Passou no seu casamento por aquilo que é quase um fato universal - os
indivíduos são diferentes uns dos outros. Basicamente, constituem um
para o outro um enigma indecifrável. Nunca existe acordo total. Se
cometeu algum erro, esse erro consistiu em ter-se esforçado
demasiadamente por compreender totalmente a sua mulher e por não ter
contado com o fato de, no fundo, as pessoas não quererem saber que
segredos estão adormecidos na sua alma. Quando nos esforçamos demasiado
por penetrar noutra pessoa, descobrimos que a impelimos para uma posição
defensiva e que ela cria resistências porque, nos nossos esforços para
penetrar e compreender, ela sente-se forçada a examinar aquelas coisas
em si mesma que não desejava examinar. Toda a gente tem o seu lado
obscuro que - desde que tudo corra bem - é preferível não conhecer.
Mas isto não é erro seu. É uma verdade humana universal que é indubitavelmente verdadeira, mesmo que haja imensas pessoas que lhe garantam desejar saber tudo delas próprias. É muito provável que a sua mulher tivesse muitos pensamentos e sentimentos que a tornassem desconfortável e que ela desejava ocultar de si mesma. Isto é simplesmente humano. É também por este motivo que tantas pessoas idosas se refugiam na própria solidão, onde não serão incomodadas. E é sempre sobre coisas de que elas não desejariam estar muito cientes. O senhor não é, obviamente, responsável pela existência destes conteúdos psíquicos. Se, apesar disto, ainda for atormentado por sentimentos de culpa, reflita então sobre os pecados que não cometeu e que gostaria de ter cometido. Isto poderá eventualmente curá-lo dos seus sentimentos de culpa relativamente à sua mulher.
Carl Jung, in 'Cartas'
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