia de sua terra natal e porque era um sucesso nacional. Não usurpamos nada nem nos apropriamos de nada. Quando algo se torna sucesso passa a ser de domínio público, tanto que a música foi cantada naturalmente pelo povo (não somente os nordestinos, mas mineiros, paulistas e demais migrantes de outros estados brasileiros) na época da colonização, a ponto de se tornar o nome da cidade. E nome é uma referência muito forte. Tão forte que ainda hoje a canção de Joubert Carvalho é referência. Talvez se não existisse uma cidade tão bela e tão pujante com esse nome, a música já tivesse caído no esquecimento. Muitos sucessos da época tiveram esse destino. Há que se questionar: Maringá é famosa por causa da música ou a música é famosa por causa de Maringá? O certo é que ambas se beneficiaram desse enfoque: Maringá tem um belo nome e uma bonita história. A música de Joubert Carvalho não poderia ter melhor cidade como referência.
 
 
Ângela Xavier
Maringá - Paraná
 
 
 
A pracinha da Nova Vida é, via de regra, um espaço morto situado entre duas rodovias e pouco olhado pelo Poder Público. Vez por outra se tenta uma reforma mal sucedida. O fato é que a pracinha poderia ser mais alegre e bem cuidada. Por isso mesmo é dispendioso ver aquele espaço público como um ponto de lazer ou um espaço onde as pessoas acorrem para um bom papo ou uma descontração qualquer.
 
A pracinha é solitária. Dificil encontrar ali um pé de pessoa. Pelo menos até ontem.
 
Caprichosamente, nove garotas se encarregaram de dar um pouco de beleza a velha, esquecida  e sisuda pracinha da Nova Vida. Claro que registrei o fato!
Reblogged from kutisbuti

Sermão do Bom Ladrão

(...) O que eu posso acrescentar pela experiência que tenho é que não só do Cabo da Boa Esperança para lá, mas também da parte de aquém, se usa igualmente a mesma conjugação.

Conjugam por todos os modos o verbo rapio, não falando em outros novos e esquisitos, que não conhecem Donato nem Despautério (a).

Tanto que lá chegam começam a furtar pelo modo indicativo, porque a primeira informação que pedem aos práticos, é que lhes apontem e mostrem os caminhos por onde podem abarcar tudo.

Furtam pelo modo imperativo, porque, como têm o misto e mero império, todo ele aplicam despoticamente às execuções da rapina.

Furtam pelo modo mandativo, porque aceitam quanto lhes mandam; e para que mandem todos, os que não mandam não são aceitos.

Furtam pelo modo optativo, porque desejam quanto lhes parece bem; e gabando as coisas desejadas aos donos delas por cortesia, sem vontade as fazem suas.

Furtam pelo modo conjuntivo, porque ajuntam o seu pouco cabedal com o daqueles que manejam muito; e basta só que ajuntem a sua graça, para serem, quando menos, meeiros na ganância.

Furtam pelo modo permissivo, porque permitem que outros furtem, e estes compram as permissões.

Furtam pelo modo infinito, porque não tem fim o furtar com o fim do governo, e sempre lá deixam raízes, em que se vão continuando os furtos.

Estes mesmos modos conjugam por todas as pessoas; porque a primeira pessoa do verbo é a sua, as segundas os seus criados e as terceiras quantas para isso têm indústria e consciência.

Furtam juntamente por todos os tempos, porque o presente (que é o seu tempo) colhem quanto dá de si o triênio; e para incluírem no presente o pretérito e o futuro, de pretérito desenterram crimes, de que vendem perdões e dívidas esquecidas, de que as pagam inteiramente; e do futuro empenham as rendas, e antecipam os contratos, com que tudo o caído e não caído lhes vem a cair nas mãos.

Finalmente nos mesmos tempos não lhes escapam os imperfeitos, perfeitos, plusquam perfeitos, e quaisquer outros, porque furtam, furtavam, furtaram, furtariam e haveriam de furtar mais, se mais houvesse.

Em suma, o resumo de toda esta rapante conjugação vem a ser o supino do mesmo verbo: a furtar, para furtar.

