Uma cópia do livro de Adolf Hitler Mein Kampf de 1940 em Berlim, Alemanha (Foto: Fabrizio Bensch / Reuters)
Nas sociedades de consumo, as estratégias de venda de um produto recomendam muita discussão, polêmica, debate, até o “fale mal, mas fale de mim”
Sou contra a proibição pela Justiça do Rio da venda, exposição e
divulgação do livro “Minha luta”, de Adolf Hitler, um asqueroso
manifesto de propaganda das ideias nazistas, fascistas, racistas e
antissemitas, sem valor filosófico, histórico e nem mesmo biográfico,
porque cheio de mentiras (não esquecer que é de Joseph Goebbels,
ministro da Propaganda do regime hitlerista, a cínica máxima: “Uma
mentira repetida mil vezes torna-se verdade”).
Se é assim, por que então sou contra? Defesa da liberdade de expressão?
Não é nem por isso, já que o livro pode ser baixado grátis pela
internet por qualquer um. A principal razão é o temor do chamado “efeito
paradoxal”, uma consequência oposta ao que se pretende: em vez de
impedir a leitura, a medida pode estimulá-la, um fenômeno que costuma
ocorrer desde o Jardim do Éden sempre que se decreta uma interdição,
seja de maçã, filmes ou livros.
Nas sociedades de consumo, as estratégias de venda de um produto
recomendam muita discussão, polêmica, debate, até o “fale mal, mas fale
de mim”. Isso é o que está acontecendo. Só anteontem, nesta página,
havia dois artigos, um contra e outro a favor. Quem leu os dois deve ter
tido vontade de comprar um exemplar para tirar suas próprias
conclusões.
Não por acaso, uma fábrica deu o nome à sua cerveja de “Proibida”,
lançada recentemente com uma campanha publicitária usando artistas de
televisão. Um dos anúncios apresenta Antonio Fagundes recomendando a
bebida “seis estrelas” com um sorriso malicioso: “Como toda proibida, é
gostosa demais”.
Em sua decisão, o juiz Alberto Salomão Junior, da 33ª Vara Criminal,
diz que o livro “tem o condão de violar a lei penal, pois fomenta a
prática nefasta da intolerância a parcela determinável das pessoas
humanas”.
Já Luiz Fernando Emediato, publisher da Geração Editorial, acredita que
o magistrado pode rever sua sentença ao verificar, por exemplo, que sua
edição crítica e comentada “presta um serviço à humanidade, pois
desmente, refuta e condena as ideias de Hitler”.
“Mein Kampf” está em domínio público desde janeiro, mas as possíveis
consequências maléficas apontadas para justificar a proibição não
ocorreram. Soube apenas de um incidente ocorrido em livraria do Rio. Uns
poucos compradores, não encontrando o livro, fizeram discurso
antissemita contra o proprietário do estabelecimento, culpando-o pela
decisão da Justiça. São os já convertidos, que não precisam ler o manual
de Hitler para agir conforme o seu estilo e seguir suas ideias.
- 0 -
Verissimo é hoje uma das vítimas do exército de iracundos políticos,
aqueles em cuja veia corre fel, não sangue. Logo ele, que é incapaz de
ódio, a não ser contra cebolinha em conserva. Mesmo assim, compreende e
defende quem gosta.
Zuenir Ventura
Do Blog do Noblat
Nenhum comentário:
Postar um comentário