Vejo uma atitude muito esquisita da parte de algumas pessoas que, pelo
menos aparentemente, parecem querer mudar o país: é um discurso ao mesmo
tempo desesperado, desistente, agressivamente esnobe e até
apocalíptico.
Seguem certas expressões características desse, digamos, estado de
espírito: o Brasil acabou; país de merda; 2016 foi uma desgraça e 2017
vai ser desgraça ainda maior; povinho burro, ignorante; a única saída é o
aeroporto... E por aí vai.
É decepcionante. Que falta de vigor é esta? – me pergunto. Xingar o
país, atacar o povo e dizer que a melhor coisa a fazer é se mandar para o
exterior não são coisas que se deva esperar de quem deseja promover
mudanças por aqui. E olha que os tempos nem andam tão pesados assim.
Quando comparo com a época realmente dura, pesada e violenta da
ditadura militar pós-AI5 e pré-Geisel, o contraste chega a ser
escandaloso. Naquela época, sob as botas da repressão, não xingávamos o
país. Não ficávamos nos lamentando, dizendo que tudo tinha acabado. Quem
não era expulso do país, queria mesmo era ficar por aqui. E, quando o
Maracanã em peso aplaudiu Médici, nenhum de nós decretou: povinho de
merda.
Não. Era muito diferente. Em vez de ficar se descabelando, xingando e
jogando a toalha a cada tropeço, tratávamos de tentar entender as coisas
e verificar onde estávamos errando. E atuávamos em todos os campos e em
todas as brechas possíveis para contestar a ditadura e avançar em
direção à democratização nacional.
Ou seja: numa situação incomparavelmente mais difícil, parecíamos ter
mais serenidade, firmeza e consistência, apesar do desatino delirioso –
suicida, mesmo – do projeto da luta armada. E foram anos e anos de
trabalho político contínuo para transformar aquela realidade terrível.
Por isso mesmo, a vitória contra a ditadura foi resultado da práxis
política cotidiana das forças democráticas brasileiras. A ditadura não
caiu por causa de bomba, assalto a banco, araguaias. Longe disso. Caiu
por causa do MDB, da Igreja Católica, da esquerda democrática, de
artistas e intelectuais, todos batalhando juntos pelo retorno à
democracia.
Agora, como explicar a diferença entre a disposição transformadora
paciente e persistente daqueles tempos – e o misto de
desespero-desistência-horror de tantos, hoje? Por que a mania atual de
esculhambar o país (dizendo cretinices sobre a nossa história) e agredir
a população, o povinho-de-merda?
O Brasil já tem uma nova direita. Nova esquerda, não. E, se for nessa batida, não terá tão cedo.
Antonio Risério
Do blog do Noblat
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