E quando eles têm conjugado assim toda a voz ativa, e as miseráveis províncias suportado toda a passiva, eles, como se tiveram feito grandes serviços, tornam carregados e ricos: e elas ficam roubadas e consumidas...

Assim se tiram da Índia quinhentos mil cruzados, da Angola, duzentos, do Brasil, trezentos, e até do pobre Maranhão, mais do que vale todo ele.



Padre Antonio Vieira, sacerdote jesuíta, professor de retórica, pregador, confessor, embaixador e escritor português. Trecho do Sermão do Bom Ladrão, escrito em 1655. Proferido na Igreja da Misericórdia de Lisboa (Conceição Velha), perante D. João IV e sua corte. O retrato que apresenta o autor é de Cândido Portinari.

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Adriana Calcanhoto


A magia da leitura

Todos nós, jovens e menos jovens, estamos crescentemente dependentes da plataforma virtual. É fascinante o apelo da web. Investimos muito tempo digitando mensagens de texto, escrevendo nos blogs, postando fotos e comentários no facebook ou curtindo videogames.
 
Eu mesmo já fiz o propósito de não acessar meus e-mails nos fins de semana. Tem sido uma luta. Com vitórias, mas também com derrotas.
 
Para o norte-americano Nicholas Carr, formado em Harvard e autor de livros de tecnologia e administração, a dependência da troca de informações pela internet está empobrecendo nossa cultura. Ele não fala do uso da internet, mas da compulsão virtual.
 
Segundo Carr, o uso exagerado da internet está reduzindo nossa capacidade de pensar com profundidade. “Você fica pulando de um site para o outro. Recebe várias mensagens ao mesmo tempo. É chamado pelo Twitter, pelo Facebook ou pelo Messenger. Isso desenvolve um novo tipo de intelecto, mais adaptado a lidar com as múltiplas funções simultâneas, mas que está perdendo a capacidade de se concentrar, ler atentamente ou pensar com profundidade.”
 
A nova geração de adolescentes tem mais acesso à informação que qualquer outra antes dela. Mas isso não se reflete em um ganho cultural. Os índices de leitura e de compreensão de texto vêm caindo desde o início dos anos 1990.
 
A conclusão é que, apesar do maior acesso às novas tecnologias, não se vê um ganho expressivo em termos de apreensão de conhecimento.
 
A internet é uma formidável ferramenta. Mas não deve perder o seu caráter instrumental. O excesso de internet termina em compulsão, um tipo de dependência que já começa a preocupar os especialistas em saúde mental. Usemos a internet, mas tenhamos moderação. Precisamos, todos, redescobrir a magia da leitura.
 
Compartilho com você, amigo leitor, algumas obras. Espero, quem sabe, que o estimulem em suas férias de verão.
 
O silêncio contra Muamar Kadafi (Editora Companhia das Letras, São Paulo). Um livro com pegada. Reportagem na veia. “Em poucos minutos, ouvimos o ruído de um motor a diesel. Um carro chegava pela parte de trás da casa, em baixa velocidade, até parar. Ouvi as portas se abrirem, Ghaith e Mohamed silenciaram. Tudo silenciou. O tempo parou por um instante, enquanto quatro homens vestindo jaquetas pretas se aproximaram. Um deles trazia uma arma em punho, e os demais carregavam bastões de ferro. Mohamed deu um passo para o lado, cedendo passagem. Um dos estranhos caminhou até Ghaith, agarrando-o; outro veio até mim e apalpou minha jaqueta e meus bolsos até deparar com o iPhone que eu protegia com uma das mãos. Segurei o aparelho com firmeza, sem menção de reagir, lembrando que dezenas de entrevistas gravadas estavam ali. O homem fez força para arrancá-lo com as duas mãos, até conseguir. Então, sem que reagíssemos, fomos pegos à força pelos braços e arrancados da casa, empurrados à rua de chão batido e obrigados a olhar para baixo.”
 
O relato em primeira pessoa do repórter Andrei Netto, enviado especial do jornal O Estado de S.Paulo, para cobrir a primeira revolução armada da Primavera Árabe, que em oito meses terminaria com a execução do ditador Muamar Kadafi, mostra a garra da reportagem de qualidade.
 
