A Lava-Jato resolveu esse falso dilema, prender ou pegar o dinheiro de volta, escolhendo, entre uma pena e outra, aplicar as duas
Não comemorei a prisão de Sérgio Cabral, apesar de justa, e não
consegui me regozijar com sua foto de presidiário com a cabeça raspada.
Por razões de estima familiar, preferiria que ele não tivesse merecido
essa humilhação.
Em compensação, vibrei agora com a perspectiva de que sejam devolvidos
os R$ 270 milhões subtraídos dos cofres públicos para pôr em dia o 13º
salário e os atrasados do funcionalismo estadual, principalmente dos
aposentados.
Essa parece ser a disposição do governo Pezão, e é a reivindicação dos
que estão preparando um ato público em favor da devolução.
É também a maneira mais eficaz de punir o crime de corrupção, é melhor
do que prender e permitir que, depois de alguns anos, o corrupto saia de
trás das grades e vá curtir livremente a fortuna roubada.
A Lava-Jato resolveu esse falso dilema — prender ou pegar o dinheiro de
volta — escolhendo, entre uma pena e outra, aplicar as duas.
Só de bens bloqueados de réus, por exemplo, já foram R$ 3,2 bilhões.
Em 2016, estima-se que houve a maior restituição de recursos já feita pela Justiça criminal brasileira.
No balanço de seus três anos, impressionam as mais de cem condenações
e, principalmente, o que foi obtido em termos de dinheiro. Apenas aos
cofres da Petrobras foram devolvidos cerca de R$ 500 milhões por meio de
acordos de delação premiada e de leniência.
Por isso, em Brasília, os que conspiram contra a operação estão com
dificuldade de dormir neste período em que escrevo, de tensão pré-lista
de Janot, a segunda, uma bomba cujos efeitos devem atingir políticos de
todos os grandes partidos.
A propósito, vamos ficar devendo ao juiz Sérgio Moro mais essa: a
descoberta de que, ao contrário do que se acreditava, vivemos num país
rico, ou de ricos, poucos, mas muito ricos.
Sempre se disse que o Brasil era subdesenvolvido, carente, terra de
pobres e famintos. Betinho morreu tentando mobilizar o país contra o
flagelo da fome, e hoje se sabe que, graças à exposição forçada de suas
riquezas, meia dúzia de nossos corruptos ajudaria a resolver o problema.
Acho que o primeiro sinal de que estava surgindo uma geração de novos
ricos apareceu publicamente em 2004, quando o ex-gerente executivo da
Petrobras Pedro Barusco fechou acordo comprometendo-se a contar tudo o
que sabia e — essa era a grande revelação — propondo-se a devolver US$
100 milhões (sim, de dólares) obtidos com propina.
A pergunta que a torcida do Flamengo fazia era: “Se devolveu 100,
quanto mais ele não deve ter em nome de laranjas?” Ou então: “Se um
simples gerente dispunha de 100 milhões, imagina um seu superior
envolvido no mesmo esquema”.
Zuenir Ventura, O Globo
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