Uma obra
literária pode levar ao suicídio uma pessoa depressiva? O caso mais famoso, ao
que eu saiba, foi Os sofrimentos do jovem
Werther (1774) de J. W. Goethe. É uma das grandes obras do romantismo
alemão, um livro escrito aos 24 anos onde Goethe, reza a lenda, descarregou sua
tristeza por uma paixão que não deu certo. O livro aparentemente provocou uma
onda de suicídios de leitores jovens que se identificaram com o protagonista,
um rapaz que se mata porque sua amada casou com outro.
Males de amores,
contudo, raramente causam depressão. Ela pode ser deflagrada por problemas
psicológicos profundos ou por desequilíbrio químico do organismo (neste caso é
comum o tratamento pelo uso de remédios). Um caso recente de suicídio literário
foi o de David Foster Wallace, o autor de A
Piada Infinita (“Infinite Jest”). Wallace sofria de depressão desde jovem,
e usava medicamentos. Já famoso, com mais de 40 anos, seu médico sugeriu
interromper o tratamento ou tomar outra medicação. Ele o fez. Não deu certo, e
a depressão voltou com tudo. Ele voltou ao remédio antigo – e este não fez mais
efeito. Um dia a esposa deu uma saída rápida, e ao voltar encontrou Wallace
enforcado no porão, com os cachorros da casa parados em volta, olhando.
Disse ele certa
vez, sobre o problema: “É o motivo pelo qual quero morrer. (...) É como se não fosse capaz de encontrar nada
fora dessa sensação e por isso não sei que nome lhe posso dar. É mais horror
que tristeza. É mais horror. É como se uma coisa horrorosa estivesse prestes a
acontecer, a coisa mais horrível que se possa imaginar, não, pior do que se
possa imaginar porque há também a sensação de que é preciso fazer qualquer
coisa de imediato para se deter aquilo, mas não se sabe o que se deve fazer e
de repente está acontecendo, durante o tempo todo, está prestes a acontecer e
ao mesmo tempo está acontecendo.”
Essas coisas podem acontecer num contexto explicável
(problemas pessoais, financeiros, de saúde, etc.) ou inexplicável (os ataques
de pânico que acometem pessoas sadias e sem problema algum). A bebida e as
drogas acabam sendo válvulas de escape para alguns. Parece óbvio que não
resolvem o problema, e sim o agravam, pois a euforia momentânea do barato tem
como reverso a rebordosa do dia seguinte. Toda pessoa deveria ter uma atividade,
uma prática qualquer capaz de fazer frente a essas quedas terríveis na areia
movediça do nada-vale-a-pena. Artistas muitas vezes fazem de sua arte um
salva-vidas precário que os ajuda a manter-se à tona. Nem sempre funciona, mas
quando funciona acaba sendo a única coisa que segura um sujeito do lado de cá
até que passe a tempestade.
Bráulio Tavares
Mundo Fantasmo
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