domingo, 21 de março de 2010

Salve o dia de São José

O solstício de março coincide com o dia de São José, dia 19, sendo que esse fenômeno climatológico transformou o ídolo católico em ícone da devoção e das tradições sertanejas, pois neste dia o sertanejo espera com ansiedade pelas chuvas que podem garantir safra satisfatória, a qual é garantia de melhoria na qualidade de vida da família.

Com um pouco de sorte e ajuda dos céus, pode-se ainda haver garantia de formação de excedente que tende minimizar os efeitos da falta de alimentos no combalido mercado interno, massacrado pela tendência histórica que define percentual significativo da produção agropecuária nacional voltada para atender exigências externas.

O dia de São José é a última esperança do sertanejo de que possa haver um bom inverno, razão pela qual são muitas as romarias e festejos espalhados pelos mais diversos lugares no adusto sertão nordestino.

O carpinteiro judeu alçado à condição de santo na liturgia católica tem lugar garantido em altares de igrejas e santuários das famílias profundamente religiosas, representando a fé e a esperança de melhores dias.

Senhor São José, cantado e decantado em versos antológicos, surgidos através da genialidade de Patativa do Assaré, em A Triste Partida, imortalizados pela voz sublime e incomparável de Luiz Gonzaga, tornou-se o santo dos pobres, dos humildes, dos que sofrem com a falta de apoio, pois sem perspectivas de reversão de quadro dantesco que teima em se repetir e se reproduzir enquanto condição sine qua non da dominação imposta pelas estruturas de poder, humildes nordestinos recorrem à Sua intervenção a fim de que as desejadas e sonhadas chuvas molhem o chão adusto e façam brotar a subsistência de uma raça forte e altiva que nunca desiste de lutar, de desafiar as intempéries de uma região cujo povo vem sendo castigado pelas secas e pela indiferença dos poderosos sempre guiados pela lógica do capital em suas formas, interesses e metamorfoses contínuas e constantes.

Quantas vezes o sertanejo esperou e vai esperar pelo dia de São José? Incontáveis vezes. São José é o protetor, Àquele a quem se dirigem em romarias quando falham as experiências com as pedras de sal, feitas no dia 13 de Dezembro, dedicado a Santa Luzia, ou com a observação de como se manifesta o quebrar da barra no dia de Natal.

Chuva, mas que venha de mansinho, sem as tormentas inenarráveis que tantos dissabores trouxeram, este é o sonho do homem sertanejo que tem nos frutos da terra a garantia de que a fome pode ser saciada pelo menos temporariamente.

O cheiro da terra molhada neste recente dia de São José traz a esperança de que nosso povo não vai passar novamente pelos rigores de uma estiagem inclemente, cujos efeitos são muito bem conhecidos de todos.

Emocionar-se com a concretização, em mais um ano, da alegria embasada na experiência cultivada imemorialmente pelos sertanejos é motivo de alegria e de esperança de que um inverno satisfatório esteja por vir, fazendo com que os sorrisos brotem nos rostos sofridos de um povo forte.

Chuvas, belas chuvas, caídas justamente no dia 19 de março. Chuvas que modificam a caatinga do dia para a noite, tirando-a de hibernação que é um verdadeiro capricho da natureza. Louvadas sejam as chuvas que trazem a esperança de promissão, a alegria de melhores dias, da abundância merecida.

Que as chuvas tragam consigo bons frutos, que a terra molhada propicie colheita boa, essas são as torcidas de todos que acreditam na força do trabalho para gerar fartura e mesas cheias com os mais nutritivos e saborosos alimentos produzidos na heróica região brasileira calcinada pela insolação inclemente.



José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente.


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