Andrei e um colega iraquiano foram os primeiros jornalistas estrangeiros a ingressar na região sob controle do regime e a revelar ao mundo a extensão e a intensidade das rebeliões contra a ditadura.
O correspondente do Estado foi sequestrado, agredido e mantido incomunicável num cárcere militar até sua libertação, intermediada pela diplomacia brasileira, pelos esforços da direção do jornal e a solidariedade da imprensa mundial.
 
Lembro-me da tensão daqueles dias. A grande reportagem de Andrei Netto, agora transformada em livro, constitui um relato impressionante das suas experiências ao longo da guerra revolucionária que matou mais de 20 mil pessoas.
 
A adrenalina da guerra bate forte no leitor, sem sensacionalismo, sem nada de apelativo, numa narrativa informativa e legitimamente dramática. A presença do correspondente no campo de combate possibilita uma cobertura altamente qualificada. Faz toda a diferença. Um belo livro.
 
O Óbvio Ululante – As Primeiras Confissões (Editora Agir, Rio de Janeiro). Como dizia Nelson Rodrigues, a “arte da leitura é a da releitura”. Comentário certeiro.
 
Acabo de reler as memórias de Nelson Rodrigues, suas Confissões, condensadas no magnífico. O óbvio ululante. Trata-se de um dos maiores cronistas que o Brasil já teve. Seu conhecimento da alma humana, com seus picos de grandeza e seus abismos de miséria, fica esculpido num texto insuperável.
 
Nelson foi um criador de tipos antológicos. Como o anônimo cidadão que lhe serviu para criar o Palhares, o canalha, o que “atacava as cunhadas nos corredores”. Ou a imortal grã-fina “com nariz de cadáver”. Ou, ainda, o sacerdote que o inspirou a criar o “padre de passeata”.
 
Seu texto, brilhante e saboroso, dissecava a alma humana e radiografava a sociedade. Mas o que mais me impressiona é a atualidade do pensamento rodrigueano. Um livro fascinante.
 
A Igreja das Revoluções (Editora Quadrante, São Paulo). Este é o último título da História da Igreja de Cristo, a monumental obra de Daniel-Rops. O autor, membro da Academia Francesa de Letras, estava trabalhando no décimo primeiro, que trataria do Concílio Vaticano II quando faleceu, em 1965.
 
A multissecular história da Igreja, intimamente relacionada com a história da civilização, é um banho de cultura e um magnífico prazer intelectual.
 
A todos, boa leitura e feliz Natal. E, aos que viajam, boas férias!
 
 
Carlos Alberto Di Franco, diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciência Sociais – IICS (www.iics.edu.br) e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra, é diretor da Di Franco – Consultoria em Estratégia de Mídia . E-mail: difranco@iics.org.br

Hit no YouTube, vídeo de pacientes faz doação de medula crescer 180%



"O que não te mata, faz você mais forte!". A mensagem trazida no refrão da música Stronger, da cantora americana Kelly Clarkson, serviu de pano de fundo para um vídeo que tem como objetivo incentivar a doação de medula óssea no Brasil.
 
O vídeo foi ao ar no YouTube no dia 15 de outubro e já foi visto por quase 540 mil pessoas, o que fez o objetivo ser atingido rapidamente – o número de doadores de medula no hospital cresceu 180%: passou de cerca de 180 por mês para mais de 500.
 
