Hoje ela é notícia de primeira página, mas há quatro anos, quando perguntei
num artigo, “Vocês conhecem Yoani?”, pouca gente aqui sabia que ela já era uma
das 100 personalidades mais influentes do mundo, segundo a revista “Time”. Que
seu blog “Geração Y” ganhara prêmio no exterior como um espaço em defesa da
livre expressão. E que por isso, e porque tinha quatro milhões de acessos por
mês, era perseguido pelo governo de Fidel Castro.
A ironia é que o nome era uma herança da influência soviética na Ilha.
Segundo a blogueira, a URSS deixara muito pouco, além de carros caindo aos
pedaços e de nomes como o dela, começados por ípslon: Yaslis, Yanisleidi,
Yoandri, Yusimí, Yuniesky. Eram jovens nascidos em Cuba nos anos 70 e 80,
marcados “pela emigração ilegal e frustração”. Foi com essa tribo “cética e
descrente do regime” que ela passou a dialogar.
No começo, “Geração Y” era um exorcismo pessoal para expulsar os “demônios da
apatia, da dor moral, do medo”. Só que esses demônios habitavam milhares de
outros espíritos e, aos poucos, o espaço se transformou numa “praça pública
virtual onde há de tudo, gritos, insultos, discussões”. Yoani usa o verso de uma
banda de rock local para se definir: “Eu não gosto de política, mas ela gosta de
mim.”
Já que em Cuba “até respirar é um ato político”, o seu blog acabou tendo essa
função de desabafo, de versão não oficial do cotidiano e suas mazelas, tais como
racionamento, baixo padrão de vida, controle de comportamento, corrupção,
mercado negro. Acusada por uns de ser agente da CIA e por outros de, no fundo,
favorecer o governo mostrando que em Cuba os dissidentes podem se manifestar,
Yoani Sánchez pagou caro por sua insubordinação intelectual: foi difamada,
perseguida, presa e proibida de viajar.
“Durante seis longos anos tentei 20 vezes sair do meu país de forma
temporária e recebi sempre a mesma resposta: a senhora não está autorizada a
viajar”, declarou, já no Brasil, onde iniciou uma viagem por vários países da
Europa e da América.
Não foi um começo fácil. Além da denúncia de “Veja”, de que há uma
“conspiração cubano-petista” para “desmascarar” a blogueira, ela foi alvo em
Pernambuco e Bahia de um pequeno grupo de militantes de esquerda, que a recebeu
com xingamentos de “traidora” e violência (chegaram a puxar-lhe os cabelos).
Em vez de reclamar dos furiosos protestos que a impediram até de falar, ela
deu uma lição de tolerância democrática, preferindo ver no episódio, que em Cuba
só é possível quando a favor do governo, uma manifestação de liberdade de
expressão a ser comemorada e desejada: “Quero essa democracia no meu país.”
Zuenir Ventura é jornalista
O Globo
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