A carta escrita à mão, com local de origem, data, saudações, motivos, despeço-me
por aqui, papel fininho e pautado, pelos Correios, portadores ou menino de
recados.
Como canta o rei Roberto, escreva uma carta, meu amor, e diga alguma coisa
por favor.
Agora Beatles: Ô, mr. Postman!
Tem também aquele do Waldick Soriano, nosso Johnny Cash baiano: “Amigo, por
favor leve essa carta/ e diga àquela ingrata/ como está meu coração…”
É nossa campanha permanente pela volta da carta de amor, manifesto sempre
repetido neste blog.
Chega de SMS e emails lacônicos e apressados. Debruce a munheca sobre o
papiro e faça da tinta da caneta o seu próprio sangue.
Não temas a breguice, o romantismo, como já disse o velho Pessoa, travestido
de Álvaro de Campos, todas cartas de amor são ridículas, e não seriam de amor se
ridículas não fossem.
A carta, mesmo com todas as modernidades e invencionices, ainda é o melhor
veículo para declarar-se, comunicar afinidades e iniciar um feitio de
orações.
O que você está esperando, vá ali na esquina, compre um belo papel e
envelopes, e se devote.
Se tiver alguma rusga, peça perdão por escrito, pois perdão por escrito vale
como documento de cartório.
Se o namoro ainda não tiver começado, largue a mão dessas cantadas baratas e
internéticas e atire a garrafa aos mares.
Uma boa carta de amor é irresistível. Mas não vale copiar aqueles modelos que
vêm nos livros. Sele o envelope com a língua, como nas antigas, lamba os selos,
esse pré-beijo dos lábios da futura amada.
De novo o cliclê de Pessoa, para encorajá-los mais ainda: “As cartas de amor,
se há amor, têm de ser ridículas”.
Às moças é consentido, além dos floreios e da caligrafia mais arrumadinha, a
reprodução de um beijo, com batom bem vermelho, ao final, perto da
assinatura.
Que os amigos,e não apenas os amantes, se correspondam, fazendo dos envelopes
no fundo do baú as suas histórias de vida.
Pela volta da carta, que já é por si só uma maneira devota, um tempo que se
tira, sem pressa, para dedicar-se a quem se gosta. Pela volta da carta, pois o
que se diz numa carta é de outra natureza, é o bem-querer em tom solene.
O que você está esperando, meu amigo, minha amiga, largue esse cronista de
lado e debruce-se sobre a escrivaninha. Uma mesa de bar ou de um café também são
bons lugares para assentar as suas mal-traçadas linhas.
Lembrei-me agora de um começo clássico de missivas: “Venho por meio desta
dar-te as minhas notícias e ao mesmo tempo saber das tuas…”
Xico Sá
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