 
Fonte: Blog do Noblat

É Natal: a graça de um belo vexame em família

 
E de repente, na fila da farofa, aquela priminha que você não dava nada se revela a gostosa-mor do universo.
*
Minha solidariedade aos parentes desconhecidos que logo mais estarão mais perdidos na ceia do que vira-lata em caminhão de mudança.
*
Tudo muda na família. Menos as ovelhas negras. O espírito natalino é burro. São as mesmas eleitas a vida inteira.
*
Toda ceia carece de pelo menos um velho comunista para chocar as criancinhas mesmo no tempo em que Papai Noel não passa de um aplicativo de quinta.
*
A cara de espanto com o novo gay recém-revelado. E para cada um assumido, dois no armário ad eternum.
*
A hora de falar umas verdades. Alguém bate o talher na garrafa, como no “Festa de Família” (no cartaz acima), filme do Dogma 95. Suspense.
*
Na falta de assunto, tempo, tempo, tempo. O calor carioca, a estiagem cearense, o mormaço do Recife, as quatro estações diárias de San Pablo etc.
*
O cunhado bêbado, em plena Missa do Galo, ainda com o interminável grito de guerra: Vai, Curíntia!
*
O tio bêbado, tipo papudinho mesmo, que dureza acompanhar seu ritmo.
*
A parente maldosa que presenteia a prima idem com uma roupa maior do que ela veste. Só para fotografar –vide post no Facebook ainda na madruga- o justo momento em que a “inimiga” exibe a peça para todos.
*
E a vovó-Niemeyer repete o chiste de sempre para a neta predileta: “O que mais gosto do Natal, Rose, é que você está sempre de homem novo!” O detalhe é que Rose está à beira das bodas de prata com o mesmo hombre.
 
E você, estimado(a) leitor(a), qual o bafo natalino predileto da vossa família?
 
 
Xico Sá
Fonte: Folha de S. Paulo

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Um Santo Natal a todos!


Não há vagas

Um texto crônica escrito por Otto Lara Resende há várias décadas mas que me parece muito atual por todas as questões que envolvem o verdadeiro significado do Natal.
 
Deixo aqui essa reflexão como mensagem do blog a todos os que acessam esse espaço virtual que é de todos nós.
 
Um Santo Natal a todos!.  
 
 
NÃO HÁ VAGAS
 
 
O menino-Deus veio ao mundo num quadro de extrema humildade e despojamento. Um pobre carpinteiro sai com sua mulher de Nazaré e viaja primitivamente até Belém, para cumprir uma disposição legal do Império – o recenseamento. Estando ali – como diz o Evangelista – aconteceu completarem-se os dias em que Maria devia dar à luz. E deu à luz o seu filho primogênito, e o enfaixou, e o reclinou numa manjedoura; porque não havia lugar para eles na estalagem.
Cristo assume assim obscuramente o seu destino humano. Entra no tempo e na história pela porta da maior modéstia. O carpinteiro, sua mulher grávida obrigada a uma penosa viagem, a falta de lugar nas estalagens – tudo fala eloquentemente de uma pobreza singela e anônima. A primeira lição, pois é a do desprendimento absoluto, da absoluta pobreza.
O Natal soa, por isso mesmo, em nosso mundo de 1966, como um escândalo, só comparável àquele outro escândalo que encerra o ciclo do Redentor da terra – a morte na cruz. Que sentido terá, para a nossa mentalidade destes dias, essa estranha festa da esperança, que nos convida a renascer segundo valores que negam e repudiam os critérios dominantes?
Num mundo dominado pelo sentimento do lucro e da competição, como entender a mensagem e o mistério que se desprendem da humilde gruta de Belém? Num mundo que devassa o cosmos, que se prepara orgulhosamente para a conquista da Lua, que planifica a família, raciocina eletronicamente, prega o “birth-control”, ri-se da virgindade e exalta a pílula anticoncepcional, que lição encerra o nascimento de um Menino reclinado numa manjedoura? Um carpinteiro dócil a uma vontade que vem do alto, um carpinteiro sem poder aquisitivo e uma virgem que ouve vozes e fala com anjos... – como esse quadro parece distante da automação e dos cérebros eletrônicos, dos foguetes intercontinentais e da técnica da “mass-communication”! 
Talvez por isso a gruta se entulhe, hoje, de guizos e quinquilharias, para disfarçar o anacronismo meio bucólico e certamente subdesenvolvido em que é difícil identificar o sentido e o símbolo transcendentes que a Natividade encerra. Aos olhos infantis de hoje, que é o presépio ao lado do maravilhoso trenzinho elétrico? Que atrativo tem essa história ao lado do fascinante autorama?
São Francisco, que é um personagem antigo, anterior à industrialização e ao planejamento, queria que os pobres e os mendigos fossem cumulados de presentes no dia do Natal. O pobrezinho de Assis recomendava que se desse uma ração suplementar de aveia e feno aos bois e aos burros para comemorar o Nascimento. E contam os seus biógrafos que muito sonhou com uma audiência com o Imperador, para pedir-lhe um édito que mandasse semear alimento, ao longo das estradas, para os seus irmãos passarinhos. Que coração insensato pediria hoje um ato institucional fundado na misericórdia e no perdão?
De repente, o Menino ficou antigo como uma écloga virgiliana e, como há 1966 anos, não há lugar nas estalagens. A pobre família de Nazaré continua mergulhada na obscuridade e o Papai Noel que vende eletrodomésticos pelo crediário nunca ouviu falar numa remotíssima gruta de Belém, com um boi e um burro que o cavalo-vapor tornou obsoletos.
Não há vagas – dizem as tabuletas que o meu momentâneo pessimismo vê pregadas em todas as portas. Algo mais forte, porém, me diz que contra toda evidência e contra todas as portas fechadas, no fundo do coração humano subsiste a esperança. E é dela que fala o Natal.
 
