"Fui profeta da sabedoria e da verdade. Possuía as
chaves da cidade. Senhor dos mares e dos pescadores. Hoje sou um cemitério de
terracota. O mais belo cemitério onde vem desenvolver-se a loucura, onde dormem
homens loucos de bondade, doentes por amor, doentes de razão.
Tive de me enrolar
com minhas muralhas
numa bruma de Verão
sudário vermelho ou
branco
para nunca
acolher
camelos
cegos
nascidos
de um estranho
naufrágio
para
recordar
minha origem
vagabunda
eu sou a inércia
criminosa e o exílio dos cães
tenho a amizade dos
gatos e dos pobres
todas as minhas
esposas me foram infiéis
soçobraram numa
insacável loucura
das imagens e não das
almas
eles dizem que estou
doido
mas o que estou é
sozinho
um pouco
triste
escutai-me
vou contar-vos
tudo...
eu tinha-lhe dado uma
cabra...
não
não estou
doido
se me deres um
cigarro eu continuo a história..."
[Tahar Ben Jelloun, Arzila - Estações de Espuma;
tradução de Al Berto e ilustrações de Luís Manuel Gaspar, Hiena Editora, Maio
1987]
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