O
Brasil se vê como uma cultura periférica em relação à Europa e EUA, assim como
o Nordeste em relação ao Rio e São Paulo.
Existe o fervilhar endêmico de sentimentos nativistas, separatistas,
rebeldes, etc., mas o fato deles terem alvo certo comprova a existência do
fenômeno. Isso é errado? É feio?
É não, rapaz, é a vida. Na cidade-de-esmeralda
distante tudo parece maior, melhor, mais bonito e mais bem feito do que na
cidade-de-taipa que nos rodeia. Ouvimos as músicas dela, lemos os livros, sonhamos
em conhecê-la. Uns vão tentar a vida lá, alguns dão com os burros nágua, outros
descobrem que o tesouro estava enterrado no pé do sicômoro onde cochilavam... É a vida.
No
ensaio O alexandrino Olavo Bilac (1965) Virginius da Gama e Melo passa um
pente fino na obra do poeta da Via Láctea. Virginius (para quem não conhece,
um dos grandes intelectuais boêmios que a Paraíba produziu), faz um passeio
amplo pela métrica, rima e temática bilaqueana, e a certa altura toca num ponto
interessante. Cadê o Brasil na obra de Bilac?
Parece
uma pergunta ociosa. Por que diabos um poeta brasileiro é obrigado a escrever
sobre o Brasil? A pergunta procede, contudo. Bilac defensor do serviço militar
obrigatório, fez letra de hino, fez poema ufanista (“Ama com fé e orgulho a
terra em que nasceste! / Criança, não verás país nenhum como este!”). Mas...
Diz Virginius: “Basta a verificação dos seus temas principais, temas obtidos
ora da mitologia e da história greco-romana, ora do cristianismo primitivo e
medievo, além duma evidente inspiração francesa. Há numa visão panorâmica quase
o levantamento total dos grandes episódios criadores e informadores dessa
cultura latina (...)”.
Folhear os livros de Bilac é passear em Cartago,
em Atenas, em Roma; é esbarrar em Xenócrates, em Frinéia, em Cleópatra. Um épico como “O Caçador de Esmeraldas”,
sobre Fernão Dias Paes Leme, é exceção, e mal se distingue do épico dedicado à
Escola de Sagres (“Sagres”, que Ariano Suassuna, num ensaio notável, sugere ter
influenciado o Mensagem de Fernando Pessoa, publicado pouco depois). A inspiração de Bilac, diz Virginius, não lhe
vinha da vida e sim da literatura: “Era ele, entretanto, pessoalmente, um
patriota sincero, e muita fé no nacionalismo fez. Acontecia apenas que, de
certo modo, passara sua sensibilidade a existir apenas literariamente. (...) O
descritivo estereotipado de Bilac, as paisagens referidas nos seus elementos
universal e historicamente comprovados, situam o poeta, nesse campo, numa
categoria puramente intelectual, onde as imagens são produto do eruditismo, e
não da sensibilidade”.
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo
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