Otto Lara Resende

Reblogged from preciousandfregilethings

Compras de Natal

A cidade deseja ser diferente, escapar às suas fatalidades. Enche-se de brilhos e cores; sinos que não tocam, balões que não sobem, anjos e santos que não se movem, estrelas que jamais estiveram no céu.

As lojas querem ser diferentes, fugir à realidade do ano inteiro: enfeitam-se com fitas e flores, neve de algodão de vidro, fios de ouro e prata, cetins, luzes, todas as coisas que possam representar beleza e excelência.

Tudo isso para celebrar um Meninozinho envolto em pobres panos, deitado numas palhas, há cerca de dois mil anos, num abrigo de animais, em Belém.

Todos vamos comprar presentes para os amigos e parentes, grandes e pequenos, e gastaremos, nessa dedicação sublime, até o último centavo, o que hoje em dia quer dizer a última nota de cem cruzeiros, pois, na loucura do regozijo unânime, nem um prendedor de roupa na corda pode custar menos do que isso.

Grandes e pequenos, parentes e amigos são todos de gosto bizarro e extremamente suscetíveis. Também eles conhecem todas as lojas e seus preços — e, nestes dias, a arte de comprar se reveste de exigências particularmente difíceis. Não poderemos adquirir a primeira coisa que se ofereça à nossa vista: seria uma vulgaridade. Teremos de descobrir o imprevisto, o incognoscível, o transcendente. Não devemos também oferecer nada de essencialmente necessário ou útil, pois a graça destes presentes parece consistir na sua desnecessidade e inutilidade. Ninguém oferecerá, por exemplo, um quilo (ou mesmo um saco) de arroz ou feijão para a insidiosa fome que se alastra por estes nossos campos de batalha; ninguém ousará comprar uma boa caixa de sabonetes desodorantes para o suor da testa com que — especialmente neste verão — teremos de conquistar o pão de cada dia. Não: presente é presente, isto é, um objeto extremamente raro e caro, que não sirva a bem dizer para coisa alguma.

Por isso é que os lojistas, num louvável esforço de imaginação, organizam suas sugestões para os compradores, valendo-se de recursos que são a própria imagem da ilusão. Numa grande caixa de plástico transparente (que não serve para nada), repleta de fitas de papel celofane (que para nada servem), coloca-se um sabonete em forma de flor (que nem se possa guardar como flor nem usar como sabonete), e cobra-se pelo adorável conjunto o preço de uma cesta de rosas. Todos ficamos extremamente felizes!

São as cestinhas forradas de seda, as caixas transparentes os estojos, os papéis de embrulho com desenhos inesperados, os barbantes, atilhos, fitas, o que na verdade oferecemos aos parentes e amigos. Pagamos por essa graça delicada da ilusão. E logo tudo se esvai, por entre sorrisos e alegrias. Durável — apenas o Meninozinho nas suas palhas, a olhar para este mundo.
 
Cecília Meireles

Texto extraído do livro "Quatro Vozes", Editora Record - Rio de Janeiro, 1998, pág. 80.