O presidente Solon de Lucena realizou, na Parahyba, um dos mais operosos governos de que se tem notícia, na República
Velha. Também pudera! Na presidência da nação estava seu parente e
chefe, Epitácio Pessoa. Este, paraibano de Umbuzeiro, aquele, de
Bananeiras. O jornal Cidade
de Bananeiras, edição de 19 de junho de 1908, dá notícia da presença do
mestre-escola Solon, ao lado do também professor Álvaro de Carvalho, no
encerramento do semestre letivo do Instituto Bananeirense, renomada
escola local que educou várias gera&ccedi l;ões. Alguns anos mais
tarde, os dois professores citados alcançariam o mais alto cargo do
Estado. Sólon, interinamente, na qualidade de presidente da Assembleia,
entre os anos 1912-1915 e eleito, a partir de 1920 até 1924. Álvaro,
após a morte trágica de João Pessoa,de quem era primeiro
vice-presidente. Em setembro de 1923, por pouco, Solon não foi deposto
do cargo de presidente da Parahyba.
É essa a história que quero contar. Era um sábado, 22
de setembro de 1923. As duas principais escolas da Parahyba eram o
Liceu Paraibano e a Escola Normal, localizadas ambas na praça comendador
Felizardo, hoje, João Pessoa. O monsenhor João Milanez, diretor da
escola normal, visando preservar a decência de suas alunas e a manutenção da ordem
pediu uma autorização especial ao chefe de Polícia, Demócrito de
Almeida, para que a Guarda Civil p oliciasse a praça e impedisse os
encontros dos jovens alunos dos dois estabelecimentos de ensino público.
Essa vigilância foi entregue ao guarda Antonio Menezes, de número 33.
Por conta própria, o padre estabeleceu uma linha imaginária, cognominada
de “linha da decência”, cuja travessia era proibida aos jovens do Liceu, enamorados ou não, das
suas normalistas e vice-versa. Naquele sábado, Sadi Castor Correia Lima
ao tentar aproximar-se de sua namorada Ágaba Gonçalves de Medeiros foi
impedido pelo guarda civil citado.
Da
discussão entre o Guarda 33 e o estudante, surgiu um tiro que atingiu,
mortalmente, o jovem Sadi, de 25 anos, que viera de Soledade estudar na
capital. O monsenhor Milanez não tinha a menor idéia de que o guarda
encarregado na vigilância da praça era um homem violento e com
antecedentes criminais. A morte do estudante comoveu o estado e
mobilizou seus colegas, revoltados com o crime, atribuído à
responsabilidade das autoridades constituídas a começar do Presidente do
Estado até o Chefe de Polícia e, principalmente, ao diretor da Escola
Normal. Um enterro simbólico do padre, acompanhado de perto pela
polícia, seguiu até a sua residência onde foi depositado o caixão
fúnebre. A repercussão quase derruba o pres idente Solon de Lucena que
agiu rápido e, como ainda hoje acontece, fez o pau quebrar-se no espinhaço do mais fraco. O presidente, de imediato, exonerou o diretor Milanez e
suspendeu, por decreto, as aulas das duas escolas. Para substituir
Milanez, foi nomeado o monsenhor Pedro Anísio, um conterrâneo do
presidente. Um mês depois, o fato criminoso ainda em evidência, é
agravado pelo suicídio da namorada enlutada.
No
domingo, 23 de setembro, quando o sepultamento do estudante Sadi era
realizado, os estudantes do Liceu permaneciam com o espírito alterado.
As passeatas, os discursos inflamados, serviam para reavivar a ferida
recentemente aberta. Ao tomar conhecimento de que a edição do jornal A
União, daquele dia, “registrara de maneira agressiva e impiedosa o crime da tarde anterior”,
como registra Apolônio Nóbrega, os estudantes que já haviam apedrejado a
sede da Guarda Civil e transitavam em atitude agressiva perante o
Palácio do Governo passaram a recolher nos
pontos de v enda do jornal A União todos os exemplares entregues à
distribuição. Amontoados em praça pública, foram queimados em sinal de
protesto. A Parahyba, que no passado assistira ao empastelamento e ao
incêndio de jornais da oposição, a exemplo de “O Commercio”, de Artur
Aquiles e, de “O Combate”, do jovem Boto de Menezes, pela primeira vez, testemunhava uma atitude de intolerância contra seu jornal oficial.
Ramalho Leite
(Consultei
“História Republicana da Paraíba” e “Política e Parentela na Paraíba”,
de Apolônio Nóbrega e Linda Lewin, respectivamente)
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