segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Os homens constroem teorias estranhas sobre o bem e o mal, sobre os castigos e as recompensas; procuram assim a verdade que nunca em vida poderão saber. 


Foi muito bom para mim e para a minha família o fato de eu ter sempre ficado em casa e conservado sem esforço o meu antigo modo de ser calmo até aos quinze anos. Nessa altura, porém, mandaram-me para uma escola longe da minha casa, onde o ser latente em mim que tanto temia despertou e começou a agir e a insinuar-se na vida humana. 



Quando digo que sentia haver muito mal dentro de mim, não quero dizer que estivesse desde sempre condenado a uma vida de infâmia ou de vício. Quero dizer, porém, isto — que havia em mim uma forte atração por todas as coisas censuráveis que assediam o homem: podia controlar ou podia satisfazer esta atração, mas uma vez satisfeita, mesmo só um pouco, era provável que eu nunca mais me pudesse controlar. Resolvi satisfazer essa atração, e a partir desse momento, dava-me um prazer enorme explorar sempre novas espécies de mal.



Fernando Pessoa 
Manuscrito, original em Inglês (1904-1908)

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